Mesmo passados quase 20 anos, Inri Cristo continua tendo destaque na mídia - Foto: Reprodução / Instagram

Uma ex-profissional de marketing de 29 anos decidiu mudar de vida e largou tudo para se tornar seguidora de Inri Cristo, o polêmico mentor espiritual que se considera a reencarnação de Jesus na Terra.

Ali Papillon Franklin viu Inri Cristo na TV e decidiu seguir sua doutrina. Natural de Brasília, ela trabalhava com marketing e levava uma rotina considerada normal, frequentando baladas e academias. “Eu gostava da minha vida, mas sempre senti que faltava algo”, comentou.

“Como alguém tão inteligente pode acreditar nisso?”

A decisão veio após um longo processo de “descoberta e reflexão”. Um amigo falava constantemente sobre Inri e recomendava que ela acessasse o site do mentor. Inicialmente, ela não deu muita atenção, mas a insistência do amigo a levou a pesquisar mais sobre o líder espiritual. “Eu pensava: como alguém tão inteligente pode acreditar nisso?”, contou.

O primeiro contato visual com o mentor ocorreu enquanto ela assistia a um programa do apresentador Raul Gil, na televisão. Ela afirma que viu “rapidamente” o rosto de Inri e pensou: “Parece que ele acredita mesmo que é Cristo”.

Somente depois, ao buscar vídeos no YouTube e acessar o site oficial do mentor, Ali Papillon sentiu um ‘clique’. Ao explorar os conteúdos, conta que começou a perceber “uma certa coerência” nas falas de Inri Cristo e sentiu como se estivesse despertando para uma nova realidade. O impacto foi tão forte que ela decidiu compartilhar a experiência com sua avó, perguntando se ela também enxergava o que estava vendo. “Eu vi que ele era o Filho de Deus, era algo impossível de explicar”, recorda.

A partir dali, Ali decidiu que precisava se aproximar do seu futuro mentor, mas esse não foi um caminho fácil. Seu primeiro encontro com o “mestre” foi marcado por emoção e dificuldades. Um acidente de trânsito a impediu de comparecer às primeiras audiências, mas quando finalmente o encontrou, sentiu um forte impacto e chorou ao entrar no local.

“Após o acidente, surgiu novamente uma oportunidade e eu consegui chegar na presença dele. Ao entrar no portão, até chorei de emoção por ter conseguido. Por um segundo pensei que não teria coragem de olhar o filho primogênito de Deus pessoalmente, pois estava muito emocionada e nervosa. Tentei pedir um abraço, mas não foi possível. Solicitei novas audiências, e quanto mais o tempo passava, mais impressionada eu ficava com a legitimidade, com a autenticidade dele.” Ali Papillon Franklin.

Tanto que Ali decidiu largar tudo e ir viver na comunidade criada por ele, em uma chácara no Núcleo Rural Casa Grande, no Gama, a 30 km da região central de Brasília. Há cinco anos, a ex-profissional de marketing veste a túnica da organização e pode ser vista nos canais mantidos por Inri em plataformas como Instagram, TikTok e YouTube.

Ali tinha 24 anos quando se encantou pela figura e pelas palavras de consolo de Inri Cristo – Foto: Arquivo Pessoal

Diferentemente de outras discípulas que vivem na comunidade, ela não canta e faz dancinhas de músicas famosas, com letras alteradas para honrar o “mestre”. Ela divulga livros, fala sobre o trabalho de Inri e promove a proximidade da organização com o público exterior.

A convivência reforçou sua convicção sobre a identidade do mestre. Para ela, ele é autêntico e não se comporta de forma diferente diante de públicos distintos. “Inri logo identifica se a pessoa é meramente um curioso ou se é um livre-pensador que almeja conhecer a verdade. Inri não espera pessoas que creem meramente nele e sim pessoas que tiveram a revelação divina, como graças a Deus eu tive”, ilustra Ali.

Entre as “provas” de que o mentor seria realmente a reencarnação de Jesus, ela relata ter experimentado um processo de cura após receber bênçãos de Inri Cristo. Ela diz que sofria de um problema cardíaco agravado pela covid-19 e chegou a ter dificuldades para andar. Após pedir as bênçãos do mentor, conseguiu tratamento rápido e se recuperou. “Senti uma energia muito forte quando ele colocou as mãos sobre mim. Em poucos dias, estava curada”, garante.

