O líder chinês, Xi Jinping, conversou ao telefone com o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, informou hoje (26), por mídia social, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Hua Chunying. Segundo ela, a ligação telefônica foi realizada por iniciativa de Kiev.
O diálogo era aguardado desde que Pequim apresentou o documento “Posição da China sobre a Solução Política da Crise na Ucrânia”, no último dia 24 de fevereiro, quando a guerra no Leste Europeu completou um ano de duração. O plano de paz, que continha sugestões de passos para a resolução do conflito, foi recebido positivamente por Rússia e Ucrânia, mas rejeitado pelos Estados Unidos e por países europeus.
Xi disse a Zelenski na ligação que “a China sempre esteve do lado da paz” e que sua “postura central é facilitar as negociações”. “A China não criou a crise na Ucrânia nem é parte dela. Como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU e grande país responsável, não ficaria de braços cruzados nem colocaria gasolina no fogo, muito menos exploraria a situação para ganhos próprios.”
O trecho soa como resposta ao presidente da República Tcheca, Petr Pavel, que em entrevista ao site político acusou a China de querer estender a guerra, por ganhos econômicos. “Com o pensamento e as vozes racionais agora em ascensão, é importante aproveitar a oportunidade para criar condições favoráveis à solução política da crise”, afirmou o dirigente chinês, que no último mês teve encontros com os presidentes de França, Emmanuel Macron, e Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Diálogo e negociações são a única saída viável para a crise, e ninguém ganha uma guerra nuclear”, disse Xi.
Ainda de acordo com a porta-voz, Pequim irá agora enviar à Ucrânia “e a outros países” seu representante especial para Assuntos Eurasiáticos, Li Hui, ex-embaixador em Moscou, para “comunicações de caráter aprofundado com todas as partes, sobre a solução política da crise”.
Nas redes sociais, Zelenski afirmou que teve “um telefonema longo e significativo” com Xi Jinping, com duração de cerca de uma hora. “Acredito que esta ligação, assim como a nomeação do embaixador da Ucrânia na China, dará um poderoso impulso ao desenvolvimento de nossas relações bilaterais”, comentou. O ucraniano nomeou o ex-ministro Pavel Riabikin como novo embaixador no país asiático. Kiev estava sem representante em Pequim desde 2021.
Segundo a agência estatal russa RIA Novosti, a porta-voz da chancelaria russa, Maria Zakharova, destacou o desejo de Pequim de facilitar as negociações. “Mas o problema é que o regime de Kiev demonstra sua rejeição a quaisquer iniciativas sensatas para uma solução política e diplomática à crise ucraniana, e o eventual acordo para negociações está condicionado a ultimatos com exigências obviamente irrealistas.”
A China é a mais importante aliada da Rússia no cenário geopolítico que se redesenhou após o início da guerra. Xi e Putin estiveram juntos em Pequim dias antes da invasão e lá celebraram uma “amizade sem limites”. Há pouco mais de um mês, o dirigente chinês foi a Moscou —uma visita considerada um novo desafio aos EUA e uma reafirmação da aliança com o presidente russo. E na semana passada, os chefes da defesa de ambos os países também estreitaram os laços de “cooperação técnica e militar”.
Esse nível de proximidade, por óbvio, compromete os argumentos chineses de imparcialidade. Entre os 12 pontos que Pequim apresentou há dois meses para encerrar o conflito, estão “respeitar a soberania de todos os países”, “cessar hostilidades”, “proteger a exportação de grãos” e “parar as sanções unilaterais”. O projeto, no entanto, foi recebido com ceticismo justamente porque o Ocidente não acredita na neutralidade do gigante asiático.
De todo modo, EUA e União Europeia receberam a notícia da conversa entre Xi e Zelenski com o mesmo grão de sal. Na Casa Branca, o porta-voz de segurança nacional, John Kirby, disse que o chinês e o ucraniano “são dois líderes soberanos” e que os EUA estão “felizes em ver que eles conversaram”. Questionou, no entanto, a eficácia do diálogo. “Isso é uma coisa boa. Agora, se vai levar a algum tipo de movimento, plano ou proposta de paz significativa, ainda não sabemos.”
Segundo Kirby, os EUA veem com bons olhos “qualquer esforço para chegar a uma paz justa, desde que essa paz possa ser sustentável e confiável”. Para ele, essa é uma conta a ser paga pela Rússia. “Há muito tempo dizemos que queremos que esta guerra termine. Poderia terminar imediatamente se Putin partisse. Isso não parece provável, pelo menos não no futuro próximo.”
O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, seguiu uma argumentação parecida e disse esperar que esse seja apenas o primeiro passo para que a China “assuma um papel de convencer a Rússia a parar com a sua agressão”. O espanhol, no entanto, sinalizou que qualquer proposta de paz deve ser justa e reconhecer os direitos da Ucrânia a soberania e integridade das fronteiras. “Não é paz se alguém se vê obrigado a se render diante de uma invasão brutal.”
Com informações da Folha de S.Paulo