Tecidos cerebrais de adeptos da Mind e da mediterrânea têm a concentração de proteínas ligadas ao Alzheimer equivalente à de indivíduos até 18 anos mais jovens. Para cientistas, descoberta ressalta a importância da adoção de bons hábitos contra as demências
Pessoas que seguem uma dieta rica em vegetais verdes folhosos, bem como frutas, grãos, azeite de oliva e peixes, podem ter um risco menor de desenvolverem Alzheimer. Essa foi a conclusão de um estudo publicado na edição de março da Neurology, a revista médica da Academia Americana de Neurologia. Por meio de técnicas de neuroimagem, pesquisadores da Rush University Medical Center, em Chicago (EUA), observaram uma associação significativa entre esse padrão dietético e a presença de placas amiloides e emaranhados de tau — complicação ligada à doença neurodegenerativa — no tecido cerebral póstumo de adultos mais velhos. A hipótese é de que esses regimes consigam rejuvenescer o órgão em até 18 anos.
Estudos anteriores demonstraram que dietas à base de plantas, ricas em nutrientes e compostos bioativos essenciais para a saúde do cérebro, como a Mind, a Dash e a mediterrânea, estão associadas a declínio cognitivo mais lento, risco reduzido de demência e melhor cognição. Porém, a compreensão desses mecanismos neuropatológicos permanece limitada. Na tentativa de preencher essa lacuna, os pesquisadores da universidade estadunidense avaliaram os impactos dessa rotina alimentar na presença de indicadores biológicos do Alzheimer.
“A doença de Alzheimer é o distúrbio neurodegenerativo mais comum. Com tratamentos limitados para reverter a perda de memória ou a demência, entender o papel dos fatores de risco modificáveis, como a dieta, pode ter um impacto na saúde pública”, afirma a coautora do estudo, Puja Agarwal, pesquisadora do Departamento de Nutrição Clínica da universidade estadunidense.
O estudo observacional acompanhou idosos desde o momento em que se inscreveram no Projeto Memória Rush e Envelhecimento (MAP) até a morte. Na iniciativa, foram coletadas informações regulares sobre hábitos alimentares e ocorrência de Alzheimer. Agarwal e colegas analisaram dados de 581 pessoas com, em média, 84 anos, sem diagnóstico de demência quando entraram na pesquisa e que concordaram em doar o cérebro após morrerem — o óbito se deu, em média, sete anos depois.
Depois de averiguar se os participantes tinham um gene ligado a um maior risco de Alzheimer e considerar fatores de risco, como idade da morte, sexo e ingestão total de calorias, a equipe constatou, na autópsia dos cérebros, que as pessoas que consumiam com maior frequência os grupos alimentares indicados pela dieta mediterrânea apresentavam quantidades de placas e emaranhados semelhantes a serem 18 anos mais jovem. No caso da Mind, essa média foi equivalente a 12 anos. “Descobrimos que aqueles que consumiam uma dieta saudável tinham menos placas amiloides e emaranhados no cérebro, que são as duas características da doença de Alzheimer”, enfatiza a autora.
Neurologista do Hospital Sírio-Libanês em Brasília, Denise França explica que a causa dessa neurodegeneração segue incerta, mas que há indícios de que o acúmulo das duas proteínas desempenhe um papel fundamental na geração da doença. “Evidências experimentais sugerem que, em concentrações baixas, as proteínas amiloides sejam protetoras dos neurônios em situações de inflamação, trauma, infecção e estresse oxidativo. Mas em concentrações muito altas, elas passam a ser neurotóxicas, danificam as sinapses, formam placas e ocasionam a perda neural”, diz. “A proteína tau, por sua vez, em uma pessoa saudável, ajuda a estabilizar as estruturas que permitem a comunicação entre os neurônios, mas, em quem tem Alzheimer, se acumula no interior dos neurônios e faz com que as estruturas colapsem, formando emaranhados.”
Estilo de vida
Na avaliação da autora do estudo, as descobertas sugerem que o benefício potencial de diferentes componentes dietéticos depende do consumo combinado com um padrão alimentar geral saudável. “O efeito de um único alimento ou de um grupo não impacta diretamente a patologia da doença de Alzheimer no cérebro humano”, explica Agarwal.
A pesquisadora enfatiza que, além de incentivar o consumo de grupos alimentares saudáveis e ricos em nutrientes, como frutas e verduras, essas dietas recomendam uma menor ingestão de comidas com alto teor de gordura e açúcar, o que influencia na saúde cerebral. “A redução da ingestão desses alimentos comprovadamente reduz os fatores de risco cardiovasculares e, por consequência, há um impacto positivo na função cognitiva”, complementa França.
Mas Agarwal reitera que, por mais que o estudo tenha ajudado a encontrar um dos mecanismos pelos quais a dieta ajuda a saúde do cérebro, são necessárias investigações mais profundas sobre esse fenômeno. “O mecanismo proposto é que tanto a Mind quanto a mediterrânea são ricas em nutrientes essenciais e compostos bioativos necessários para manter a saúde do cérebro, além de terem propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias que podem ajudar a prevenir a carga amiloide e perda neuronal”, diz. “Como próximo passo, planejamos investigar outros mecanismos potenciais através dos quais a dieta pode ter um efeito protetor no cérebro, examinando sua relação com fatores vasculares cerebrais e outras patologias.”
Com informações do Correio Braziliense