O Brasil enfrenta uma crise silenciosa que vem ganhando proporções alarmantes: os ataques de abelhas africanizadas aumentaram 83% entre 2021 e 2024, saltando de 18.668 para 34.252 ocorrências registradas. Mais grave ainda é o número de mortes, que mais que dobrou no período, atingindo 125 óbitos tanto em 2023 quanto em 2024.
Os dados, que colocam os ataques de abelhas acima dos registros de ataques de serpentes desde 2023, motivaram pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) a publicar um estudo na revista científica Frontiers in Immunology, classificando o envenenamento por picadas de Apis mellifera como um problema de saúde pública negligenciado.
Problema cresce sem tratamento específico
“Ainda hoje não existe um antídoto contra o veneno de abelhas, como os que temos para as picadas de serpentes, aranhas e escorpiões”. É o que explica Rui Seabra Ferreira Júnior, médico-veterinário e diretor do Centro de Estudos de Venenos e Animais Peçonhentos (Cevap) da Unesp. Ele coordenou a pesquisa.
Apenas nos primeiros sete meses de 2024, o país já registrou mais de 18 mil acidentes com abelhas, evidenciando a gravidade crescente do problema. A ausência de um tratamento específico para essas vítimas é um dos principais argumentos dos pesquisadores para classificar a situação como questão negligenciada de saúde pública.
Causas do crescimento ainda são investigadas
Osmar Malaspina, biólogo do Instituto de Biociências da Unesp em Rio Claro e uma das maiores autoridades no estudo de abelhas no Brasil, aponta possíveis fatores para o aumento dos casos. “Especulamos sobre uma combinação entre o desmatamento, com perdas de habitat nas matas, e a procura por novos locais para ninhos próximos a áreas urbanas”, afirma o especialista.
O pesquisador também destaca a busca das abelhas por alimentos gerados pelas atividades humanas em determinadas épocas do ano como outro fator que intensifica o contato entre humanos e insetos.
Efeitos variam conforme o sistema imunológico
Benedito Barraviera, docente da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB) e cofundador do Cevap, esclarece que os efeitos das picadas dependem fundamentalmente do sistema imunológico de cada pessoa. “Não é possível determinar quantas ferroadas irão colocar a pessoa em situação de risco”, alerta o médico.
O especialista identifica dois tipos principais de acidentes:
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Reações alérgicas: pessoas alérgicas podem desenvolver choque anafilático com apenas uma picada, situação que exige injeção imediata de adrenalina e atendimento médico de emergência.
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Intoxicação por múltiplas picadas: quando uma pessoa não alérgica recebe muitas picadas simultaneamente, o excesso de veneno pode causar complicações neurológicas e renais. Isso além de torpor neurológico com risco de parada cardiorrespiratória.
Tratamento atual é limitado e custoso
A falta de um soro específico contra ferroadas de abelhas africanizadas torna o tratamento mais caro e imprevisível. “O protocolo atual é aplicar apenas o tratamento para os sintomas”, explica Barraviera. “Se o soro antiapílico desenvolvido pelo Cevap já estivesse disponível no Sistema Único de Saúde (SUS), seria possível lidar com todas essas complicações de uma só vez e com mais segurança.”
Na ausência de tratamentos específicos, os especialistas recomendam medidas preventivas rigorosas:
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Nunca manusear colmeias sem equipamento adequado
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Evitar uso de inseticidas e venenos próximos aos ninhos
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Não fazer movimentos bruscos ou ruidosos near dos enxames
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Isolar o local quando identificar ninhos
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Contactar imediatamente a Defesa Civil, Bombeiros ou empresas especializadas em remoção