Foto: Gustavo Moreno / STF

O ministro do STF Flávio Dino falou hoje durante o Fórum de Lisboa sobre sua atuação como relator de ações sobre emendas parlamentares na Corte.

Dino disse que coleciona desafetos por sua atuação no caso. “Acabei virando, por esses caprichos do destino, uma espécie de juiz travão. E é um papel chato. Tem muita gente que me odeia, inclusive, mas tem muita gente que gosta”, falou em um evento organizado por um instituto do qual o também ministro Gilmar Mendes é sócio. “Quando eu assumo a relatoria, nós tínhamos uma desorganização absoluta quanto ao funcionamento do devido processo legal orçamentário.”

Ministro é relator de ao menos três ações que tratam do tema. No passado, ele já barrou a execução das emendas de comissão e emendas Pix por falta de transparência.

Para o ministro, as emendas impositivas sabotam a divisão das competências dos três Poderes. Essas emendas são de pagamento obrigatório pelo governo. “Um recurso da União deve custear uma obra estruturante. Os recursos que constitucionalmente deveriam ser alocados nisso se transformaram em mecanismos de descentralização para obras igualmente justas, porém, com caráter diferente, obras de caráter local.”

“No momento em que você pega os recursos da União e os descentraliza muito fortemente pela via das emendas parlamentares, você, num certo sentido, está sabotando a repartição constitucional de competências materiais” afirmou Flávio Dino, ministro do STF.

Ele disse que o julgamento da ação que questiona a obrigatoriedade de pagamento das emendas será um “apocalipse”. Ainda não há data para ele acontecer. “Seria, do ponto de vista institucional, uma coisa meio apocalíptica, porque é quase um CTRL + Alt + Del [combinação no teclado que permite gerenciar e interromper funções de um computador] no sistema político brasileiro.”

Ministro disse que Supremo não quer resolver a questão sozinho, mas que ela deve ser solucionada. “Imagino que isso é tão grave que não deve ser decidido só pelo Supremo. E esse é o ponto principal sobre o qual eu vim aqui tranquilizar a todos”, declarou. “Mas tem que ser enfrentado, porque o dito orçamento impositivo, a essas alturas, perpassa quatro ou cinco presidentes, e todos tiveram muita dificuldade.”

Constituição determina que congressistas devem legislar sobre o Orçamento. Ou seja, eles devem analisar as propostas do Executivo e indicar como a União deve gastar os recursos públicos. Em tese, as emendas buscam a melhor distribuição possível, já que os deputados e senadores estão mais próximos dos eleitores e conhecem melhor as necessidades específicas de cada região.

Antes, os parlamentares propunham a emenda, e o Executivo tinha que aprovar. Assim, se tornaram tradicional moeda de troca no jogo político, já que a destinação de emendas pode se transformar em investimentos locais e, eventualmente, palanque eleitoral. Cada político costuma direcionar dinheiro às cidades ou regiões de interesse.

Desde 2015, porém, alguns tipos de emendas se tornaram impositivas —ou seja, o governo é obrigado a pagá-las. Ficou menor o poder de barganha do governo federal, embora ele ainda possa determinar o ritmo de liberação dos recursos das emendas ao longo do ano. Em 2019, mais emendas se tornaram impositivas.

Foram essas mudanças que possibilitaram a criação do chamado “orçamento secreto”. Trata-se de emendas em que o autor ou o destino não era especificado, facilitando casos de corrupção. Em novembro de 2021, o STF suspendeu a execução das emendas pela primeira vez, em uma ação de relatoria da ministra Rosa Weber. Com a aposentadoria dela, foi Dino quem assumiu as ações desse tema.

Agora, estão na mão de Dino ao menos três ações que contestam o pagamento impositivo das emendas. Na semana passada, aconteceu uma audiência pública sobre o tema: os presidentes da Câmara e do Senado, Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União-AP), respectivamente, chegaram a confirmar presença, mas cancelaram de última hora.

*Com informações de Uol