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O cartunista Ziraldo, criador do célebre personagem “O Menino Maluquinho”, morreu na tarde deste sábado (6), em sua casa no Rio de Janeiro, aos 91, de falência múltipla dos órgãos. A informação foi confirmada por Daniela Thomas, filha do artista.

Ziraldo teve uma carreira de inúmeros sucessos e criou charges, cartuns e personagens considerados emblemáticos para a literatura infantil. Seus livros venderam mais de 10 milhões de exemplares e foram publicados em vários idiomas. O velório acontecerá neste domingo (7) a partir das 10h na sede da Associação Brasileira de Imprensa, no Rio de Janeiro.

Ziraldo Alves Pinto tinha apenas seis anos quando viu seu primeiro desenho estampar as páginas do jornal. Na época, foi sua mãe quem enviou o trabalho à extinta Folha de Minas. Esse foi só o começo de uma longa relação com a imprensa. Depois disso, ele publicou em veículos como O Cruzeiro e o Jornal do Brasil.

No entanto, foi por meio de seu trabalho no jornal O Pasquim que ele se tornou uma figura conhecida no país.

Com humor, linguagem ácida e provocativa nos anos de maior repressão da ditadura militar, a publicação, critica ao regime, ditou tendências no jornalismo brasileiro.

Em razão do engajamento político no veículo, ele foi preso três vezes, mas nem por isso deixou de desenhar. Na cela, ele seguiu no ofício e usava seu conjunto de hidrocor para desenhar, às vezes um simples limoeiro que imaginava no pátio cinza do local.

Nos anos 1960, o saci-pererê criado por Ziraldo tornou-se o personagem principal daquela que seria a primeira revista em quadrinhos brasileira, A Turma do Pererê. Já na década de 1980, ele criou “O Menino Maluquinho”, personagem que se tornaria um fenômeno editorial.

Em 2014, o cartunista disse à Folha que decidiu criar seu personagem mais conhecido após uma palestra com pais e professores sobre a educação dos filhos. “Disse que devíamos preparar os filhos para o dia de hoje, pois o futuro será feito de muitos hojes”, disse ele. Quando chegou em casa, já tinha a ideia do livro na cabeça. Nasceu Maluquinho, que vive um dia por vez, intensamente.

“Ziraldo foi um dos dois ou três maiores artistas gráficos da história do Brasil” diz o escritor Ruy Castro. “Ele era capaz de criar marcas, lettering. Era capaz de fazer tudo graficamente. Ziraldo desenhava enquanto conversava com 30 pessoas ao mesmo tempo. Ele era capaz de tudo. Cansei de ver ele fazer isso. Ele criou personagens que marcaram época, como a Supermãe, o Jeremias, o Bom, e os Zeróis, uma paródia aos super-heróis, tudo isso antes do Menino Maluquinho.”

Para o escritor de livros infantis Ilan Brenman, Ziraldo revolucionou a literatura para crianças por não subestimar a inteligência dos jovens.

“Ele era um intelectual e uma pessoa que se engajou politicamente em causas fantásticas. Então, na hora de escrever, levava toda essa bagagem e repertório”, diz o autor. “Ele tinha muito respeito pela sensibilidade e inteligência dos leitores. Não menosprezava o jovem e não achava que qualquer coisa vale para ele.”

O escritor diz que os livros “Flicts”, de 1969, são um exemplo disso. A obra conta a história de uma cor solitária que todas as outras acham feia. “É uma história maravilhosa sobre sentimentos e emoções que pode pegar desde crianças pequenas aos adolescentes, passando pelos adultos. “É uma obra que mostra a qualidade do trabalho dele.”

Mell Brites, escritora e editora da Baião, selo da Todavia para crianças, reforça “Flicts” como um clássico da literatura infantil brasileira. “Foi uma obra pioneira, que olhou de uma maneira completamente nova para a relação texto-imagem. Ele abriu caminhos de pensamento gráfico para o livro e marcou a época”, diz. “É um livro paradigmático na literatura de forma geral. É retumbante o sucesso e a popularidade desse livro, poucos alcançam esse tamanho. Ao mesmo tempo, ele é atual e continua marcando a produção nacional para crianças.”

Brenman diz ainda que Ziraldo inspirou uma geração de escritores com seu estilo e talento. “Não existe autor infantil que não tenha sido contagiado e influenciado por ele. A minha obra olha a criança como um ser complexo da mesma forma que ele fazia”, diz o escritor, autor de livros como “As Botas do Gabriel” e “A Menina que Amava Futebol”. “A Literatura infantil brasileira não seria absolutamente nada sem o Ziraldo.”

O presidente Lula usou as redes para lamentar a morte do artista e dizer que sua contribuição para a cultura brasileira foi imensa, com destaque especial para “O Menino Maluquinho”.

“Um livro que virou filme, peças, pautou músicas e vem sendo passado de pais para filhos como sinônimo de inocência, curiosidade e beleza, além de um olhar esperançoso em relação aos imensos potenciais do mundo em que vivemos”, disse o presidente. “Nesse momento de imensa tristeza, me solidarizo com os familiares, amigos, parentes e fãs de Ziraldo.”

Com informações da Folha de S.Paulo