A editora Valer lança, neste sábado (30), o livro “O adolescer e o amor nos discursos de mulheres manauaras”, da professora e doutora em psicologia Vilma Peixoto Mourão, na Galeria do ICBEU, avenida Joaquim Nabuco, 1286, Centro, a partir das 18h.
O evento será, também, um momento de solidariedade, pois a autora pede, aos participantes, que levem produtos não perecíveis para serem distribuídos nas instituições, localizadas na área onde realizou a pesquisa, que resultou no livro.
De acordo com a coordenadora editorial da Valer, Neiza Teixeira, a obra não é apenas para os estudiosos da Educação, Psicologia, Antropologia e áreas afins, mas também para os amantes de uma boa leitura sobre as especificidades do adolescer e do amor na ótica das adolescentes manauaras e de seus cotidianos. Considerando, ainda, que a autora apresenta concepções sobre o amor, que sustentam o mundo ocidental, por exemplo, Freud.
Segundo a autora, a pesquisa que resultou no livro é de cunho qualitativo e foi desenvolvida em um bairro periférico da cidade de Manaus. “Utilizei como recurso de aproximação das adolescentes entrevistas e grupo focal. Os dados foram analisados, por meio da análise de discurso, na vertente francesa Michel Pêcheux e Jaqueline Authier-Revuz, buscando compreender as formações discursivas e formações ideológicas desses discursos”.
A importância do livro e seu diferencial, ainda segundo a autora, é a busca pela desnaturalização das temáticas nele abordadas, apontado sua construção sociocultural. “Assim, poder ajudá-las a compreender aspectos da adolescência e dos relacionamentos amorosos sem tantas generalizações, incluindo o contexto, a cultura e a transgeracionalidade como pontos importantes a serem pensados atentamente”.
Nesse sentido, para a psicóloga, o texto destaca a complexidade que envolve o adolescer e as descobertas que circundam essa fase da vida e, pode ajudar, também, a compreender a formação discursiva e ideológica dos discursos teóricos e das adolescentes de uma comunidade periférica de nossa cidade como representativo da complexidade presente, no que tange ao feminino e suas formas de se relacionar amorosamente.
“Não falo da sexualidade adolescente, mas de mulheres adolescentes manauaras e sua sexualidade, o que requereu um olhar atento a minúcias, porque não há homogeneidade nos modos de viver a adolescência e a juventude, assim como não há uma sexualidade posta como única ou como parâmetro normativo, mas diferentes desempenhos que variam conforme as situações culturais e sociais.”, explicou.
No livro, encontra-se a análise de discursos de seis adolescentes entrevistadas, sob a perspectiva desenvolvida por Michel Pêcheux e também por Authier-Revuz que ressaltam, respectivamente, as formações discursivas e a heterogeneidade dos discursos.
O texto tenta dar visibilidade aos aspectos que denunciam as origens ideológicas, culturais e sociais desses discursos, mostrando suas contradições, ou seja, as repetições aí existentes e as formas como eles tangenciam o novo.
“Os discursos das entrevistadas apontam pouca incidência de identificação com os discursos de seus pares (mulheres jovens e “pós-modernas”), mantendo-se discursivamente mais próximas de perspectivas familiares, religiosas, mais tradicionalistas e também machistas e sexistas”.
Durante toda a pesquisa, a autora buscou fazer prevalecer um olhar que valorizasse cada vivência, cada forma de se reconhecer como mulher adolescente, fugindo de perspectivas guiadas pelos “problemas da adolescência” ou que remetem toda a problemática que envolve o processo de adolescer aos adolescentes, desconsiderando a complexidade dessa fase da vida
O que se percebe teoricamente, na obra, é que pudemos ratificar, com a pesquisa realizada, uma tendência a que haja um encurtamento da adolescência, entre os jovens mais pobres. Conforme Vilma, é muito frequente que em comunidades mais pobres, eles saiam da infância mais cedo e entrem na vida adulta, de igual modo, mais cedo, em face da necessidade de ajudarem e, em alguns casos, assumirem, a responsabilidade financeira em suas famílias, o que se junta a outros atravessamentos, como a gravidez.
“A representação que elas fazem de sua adolescência passa basicamente por duas perspectivas: uma tem por base o significante “liberdade”, seja no sentido de maior, seja no de menor liberdade, e outra, que percebe a adolescência como uma continuidade da vida, sem alterações, apenas acrescida de mais responsabilidade”, ressaltou.
Para a autora, a adolescência comporta uma dupla convocação – um reconhecimento da própria pessoa e o olhar do outro que aponta as mudanças corporais e atitudinais mais perceptíveis. Isso, por si só, aponta o tanto de nuances que cercam o reconhecimento da própria adolescência e, é em meio a isso tudo, que essas jovens descobrem o amor.
