Para fazer prevalecer o que defende como o “melhor caminho” no licenciamento ambiental, a ministra Marina Silva terá que convencer o Congresso Nacional, um terreno até aqui hostil à pauta.
Nos cerca de 20 anos de tramitação do projeto até sua aprovação, nunca houve acordo sobre seu mérito. Agora, o tema ganha novo capítulo com os 63 vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e um novo projeto de lei —tudo isso precisa passar pelo crivo dos parlamentares.
“É uma pergunta que a gente precisa se fazer o tempo todo”, diz a ministra sobre a dificuldade de consenso.
“Acho que há uma curva de aprendizagem. Agora é o momento de convencer aqueles que acham que deveria voltar para o processo anterior de que o governo criou um encaminhamento que dialoga com as expectativas do Congresso e atende a todos”, acrescenta.
Em linhas gerais, o Congresso aprovou uma lei que flexibilizou e simplificou o processo de licenciamento ambiental, sob argumento de dar maior celeridade ao desenvolvimento econômico do país.
Um dos principais dispositivos para isso é a LAC (Licença por Adesão e Compromisso), na qual empreendimentos de pequeno e médio porte podem ser autorizados diante do compromisso do empreendedor em respeitar exigências ambientais.
Outro, a LAE (Licença Ambiental Especial), impulsionada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), permite ao governo federal escolher projetos considerados estratégicos, por meio de um conselho ministerial, que têm prioridade no licenciamento —o que pode beneficiar a exploração de petróleo na Foz do Amazonas.
Ambos os dispositivos foram vetados por Lula, mas também incorporados, com ajustes, ao projeto de lei de urgência constitucional (que tramita mais rapidamente) enviado ao Congresso. O objetivo é que eles não sejam derrubados, mas novamente debatidos, até se chegar a um acordo.

A LAE, inclusive, foi acelerada por Lula, que publicou uma medida provisória que define que ela passa a vigorar imediatamente —antes, pelo texto dos parlamentares, o mecanismo demoraria seis meses para valer.
A ministra mantém críticas duras a pontos que considera inconstitucionais da proposta do Congresso, mas admite que ela trouxe “avanços conceituais” aproveitados no novo projeto.
“Conseguimos dar segurança jurídica para investimentos, investidores e empreendedores. Integrar as inovação do Congresso a vetos que mantém a integridade do licenciamento, a proteção do meio ambiente e o direito das comunidades. Ganhando agilidade, sem perder qualidade, e assegurando processos compatíveis com o arcabouço legal e a Constituição”, afirma.
Isso não quer dizer, porém, que o caminho esteja pavimentado no Congresso.
Desde 2023, os parlamentares já aplicaram uma série de reveses a Marina, como a desidratação da pasta ambiental, a nova lei dos agrotóxicos ou o próprio licenciamento.
Ela afirma que a Secretaria de Relações Institucionais, comandada pela ministra Gleisi Hoffmann, deve liderar o diálogo nas próximas semanas, e que pretende conversar com os presidentes Davi Alcolumbre e Hugo Motta (Republicanos-PB), da Câmara, além de líderes e frentes parlamentares.
A bancada ruralista, principal fiadora da aprovação do projeto no Congresso e crítica ferrenha de Marina, ainda não se posicionou sobre o tema.
Segundo o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, foram 398 novos mercados abertos desde o início do terceiro governo Lula —o que, para Marina, é em parte resultado das leis de proteção à natureza.
“O valor nutricional da nossa agricultura já existia antes, o valor sanitário, também, e a capacidade de produzir em constância e quantidade, também. Quais são as grandes novidades [com relação ao governo anterior]? O engajamento do presidente, do ministro, e uma política ambiental articulada, com credibilidade e que dá resultados: a queda do desmatamento”, diz.

“O esforço no licenciamento ambiental não deve ser para proteger menos, mas para proteger mais. Porque, senão, teremos uma situação na qual, em pouco tempo, os mais prejudicados são aqueles que agora imaginam que estejam sendo beneficiados”, acrescenta.
No entendimento do governo, por exemplo, o principal problema da LAE era ela prever apenas uma etapa de análise ambiental para que todo o empreendimento fosse aprovado.
A proposta exige mais fases, mas mantém o prazo máximo de 12 meses para conclusão do processo, e o órgão ambiental ganha uma equipe reforçada para realizar a tarefa dentro deste tempo —assim, garantindo celeridade, sem ignorar riscos.
Marina afirma que a priorização de projetos estratégicos proposta pela LAE já acontece, na prática, com o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
Porém, se antes essa decisão dependia só de um processo bilateral entre o ministério interessado na obra e a Presidência, agora a escolha passará por todas as pastas que constituem o conselho de governo.
Argumento semelhante ela usa com a LAC, dispositivo que hoje já é aplicado por estados e municípios, mas não em nível federal.
O governo manteve o mecanismo no projeto de lei, mas restringiu sua aplicação a casos de pequeno potencial poluente —o Congresso previa também para casos médios.
Se a redação aprovada pelo Congresso dava total liberdade para que os estados e municípios criassem regras de licenciamento próprias, a proposta do Executivo determina que tais normas precisam estar alinhadas com diretrizes nacionais.
O governo também vetou a restrição de consulta a terras indígenas, comunidades quilombolas e unidades de conservação durante o processo de licenciamento, mas estipulou um procedimento mais claro que o atual na redação do projeto.
