Queimadas - Foto: Augusto Dauster / Ibama

As queimadas são um fenômeno recorrente e preocupante no Brasil, impactando diretamente o meio ambiente, a saúde pública, a economia e o equilíbrio climático. Segundo especialistas, mesmo assim, a causa predominante desse desastre no Brasil ainda é a ação humana.

Muitas vezes associadas a práticas agrícolas, desmatamento ilegal ou eventos naturais, essas ocorrências se intensificam durante os períodos de seca e afetam com força os biomas mais sensíveis, como a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal.

Embora algumas queimas controladas façam parte de técnicas tradicionais de manejo da terra, o uso indiscriminado do fogo causa danos à biodiversidade e aos recursos naturais do país.

Em entrevista, o tenente-coronel Gil Correia Kempers Vieira, pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Desastres da Universidade Federal Fluminense (NEPED-UFF) e oficial do Corpo de Bombeiros Militar, destaca a principal origem das queimadas: o ser humano.

“Em todas as regiões do país, infelizmente a maior causa dos incêndios florestais está na ação humana. Seja a queimada para limpeza de terreno, seja para troca de cultura na agricultura ou o vandalismo, mais de 80% dos incêndios florestais têm relação à ação humana”.

O avanço de queimadas, especialmente em regiões de floresta densa ou de vegetação nativa, libera grandes quantidades de gases poluentes na atmosfera, contribuindo para o aquecimento global e a piora da qualidade do ar.

Além disso, comunidades indígenas, ribeirinhas e populações rurais são diretamente atingidas pelos incêndios, sofrendo com deslocamentos forçados, perda de territórios e impactos à subsistência.

Cidades próximas às áreas afetadas também enfrentam os reflexos, com o aumento de doenças respiratórias e prejuízos econômicos no setor agropecuário.

Área devastada pelo fogo na Amazônia – Foto: Christian Braga / Greenpeace

Além da ação humana direta, fatores ambientais contribuem para a propagação dos incêndios. Segundo o especialista:

“Tanto a estiagem quanto a crise hídrica têm uma influência direta nos incêndios florestais. A estiagem diminui a umidade relativa do ar e isso acaba agravando as condições para os incêndios florestais no país como um todo. Além disso, a crise hídrica reduz a questão dos mananciais e o abastecimento da população, levando muitas vezes à decretação de situação de emergência ou calamidade pública”.

Ele ainda alerta para os impactos colaterais desse processo. “Os elementos relativos à estiagem e os incêndios florestais agravam a condição de saúde da população, onde muitas vezes a fumaça agrava o quadro de doenças respiratórias, impactando na saúde pública e na lotação dos hospitais. Além disso, os incêndios florestais trazem muitos danos e prejuízos à economia e ao agronegócio”.

Apesar disso, é preciso desmistificar a ideia de que a natureza é a principal responsável por esses eventos. De acordo com Vieira, “são pouquíssimos os registros de incêndios naturais, provocados especialmente por raios. Grande parte dos incêndios tem origem na ação humana, e podem sim ser identificados através de perícias de incêndios, pois os indicativos são bem claros, deixando vestígios possíveis de serem rastreados”.

Ele também chama atenção para uma das causas mais delicadas e pouco discutidas: o uso do fogo como estratégia de ocupação de terras. “Em algumas localidades é possível afirmar que locais hoje suscetíveis a escorregamento, passaram por um processo de incêndio florestal, retirada da cobertura vegetal e posterior processo de erosão, aumentando inclusive o risco de eventos geológicos como, por exemplo, movimentos de massa”.

Apesar dos desafios persistentes, os primeiros meses de 2025 indicam uma mudança promissora nesse cenário, com redução das áreas queimadas e dos focos de calor em diversas regiões do país.

Brasil registra redução nas queimadas em 2025

O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), divulgou que houve uma queda expressiva nas áreas queimadas e nos focos de calor durante o primeiro semestre de 2025.

De acordo com dados divulgados pelo MMA, o país teve uma redução de 65,8% na extensão total de terras queimadas entre janeiro e junho de 2025, em comparação com o mesmo período do ano anterior. Em termos absolutos, a área afetada passou de 3,1 milhões de hectares no primeiro semestre de 2024 para cerca de 1 milhão de hectares em 2025.

As informações foram coletadas pelo Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais ( Lasa), da Universidade Federal do Rio de Janeiro ( UFRJ), e complementadas pela análise do sistema BDQueimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais ( Inpe). As análises também apontaram uma diminuição de 46,4% nos focos de calor no país, caindo de 35.938 registros em 2024 para 19.277 em 2025 — o menor índice desde 2018.

Nos primeiros meses de 2025, houve redução das queimadas no Brasil – Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil

A queda significativa foi observada em quatro dos seis biomas brasileiros: Pantanal, Amazônia, Mata Atlântica e Cerrado. A melhora é atribuída a dois fatores principais: um cenário climático menos severo, com estiagens mais brandas, e o reforço nas políticas públicas de combate e prevenção a incêndios florestais.

Entre as medidas adotadas está a contratação de 4.385 brigadistas federais, o maior contingente já registrado, representando um aumento de 26% em relação ao ano anterior. Também entrou em vigor a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, sancionada em julho de 2024, que estabelece diretrizes integradas entre governo federal, estados, municípios, setor privado e sociedade civil para fortalecer a prevenção e resposta a incêndios.

Outro fator que contribuiu para os resultados foi o apoio financeiro do Fundo Amazônia, que desde 2023 destinou R$ 405 milhões para os Corpos de Bombeiros dos nove estados da Amazônia Legal. Até o momento, R$ 370 milhões já foram efetivamente contratados.

Além disso, em janeiro de 2025, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente ( Ibama) recebeu sete novos helicópteros, elevando em até 133% a capacidade de lançamento de água durante operações de combate ao fogo.

Destaques por bioma

O Pantanal foi o bioma com o desempenho mais expressivo. As queimadas recuaram 97,8%, passando de 607,9 mil hectares em 2024 para 13,4 mil hectares em 2025. Os focos de calor também caíram drasticamente: de mais de 3,5 mil para apenas 86 registros no semestre.

Na Amazônia, a redução nas áreas queimadas foi de 75,4%, com 247,9 mil hectares afetados neste ano frente a mais de 1 milhão no ano anterior. Houve também queda de 61,7% nos focos de calor, passando de 13.489 para 5.169.

A Mata Atlântica apresentou um recuo de 69,7% na área queimada, indo de 91,9 mil para 27,8 mil hectares, e uma queda de 33,3% nos focos de calor, totalizando 2.619 registros em 2025.

O Cerrado, conhecido pela alta incidência de incêndios, teve redução de 47% na área queimada e de 33,1% nos focos de calor, com 724,6 mil hectares atingidos e 8.854 focos detectados no primeiro semestre de 2025.

Em contraste, os biomas Caatinga e Pampa registraram aumento nos dois indicadores. Na Caatinga, a área afetada cresceu de 34,4 mil para 38,3 mil hectares, e os focos de calor subiram de 1.632 para 2.161. Já o Pampa teve um salto de 7,1 mil para 11,5 mil hectares queimados, com aumento de focos de 123 para 388.

*Com informações de IG