Imagens mostram o Benício Xavier com os pais dentro do Hospital Santa Júlia, onde o menino morreu - Foto: Reprodução / TV Globo

O pai do menino Benício Xavier, 6, que morreu após receber uma dose fatal de adrenalina na veia em um hospital particular de Manaus, disse que, após a confirmação do óbito, pediu perdão ao filho por colocá-lo na maca para receber a “injeção mortal” de adrenalina que provocou a morte dele.

O pai da criança, Bruno Freitas, contou que se ajoelhou ao lado do filho enquanto o menino sofria paradas cardiorrespiratórias seguidas. Ele afirmou ao Domingo Espetacular (Record TV) que pediu perdão ao menino.

“A única coisa que eu faço é me ajoelhar ao lado do leito. Eu seguro na perna dele, eu rezo por ele, eu peço que ele volte, eu grito bastante para ele voltar, para ele ter força. Falo ‘Bora, Benício, bora, Benício’. [Depois da confirmação do óbito,] eu chego lá perto dele, eu o beijo, abraço e peço perdão. Peço perdão por tê-lo colocado naquela maca para tomar aquela injeção mortal.” disse Bruno Freitas.

Bruno declarou que nenhum pai ou mãe leva o filho para o hospital para que ele morra. Ele afirmou ao Fantástico (TV Globo) que houve uma sucessão de erros e negligências que culminaram na morte da criança. Antes da aplicação de adrenalina, segundo a mãe, o menino estava normal, mas com “medo de ser furado” com a injeção.

“Benício não teve chance”, diz delegado responsável pelo caso. Segundo Marcelo Martins, o caso demonstra uma sequência de erros estruturais, de protocolo e de cuidados. Para a polícia, não há dúvidas que a criança foi vítima de um homicídio. A Polícia Civil apura se houve falhas na intubação do menino e porque um farmacêutico não checou a prescrição de adrenalina.

“A médica simplesmente emitiu uma prescrição e não revisou, que seria uma conduta básica de dupla checagem. A técnica de enfermagem também poderia ter realizado a dupla checagem e teria evitado esse resultado.” afirmou o delegado Marcelo Martins à TV Globo.

Hospital rebateu declaração da médica, que atribuiu o erro ao sistema usado pelo hospital. “Sem ação do médico, o sistema não faz nada de forma automatizada”, declarou ao Fantástico o superintendente de tecnologia da informação do Hospital Santa Júlia, onde a criança morreu. Antes de apontar o erro do sistema, a médica Juliana Brasil Santos havia admitido ter errado a prescrição de Benício.

Pais afirmaram que vão buscar por justiça. Eles ressaltaram à Record TV não querer vingança nem algo financeiro, mas, somente, a penalização dos responsáveis pela morte da criança.

A médica Juliana Brasil Santos foi a responsável por prescrever a adrenalina ao menino Benício – Foto: Reprodução / TV Globo

“A gente sempre vai lembrar dele, da criança que ele era. Uma criança pura, meiga. Não era desobediente. O ser vivo mais puro que eu já encontrei, que eu já conheci na humanidade.” disse Pai de Benício à TV Globo.

Advogado de médica diz não ver erro

Felipe Braga, que representa Juliana, disse ao Fantástico que houve falha no sistema de prescrição e nos procedimentos seguintes de atendimento ao menino. “[Houve problema] desde o momento em que há uma quebra da dupla, tripla checagem, a falta de um farmacêutico na farmácia”, apontou.

“Eu não considero que ela errou.” disse o advogado da médica Juliana Brasil Santos.

Relembre o caso

Benício Xavier de Freitas foi internado no dia 22 de novembro, no Hospital Santa Júlia. Na ocasião, a criança apresentava quadro de tosse seca e tinha suspeita de laringite. O relato foi feito pelos pais do menino e consta no boletim de ocorrência registrado pela Polícia Civil do Amazonas.

Juliana Brasil Santos, médica responsável por atender Benício, prescreveu uma série de procedimentos, entre os quais três doses de adrenalina intravenosa. As três doses de adrenalina, de 3 ml cada, deveriam ser aplicadas ainda no hospital, com intervalo de 30 minutos entre uma e outra. Benício chegou a receber uma dose.

Pais estranharam a prescrição para adrenalina por via intravenosa. Eles alegaram que, até então, a criança só havia recebido adrenalina por nebulização, ou seja, inalar o medicamento na forma de aerossol por via respiratória, não venosa —sem ser ministrado direto na corrente sanguínea.

Apesar da ressalva dos pais, a primeira dose de adrenalina foi aplicada por via intravenosa. Técnica de enfermagem alegou que deveria seguir o tratamento indicado pela médica na receita. Durante o período de internação na UTI, Benício sofreu seis paradas cardíacas. A equipe médica conseguiu reanimá-lo cinco vezes, mas a morte foi confirmada na madrugada do domingo (30).

Benício morreu em decorrência de uma overdose de adrenalina. A causa do óbito foi tornada pública pelo delegado do caso, Marcelo Martins, em entrevista. O caso é investigado como homicídio doloso qualificado —quando há intenção de matar.

Delegado explicou que a defesa de Juliana nega negligência. Conforme Martins, os advogados alegam que a médica teria solicitado um antídoto para reverter o quadro clínico de Benício, mas, segundo o delegado, um médico ouvido no decorrer da investigação apontou “que não existe antídoto para esse tipo de situação”. O delegado também afirmou que Juliana declara que o erro ocorreu por uma falha no sistema do hospital.

Juliana responde ao processo em liberdade. A Polícia Civil chegou a pedir a prisão dela, mas a solicitação foi indeferida pela desembargadora Onilza Abreu Gerth, que disse não haver “fundamentos suficientes” para a detenção.

Investigação mostrou que a médica pediu ajuda a um colega por mensagem e mencionou “desespero” após o menino receber adrenalina de forma intravenosa e passar mal. Nas mensagens, Juliana fala duas vezes que prescreveu a aplicação da adrenalina de forma errada. A conversa foi divulgada em prints publicados nas redes sociais, que tiveram a veracidade confirmada pela polícia, segundo a TV Amazônica.

Caso segue sob investigação. Ainda segundo o delegado, o inquérito vai determinar se houve negligência ou erro médico no atendimento a Benício. Polícia não esclareceu se a técnica de enfermagem também é investigada.

O que dizem as partes envolvidas

Defesa de Juliana disse que aguarda a “oitiva formal dos envolvidos” para se manifestar. A médica é representada pelos advogados Felipe Braga e Alessandra Vila.

Técnica de enfermagem afirma que seguiu as orientações prescritas pela médica. Raíza Bentes confirmou em entrevista à imprensa na saída da delegacia que os pais de Benício questionaram se a adrenalina seria aplicada por nebulização, e ela respondeu que a médica havia prescrito por via intravenosa. A técnica afirmou ter aplicado a adrenalina apenas uma vez.

Hospital Santa Júlia informou investigar internamente a morte de Benício e afastou a médica e a técnica. A unidade de saúde reforçou que está “oferecendo apoio à família em tudo o que for necessário”. “Seguimos comprometidos com a segurança do paciente, a ética e a responsabilidade assistencial que orientam a atuação da instituição.”

*Com informações de Uol