A primeira participação do Brasil no Conselho de Segurança das Nações Unidas remonta a 1946. Membro fundador da ONU, o país fez parte da primeira configuração do Conselho, naquela época ainda sediado em Londres, e foi o segundo país a exercer sua presidência rotativa.
Com a Europa destruída e o mundo convulsionado pelos efeitos da Segunda Guerra, coube ao representante brasileiro, o embaixador Cyro Freitas-Valle, conduzir, por um mês, os trabalhos daquele recém-criado mecanismo de segurança coletiva.
Em seus primeiros meses de atuação, o Conselho de Segurança esteve às voltas com reclamações levantadas pela Síria e pelo Líbano contra a presença de tropas britânicas e francesas em seus territórios. O Brasil votou contra a permanência dos militares estrangeiros naqueles países e em favor dos princípios da não intervenção e da igualdade soberana dos estados, hoje consignados na Constituição Federal como norteadores das relações exteriores do Brasil.
No mês de julho, o Brasil exercerá novamente a presidência do Conselho de Segurança, como fez inúmeras vezes, em seus 11 mandatos no órgão, ao longo dos 75 anos de existência da ONU. Os desafios à paz e à segurança internacional continuam significativos, e atualmente voltam a se acirrar as divergências no Conselho, como o foram durante os longos anos de Guerra Fria.
O conflito na Ucrânia potencializou os embates no Conselho e vem gerando, além do grande sofrimento humano, fortes distúrbios sistêmicos, que afetam a segurança energética e alimentar de todo o mundo. O órgão tem se revelado incapaz de tomar decisões a respeito da situação na Ucrânia —mesmo sobre questões que deveriam unir todos os membros, como a garantia de acesso para a assistência humanitária e a proteção de civis.
Guerra na Ucrânia
Diante dessas tensões geopolíticas, a diplomacia brasileira buscará, durante sua presidência do Conselho de Segurança, abrir espaços de diálogo entre os membros com vistas a favorecer a construção de soluções para os desafios à paz e à segurança internacional constantes da agenda do órgão naquele mês.
A situação na Ucrânia seguramente será tratada da perspectiva de seu impacto sobre a segurança alimentar mundial, mas também será necessário insistir na promoção de diálogo sério que leve à cessação do conflito armado.
Estarão, também, na agenda da presidência brasileira, negociações importantes sobre os mandatos da ONU na Líbia, na Síria, no Haiti, no Chipre e no Iêmen, além de discussões sobre a missão de paz na Colômbia, temas humanitários e crianças em situação de conflito armado.
Há, pelas razões já apontadas, a necessidade urgente de ampliar a representatividade dos Estados-membros da ONU no Conselho, de forma que suas discussões e decisões ganhem em legitimidade. Em 1945, havia 51 Estados-membros na organização, dos quais 11 ocupavam assentos no Conselho de Segurança. Hoje, são 193 membros e apenas 15 sentam-se no Conselho –dos quais cinco como membros permanentes.
O Brasil continua a defender uma reforma abrangente da organização, inclusive da configuração do Conselho de Segurança. E continuamos sendo um dos melhores candidatos a membro permanente, em representação do mundo em desenvolvimento e de nossa região, a América Latina e o Caribe, que nunca contou com um membro permanente, como é o caso também da África.
Ao exercer a presidência do Conselho de Segurança em julho de 2022, o Brasil reafirmará suas sólidas credenciais para ocupar um assento permanente no órgão.
Em 12 de julho, terei a honra de presidir debate aberto do Conselho de Segurança sobre o tema da comunicação estratégica em missões de paz, com a presença do secretário-geral da ONU. As missões de paz da ONU são criadas com o objetivo de ajudar na manutenção da paz pós-conflito e na construção dos meios para uma paz duradoura. São cada vez mais complexas e trazem altos riscos para os capacetes azuis.
A comunicação estratégica visa a coibir a violência, promover o respeito aos direitos humanos e apresentar à população local e a todos os atores envolvidos os objetivos da ONU em cada área de atuação. Uma comunicação estratégica eficaz contribui para garantir a segurança dos capacetes azuis e a implementação do mandato de cada missão de paz aprovado pelo Conselho de Segurança.
Desde 1956, quando o Brasil enviou um batalhão para a Força de Emergência das Nações Unidas no Sinai, cerca de 55 mil militares, policiais e civis brasileiros trabalharam para a promoção da paz, sob a bandeira azul-claro das Nações Unidas. E um grande brasileiro, Sérgio Vieira de Mello, morreu defendendo essa mesma bandeira da paz, no Iraque.
Julho será um mês de intenso trabalho, o que requererá habilidade diplomática e esforço concentrado para cumprir todo o programa, com o desafio adicional de promover o espírito de cooperação entre os membros do Conselho de Segurança. A diplomacia brasileira não poupará esforços para contribuir para a manutenção da paz e da segurança internacionais, como tem feito desde 1946. (Texto: Carlos França)
*Com R7