A forma de se relacionar é uma construção de cada sujeito, mas não se processa em um vazio, tem a ver com a sua história, que se constrói na relação com o outro e o Outro, por meio da linguagem e, consequentemente, por meio da cultura, dos valores sociais, familiares (transgeracionais) e de um contexto bem mais amplo do que muitos costumam supor.
No prefácio, escrito pela imortal da Academia Amazonense de Letras Marilene Corrêa da Silva Freitas, a adolescência feminina é cercada de zonas de sombra. “O esclarecimento que esta obra contém opera como raio de luz sobre o mistificado, o desconhecido, o naturalizado, sobretudo, quando se aborda a sexualidade, os relacionamentos amorosos, a gravidez precoce e todos esses fenômenos e fatos associados à condição de pobreza e gênero”, ressalta.
Para a Vilma, vale ressaltar, que por se tratar de um estudo exploratório e que visa a desnaturalização das temáticas abordadas, foi necessário construir tanto um referencial quanto uma análise extensa, daí o livro ter sido estruturado em cinco capítulos”.
Mais sobre o livro
A obra da professora e doutora em psicologia Vilma Mourão, ‘O adolescer e o amor nos discurso de mulheres manauaras’, que foi publicado em 2021 pela editora Valer, passa por fios da Psicanálise, da Sociologia, da Antropologia, da Psicologia e da Filosofia, sem prescindir da poesia, para dar voz aos discursos de mulheres adolescentes manauaras falando sobre o adolescer, o feminino e o amor, cujos sussurros apontam as especificidades da adolescência e ratificam o processo de sua desnaturalização.
Em suas 384 páginas, Vilma realça o contexto histórico, cultural e social face às adversidades que envolvem o feminino e a adolescência em muitas comunidades periféricas do Brasil, e que marcam estruturalmente cada mulher e suas formas de se relacionar amorosamente.
Dividido em 5 capítulos, a autora traz à tona todo o contexto da vida dessas mulheres jovens manauaras. No primeiro, Vilma aborda o sujeito adolescente, seu lugar na história e na vida. “A adolescência é compreendida como um fenômeno psicológico e social, econômico e cultural de acordo com o ambiente social, econômico e cultural em que vive o adolescente”.
Ainda dentro deste capítulo, Vilma fala do corpo adolescente e suas vicissitudes; da imagem corporal – encontros e desencontros com o corpo; o corpo feminino e seus contornos; os aspectos socioculturais – suas repercussões no corpo e na alma adolescente; o lugar do adolescente na história; e ainda sobre os adolescentes na atualidade;
Já no segundo capítulo, a psicóloga aborda a sexualidade humana como objeto da ciência, trata da família e a sexualidade – os primeiros laços sociais e sexuais; a sexualidade no contexto escolar; orientação sexual; sexualidade feminina; as adolescentes e suas sexualidades; sexualidades das mulheres brasileiras; mulheres amazonenses e suas sexualidades; “A sexualidade se faz presente no contexto escolar, simplesmente, porque ela faz parte do sujeito”, ressalta a autora.
Em trecho do livro, ela conta que uma pesquisa realizada em escolas municipais de Manaus revelou que quando se trata da sexualidade no âmbito escolar, os pensamentos dos professores estão voltados para as questões relativas ao caráter biológico da sexualidade humana em detrimento das questões socioculturais e emocionais que envolvem o desenvolvimento sexual”.
No terceiro capítulo, Vilma explica a questão feminina e os relacionamentos amorosos; o feminino e a questão de gênero – velhas e novas concepções; o feminino- uma construção cultural e de cada mulher; relacionamentos amorosos – desvendando o amor; o amor e a história humana; os relacionamentos amorosos na atualidade – pegar, ficar, namorar; a iniciação sexual.
O Contexto discursivo é tratado no breve quarto capítulo. A psicóloga foca em uma comunidade na zona leste de Manaus – ‘Buracão’, um lugar marcado pela exclusão; fala também das adolescentes dessa comunidade; aborda o encpntro com essas adolescentes, a construção e a análise de dados;
E no último capítulo, o cinco, Vilma apresenta o adolescer e o amor no discurso de seis adolescentes.
Sobre a escritora
Vilma Peixoto Mourão é socióloga, psicóloga clínica com formação em Psicanálise. Professora da Universidade do Estado do Amazonas, lotada no curso de Dança, onde leciona disciplinas vinculadas à Sociologia da Educação e Psicologia da Educação. Ela é mestre em Educação e doutora em Psicologia do Desenvolvimento e Educação.
Nascida em Recife, cursou sociologia, e veio para Manaus com 22 anos, para realizar a sua pesquisa de mestrado e acabou ficando por aqui. Centrou as atividades na prática clínica e de ensino. Trabalhou em algumas faculdades (Uninorte e Unip) e em algumas pós-graduações (Ulbra e Dom Bosco).