
O ministro Luiz Fux, do STF (Supremo Tribunal Federal), decidiu que o governo Lula (PT) deve impedir que beneficiários de programas sociais usem recursos do Bolsa Família e do BPC (Benefício de Prestação Continuada) para fazer apostas esportivas.
A decisão foi publicada nesta quarta-feira (13). No texto, Fux também determina que entrem em vigor, de forma imediata, medidas que proíbam a publicidade e propaganda das bets que tenham crianças e adolescentes como público-alvo.
“Verifica-se que o atual cenário de evidente proteção insuficiente, com efeitos imediatos deletérios, sobretudo em crianças, adolescentes e nos orçamentos familiares de beneficiários de programas assistenciais, configura manifesto ‘periculum in mora’ (perigo na demora), que deve ser afastado de imediato”, diz o ministro.
Após a decisão, o ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Wellington Dias, afirmou que a posição de Fux combina com a defendida pelo presidente Lula. “Qual era o problema? É que a lei aprovada no Congresso colocava um prazo de 6 meses para entrar em vigor, e agora nós temos condições de tomar medidas imediatas”, disse.
A decisão monocrática do ministro será levada a referendo do plenário em sessão virtual extraordinária, marcada para essa quinta-feira (14).
Fux tomou a decisão após participar de uma audiência pública no Supremo sobre os impactos dos sites de apostas esportivas. Expositores utilizaram dados de um estudo do Banco Central para pedir medidas do STF contra as apostas esportivas entre as famílias mais pobres.
O estudo mostra que os beneficiários do Bolsa Família gastaram R$ 3 bilhões em bets via Pix no mês de agosto —valor que equivale a 20% do total repassado pelo programa no mês.
Dos 20 milhões de beneficiários, 5 milhões fizeram apostas naquele. Na mediana, o valor gasto por pessoa foi de R$ 100. Desse total de apostadores, 70% são chefes de família, ou seja, quem de fato recebe o dinheiro transferido pelo governo. O grupo enviou R$ 2 bilhões por meio do Pix às bets em agosto.
Os dados levantados pelo Banco Central não mostram qual valor foi recebido de volta pelos apostadores como prêmio. O BC estima que 85% do que é apostado retorna aos ganhadores das apostas.
A proibição do uso do cartão do Bolsa Família como meio de pagamento em sites de apostas online já estava no radar do ministro Wellington Dias (Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome).
Técnicos do Ministério de Desenvolvimento e Assistência Social, porém, avaliam que a medida é pouco eficaz para restringir as apostas esportivas entre beneficiários dos programas sociais.
“[A proibição do uso do cartão do Bolsa Família para apostas] tem alto custo de implementação e baixíssima eficácia, visto que menos de 2% dos beneficiários do Programa utilizam cartão de débito do PBF para operações de compra e que apenas 1,4% dos beneficiários do Programa utilizam cartão de crédito”, diz a pasta em documento enviado ao STF.
Um integrante do governo que trabalha na regulamentação das bets afirmou à Folha ter dúvidas sobre como implementar a decisão de Luiz Fux. Segundo ele, o dilema seria impedir o uso do dinheiro proveniente dos programas sociais, como determina o ministro, sem proibir que um beneficiário faça apostas com recursos obtidos pelo seu trabalho.
O bloqueio específico dos cartões dos programas sociais é uma possibilidade. A medida, porém, é vista como insuficiente, já que os beneficiários podem transferir os recursos para outra conta e pagar as casas de apostas.
Em nota, a Secretaria de Apostas e Prêmios do Ministério da Fazenda diz que a decisão de Fux endossa as regulamentações sobre as bets feitas pelo governo. “É possível ainda dizer que a decisão indica, preliminarmente, o reconhecimento da constitucionalidade da lei que regulamenta a exploração da aposta de quota fixa e da regulação feita até aqui pelo Ministério da Fazenda”.
A secretaria afirma ainda que vai trabalhar na “implementação de medidas de proteção” aos beneficiários de programas sociais, por ordem do ministro do Supremo. A articulação será feita com o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social e o Banco Central.
A Associação Nacional de Jogos e Loterias diz que as medidas adotadas pelo ministro do Supremo são as mesmas já defendidas pelas casas de apostas. “As bets comprometidas com o jogo íntegro e responsável, entre elas as associadas da ANJL, não compactuam com divulgação de apostas para menores de idade e nem com o uso de recursos que tenham o potencial de prejudicar financeiramente as famílias brasileiras mais vulneráveis”, afirma, em nota.
