Léo Lins foi demitido pelo SBT após piada sobre criança com hidrocefalia - Foto: Reprodução / Instagram

A decisão da Justiça de São Paulo de proibir Leo Lins, 40, de fazer piadas com ‘categorias consideradas minorias ou vulneráveis’ dividiu os humoristas. Logo após o anúncio da decisão, comediantes saíram em defesa de Lins e acusaram censura na decisão. Outros humoristas concordam com a avaliação da juíza Gina Fonseca Corrêa, para quem muitas das falas de Leo Lins na apresentação retirada do ar representam transgressões às leis.

A humorista Rafaela Azevedo acredita que o argumento de que houve censura é desonesto. “Esse discurso de censura e liberdade de expressão para defender racismo e outros conteúdos preconceituosos beira a desonestidade intelectual e a ignorância de quem muitas vezes tem uma vida de exacerbados privilégios”, opina ela, em cartaz com a peça “King King Fran”

“O privilégio de um homem cis branco, hétero e rico faz ele acreditar que ele pode tudo. No momento em que uma ação em prol das minorias coloca limite na ação deles no mundo, eles esperneiam como meninos mimados que não são capazes de reconhecer que não são o centro do mundo, que precisam respeitar todas as outras formas de existência.”

Em posição semelhante à de Rafaela, o humorista Gustavo Mendes, que ficou conhecido por imitar Dilma Rousseff, declarou nas redes sociais que “o humor transgressor não pode ser criminoso”.

‘Papel do humorista é rir de quem já está no topo’, diz Gui Sousa, roteirista do Lady Night (Multishow), que não acredita em riscos. “Para fazer você refletir enquanto cidadão. Vivemos num país cheio de problemas, material para rir não falta. O que faz uma pessoa optar escolher rir de gente que está sendo morta diariamente por conta desse mesmo discurso? Onde está a graça? Para mim, isso beira ao sádico.”

Humoristas que criticam a decisão da Justiça, como Mauricio Meirelles, se preocupam com a abertura de um precedente para que outros temas sejam vetados. “Se utilizam de um argumento de subterfúgio muito bonito para a população ficar ‘nossa, eles estão protegendo as minorias’. E, no fundo, não. Estão vendo brechas na lei para proibir pessoas que não importam politicamente em um jogo que está acontecendo”, disse em seu perfil no Instagram. Splash entrou em contato com o humorista, mas não obteve retorno.

Um dos principais nomes envolvidos no debate das redes sociais após a decisão da Justiça, Fábio Porchat afirma que “o tal limite do humor é a Constituição” e critica a decisão por ter colocado um veto prévio a conteúdos de Leo Lins sobre determinados assuntos. “Dentro da lei pode-se fazer piada com tudo. Não gostar de uma piada não te dá o direito de impedir ela de existir. Ainda mais previamente”, escreveu, também nas redes sociais.

Especialista em diversidade afirma que é necessário ponderação para restringir conteúdos, mas defende que existam limites. “Passamos por tempos sombrios no passado, e a censura foi um terrível mal da ditadura”, diz Deives Rezende Filho, 61, criador da Condurú Consultoria, especializada em equidade e inclusão. “Precisamos ter cuidado para não acabar com a liberdade de expressão das pessoas, mas tudo tem que ter limite.”

Para Deives, as piadas são, “sem dúvida alguma, usadas para manter as estruturas hegemônicas”. O especialista usa o livro “Racismo Recreativo”, de Adilson Moreira, para exemplificar. “Aqui neste livro, na página 21, o Adilson comenta sobre um episódio com o Léo Lins em 2017. Estamos em 2023. Em seis anos, esse humorista não aprendeu os limites.”

Entenda o caso:

A juíza Gina Fonseca Corrêa proibiu o humorista de produzir, distribuir ou manter no ar “conteúdo depreciativo ou humilhante a qualquer categoria considerada minoria ou vulnerável”. Ela cita como proibidos conteúdos “em razão de raça, cor, etnia, religião, cultura, origem, procedência nacional ou regional, orientação sexual ou de gênero, condição de pessoa com deficiência ou idosa, crianças, adolescentes e mulheres”.

No show removido após a decisão, Leo Lins ironiza temas como abuso sexual, zoofilia, racismo, pedofilia e gordofobia. As piadas também citam pessoas famosas e incluem comentários jocosos a respeito de crimes e tragédias, como o incêndio na Boate Kiss.

Leo Lins disse, através da sua defesa, ver a medida cautelar como censura. Ele diz que está preparando as “medidas cabíveis” para questionar a decisão.

Em decisão, juíza disse não ver censura e argumentou estar limitando falas que representam transgressões às leis. “É dever dos poderes democraticamente constituídos estancar qualquer agressão à ordem constitucional brasileira”, escreveu a magistrada.

*Com informações de Uol