O que é a SOUST

A SOUST (Suprema Ordem Universal da Santíssima Trindade) é a organização fundada por Inri Cristo em 1982. Segundo seus seguidores, trata-se de uma nova ordem filosófica e mística que representa o Reino de Deus na Terra. Ela tem sede em Brasília e segue princípios específicos, incluindo regras de conduta, hierarquia interna e um modo de vida comunitário.

Inri Cristo, nascido Álvaro Thais, 76, obteve na Justiça em 2024 o direito de usar o nome pelo qual ficou famoso. Ele ganhou notoriedade nos anos 1990 e 2000 por suas participações polêmicas em programas de TV, declarando ser a reencarnação de Jesus. Seu nome vem da sigla “INRI” (Iesus Nazarenus Rex Iudaeorum, em latim), que foi colocada sobre a cruz de Jesus para indicar sua condenação como “Rei dos Judeus”. A palavra Cristo, por sua vez, tem origem grega e significa “ungido”.

Como membro da organização, Ali estuda comunicação, para poder preencher seu posto de voluntariado na Ordem, de acordo com sua própria vocação. “Aqui cada um tem suas funções, atua em uma área de acordo com sua aptidão. Eu aqui estou estudando comunicação, pois Inri disse que essa é minha vocação, portanto, estou sendo treinada aqui para me comunicar com o público”.

Antes de serem aceitos na comunidade, os discípulos passam por um processo de pelo menos sete meses antes de se tornarem discípulos e fazerem um juramento.

“Após esse período, o aspirante recebe uma túnica cor de argila, simbolizando nossa ligação com a mãe Terra e somente com o passar do tempo, de acordo com nossas obras e evolução, podemos graduar e receber a túnica azul, simbolizando a cor do céu.” afimrou Ali Papillon Franklin.

A discípula destaca que todos na comunidade vestem as túnicas 24 horas por dia. “Já me perguntaram se trocamos de roupa depois que a mídia vai embora, mas não. As túnicas fazem parte da nossa vida”, explica. “Óbvio que temos túnicas de serviço para usar em casa, por exemplo: a túnica de quem faz jardinagem, faxina, é mais gasta, mais surrada, mas todos temos túnicas bem apresentáveis para usar em público, túnicas com o mesmo modelo”.

A seguidora reforça que, mesmo com regras impostas para os membros, há liberdade de ir e vir. Ela sai para compromissos pessoais, como consultas médicas, e afirma que ex-seguidores visitam Inri normalmente. “Ninguém é obrigado a ficar. Mas quem entende a verdade, não quer ir embora”.

A liberdade, porém, tem seus limites no local, onde não se pratica sexo, e a sustentação financeira vem de doadores chamados beneméritos. “Quando alguém tem inquietude e não consegue vencer a carne, Inri os libera, dispensa sem problema algum. E essas pessoas voltam a frequentar a comunidade como amigos dele, revisitam-no a fim de receber bençãos”, conta.

Constituição e profecias

A família e os amigos não reagiram bem à sua decisão, mas Ali se resguarda na Constituição. Segundo ela, apenas sua mãe apoiou a escolha, enquanto outros consideraram sua decisão como loucura. “Obviamente que ninguém gostou, pois geralmente as pessoas julgam que os seguidores de Inri Cristo são loucos”.

“Minha genitora me disse que eu tomava a decisão certa e que eu iria ser muito feliz, e assim foi. Do restante, ninguém me apoiou. Porém, a Constituição Federal respalda o meu direito de ir e vir e aqui eu estou, respaldada pela Constituição do Brasil”.” disse Ali Papillon Franklin.

Ali afirma que não sente saudades da vida anterior. Ali é uma apreciadora das profecias de Inri, entre elas a de que as igrejas se tornarão decadentes em todo o mundo. Ela acredita nas previsões do mentor, de que templos religiosos se tornarão albergues para moradores de rua, conforme previsão do líder. “O mundo ainda não está pronto para aceitar essa verdade”.

A ex-profissional de marketing acredita que seu mentor enfrenta rejeição semelhante à de Jesus de Nazaré. Ela diz que a crucificação moderna ocorre através do boicote da mídia, que ignora sua presença e suas profecias. “Ele está sendo rejeitado de novo, como há dois mil anos”.

Para ela, seguir Inri Cristo lhe deu plenitude e sentido. “Se pudesse voltar no tempo, teria vindo antes”.

*Com informações de Uol