A Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) denunciou ao Ministério Público Federal uma operação de atividades de garimpo a pleno vapor na foz do rio Cauburis, situado entre os municípios de Santa Isabel do Rio Negro e Barcelos, no extremo norte do Amazonas. Ao menos duas dragas foram flagradas operando ilegalmente entre as Terras Indígenas Rio Negro I e II, durante o os primeiros dias de abril.
Além de oferecer um alto risco ambiental em uma das regiões mais sensíveis do planeta, a ação ilegal contribui para a disseminação de coronavírus e outras doenças entre os ribeirinhos e indígenas, já que não conta com o mínimo de fiscalização, conforme explica a Foirn.
“A gente foi surpreendido por essa denúncia dessas dragas entrarem de uma forma ilegal no território, para fazer extração de minério. Não teve consulta, não tem legalidade, sobretudo porque se trata de uma terra indígena. Nós estamos indignados”, explica o chefe Marivelton Baré, presidente da Foirn.
De acordo com a denúncia apresentada, os garimpeiros apresentaram documentação da prefeitura de Santa Isabel do Rio Negro, que teria autorizado a escavação no fundo do rio afim de encontrar minério. Entretanto, os indígenas pedem que o MPF verifique a autenticidade da versão dos garimpeiros ilegais.
A foz do rio Cauburis fica localizada acima da Cachoeira do Caranguejo, e próxima ao antigo posto de vigilância da Fundação Nacional do Índio. Em consulta ao site da Funai, a reportagem constatou que os postos da Fundação situados nos municípios de Barcelos e Santa Isabel do Rio Negro estão sem comando, sugerindo que na prática estão desativados. Estes postos seriam os únicos em um raio de 300 quilômetros que poderiam auxiliar no trabalho de proteção da terra indígena.
“Vale frisar que a região do rio Cauaburis está inserida dentro de uma área extensa de terras indígenas, e em limite ao Parque Nacional do Pico da Neblina, que também é área ambiental protegida”, explica a nota da Foirn.
Em um dos trechos da denúncia apresentada ao MPF, está em anexo a posição da prefeitura de Barcelos se isentando da fiscalização devido a supostamente as dragas estarem operando ‘fora dos limites do município’, e que as dragas estariam com autorização da Marinha do Brasil e da Agência Nacional de Mineração. A reportagem entrou em contato com a prefeitura de Barcelos e de Santa Isabel do Rio Negro sobre as denúncias e aguarda um posicionamento.
Assédio de garimpeiros
“Há uma irresponsabilidade grande do governo com toda essa invasão”, explica Marivelton, que conta sobre o assédio feito pelos garimpeiros para convencer indígenas e ribeirinhos que a atividade pode dar resultados financeiros positivos. “[O garimpo ilegal] sempre avança contra aqueles que não moram no território. E que não são legitimados pela população indígena, apenas pelo favorecimento pessoal, e não é coletivo”, diz Marivelton.
“Dessa forma, solicitamos ao Ministério Público Federal, que adote medidas urgentes para a retirada dos invasores dentro da Terra Indígena Médio Rio Negro II,
onde estão operando desde domingo o garimpo ilegal de ouro. Ao mesmo tempo, requeremos que apure junto a Agencia Nacional de Mineração, prefeituras de Santa Isabel e Barcelos sobre suposta autorização local para a operação, conforme mencionado nas mensagens acima, bem como solicite cópia integral dos processos administrativos mencionado nas mensagens, bem como, adote outras medidas que este Parquet entenda cabível para coibir de imediato a prática ilegal de garimpo dentro de terra indígena no rio Negro”, finaliza a nota divulgada pela Foirn.
A Foirn é uma das dezenas de entidadades indígenas que têm criticado duramente o Projeto de Lei 191, de autoria da presidente Jair Messias Bolsonaro. Desde que o PL foi apresetando em fevereiro do ano passado na Câmara dos Deputados, as entidades se movimentam para tentar barrar sua efetivação. O projeto pretende regulamentar pesquisas e exploração de recursos minerais, garimpo, extração de hidrocarbonatos, bem como aproveitamento de recursos hídricos para geração de energia elétrica em Terras Indígenas (TIs).
“O PL 191/2020 significa pena de morte para nós porque põe em risco a nossa existência em nossas terras. Essas atividades vão causar a devastação e contaminação dos rios e florestas, destruindo nossa cultura, conhecimentos e memória materializada no nosso território. Para nós a terra é tudo, sem ela não há como viver e sobreviver. Não é mercadoria e não está à venda. Não é reserva de capital presente e futuro para esses grupos econômicos. É a nossa casa, casa dos espíritos ancestrais e mitológicos, vida que se entrelaça com todos os seres”, comunica uma nota pública da Foirn.
A Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN), criada em 1987, representa 23 povos indígenas na região do alto e médio Rio Negro. Uma de suas atribuições, de acordo com seu estatuto, é atuar no controle social em várias frentes de políticas públicas, dentre elas o monitoramento ambiental acerca de ilegalidades dentro do território indígena. (A CRÍTICA)