Líder militar do Hamas desde 2017, Yahya Sinwar é apontado como o maior responsável pelos ataques de 7 de outubro a Israel (Foto: Mahmud Hams / AFP)

Dez dias após o maior atentado da História de Israel completar um ano, o Exército israelense afirmou ter eliminado aquele que é apontado pelas autoridades do país como o principal idealizador do ataque. O líder do Hamas, Yahya Sinwar, a quem autoridades do Estado judeu se referiam como um “homem morto ambulante” desde o ato terrorista que matou 1,2 mil pessoas em Israel em 7 de outubro de 2023, foi assassinado em uma operação militar no sul da Faixa de Gaza na quarta-feira, anunciaram fontes israelenses nesta quinta, após a realização de uma série de exames periciais para confirmar sua identidade. Integrante da estrutura decisória do grupo palestino havia quase uma década, Sinwar sai de cena após ter sido uma figura-chave na ofensiva do ano passado, que levou a uma guerra que já vitimou mais de 42 mil pessoas em solo palestino e espalhou-se para o vizinho Líbano, deixando o Oriente Médio à beira de uma conflagração regional.

“O mal sofreu um duro golpe hoje. Nós vamos continuar a trabalhar para trazer de volta os nossos reféns. O Hamas não vai permanecer no poder”, afirmou o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, em um pronunciamento na tarde desta quinta-feira, o primeiro no qual se referiu à morte de Sinwar.

Rumores sobre a morte do chefe do Hamas, acusado por Israel de ser o idealizador do atentado terrorista de 7 de outubro de 2023, começaram a ganhar força na manhã desta quinta, quando as Forças Armadas de Israel afirmaram que havia uma “probabilidade” de que ele tivesse sido morto durante uma operação. A confirmação oficial ocorreu horas depois, em um comunicado conjunto do Exército e do serviço de inteligência.

“A FDI e a ISA confirmam que após uma perseguição de um ano, ontem (quarta-feira), 16 de outubro de 2024, soldados do Comando Sul das FDI eliminaram Yahya Sinwar, o líder da organização terrorista Hamas, em uma operação no sul da Faixa de Gaza. Yahya Sinwar planejou e executou o massacre de 7 de outubro, promoveu sua ideologia assassina antes e durante a guerra e foi responsável pelo assassinato e sequestro de muitos israelenses”, afirma o comunicado conjunto.

Ainda no comunicado, o comando israelense afirma que dezenas de operações realizadas no último ano, incluindo algumas nas últimas semanas na área onde Sinwar foi morto, restringiram o movimento operacional do líder do Hamas, levando a sua localização e eliminação.

“Nas últimas semanas, as forças das FDI e da ISA, sob o comando do Comando Sul, têm operado no sul da Faixa de Gaza, seguindo a inteligência das FDI e da ISA que indicou as localizações suspeitas de membros seniores do Hamas. Soldados da 828ª Brigada (Bislach) das FDI operando na área identificaram e eliminaram três terroristas. Após concluir o processo de identificação do corpo, pode ser confirmado que Yahya Sinwar foi eliminado”, acrescenta a nota.

O Hamas não confirmou a morte de Sinwar de forma oficial, mas fontes ligadas ao movimento ouvidos pela agência de notícias Reuters antes da declaração final de Israel afirmaram ter recebido indicações de que o chefe do grupo estava morto. Veículos de comunicação próximos ao grupo informaram mais cedo que os palestinos deveriam esperar pelo pronunciamento do Hamas, e que não confiassem na imprensa ocidental e israelense, que teria por objetivo quebrar “o espírito” da resistência palestina.

O embaixador de Israel na ONU, Danny Danon, também se pronunciou após a confirmação oficial do governo. Referindo-se a uma reunião realizada na quarta-feira no Conselho de Segurança da ONU para discutir a situação em Gaza, Danon disse que a morte de Sinwar era a resposta aos questionamentos sobre a continuidade das operações do Estado judeu em Gaza.

“Nossas Forças Armadas eliminaram Yahya Sinwar, o líder do Hamas e arquiteto-chefe do massacre de 7 de outubro. Ontem, no Conselho de Segurança da ONU, muitos perguntaram por que ainda estamos em Gaza um ano após as atrocidades de 7 de outubro. Hoje eles obtiveram a resposta”, escreveu o embaixador em uma publicação na rede social X. “Nenhum terrorista é imune ao longo braço das FDI. Não vamos parar até trazermos para casa todos os reféns e eliminarmos os monstros do Hamas”.

Duas fontes israelenses ouvidas em anonimato pelo Washington Post afirmaram que exames de DNA e um reconhecimento feito a partir da arcada dentária permitiram confirmar a identidade do palestino, apontado por Israel como o mentor do atentado terrorista de 7 de outubro de 2023. Em uma nota publicada mais cedo, os próprios militares israelenses haviam citado a realização de testes de DNA.

Dinheiro, documentos de identificação e equipamentos de combate teriam sido encontrados junto aos corpos dos três mortos na operação, segundo o jornal israelense Haaretz.

Enquanto a morte de Sinwar ainda era confirmada, o Hostages Families Forum, organização da sociedade civil criada para auxiliar as vítimas do atentado de 7 de outubro e suas famílias, pediu que as medidas no campo de batalha se revertam em conquistas para a soltura dos reféns.

“Apelamos ao governo israelense, aos líderes mundiais e aos países mediadores para que transformem a conquista militar em uma conquista diplomática, buscando um acordo imediato para a libertação de todos os 101 reféns: os vivos para reabilitação e os assassinados para um enterro adequado”, escreveu.

Há um ano, a localização de Sinwar era um mistério para as autoridades israelenses, que prometeram eliminar a ameaça do Hamas em Gaza e punir os responsáveis pelo atentado de 7 de outubro. Muito se especulou que o líder palestino estivesse escondido na densa rede de túneis mantida pelo grupo para operações ofensivas e deslocamentos no enclave.

Uma das hipóteses levantadas foi de que Sinwar teria se cercado de reféns capturados em Israel para impedir ou dificultar uma operação contra ele. Outra hipótese é de que se vestisse de mulher para escapar das operações. De acordo com o relato inicial israelense, não havia nenhum refém no local da operação.

Quem era Yahya Sinwar?

Líder do Hamas em Gaza desde 2017, Sinwar, de 62 anos, foi apontado como o maior responsável pelo ataque contra Israel em 7 de outubro de 2023, quando quase 1,2 mil pessoas foram mortas e mais de 250 foram sequestradas. Ele nasceu no campo de refugiados de Khan Younis e entrou para a militância armada quando Israel ainda ocupava a Faixa de Gaza. Sua primeira prisão foi em 1982, por “atividades islâmicas”, sendo novamente detido em 1985. Na época, se aproximou do fundador do Hamas, Ahmed Yassin, e assumiu o serviço de segurança interna do grupo. Seus alvos, além de pessoas acusadas de colaborarem com Israel, eram as “atividades imorais”, como lojas com material pornográfico. Em 1989, foi condenado à prisão perpétua por quatro homicídios.

Na prisão, tornou-se fluente em hebraico e, após ter feito uma cirurgia para retirar um tumor no cérebro, chegou a receber uma proposta para colaborar com Israel. Ele recursou. Em 2011, quando houve aquela que, até agora, era a mais famosa troca de reféns por prisioneiros da História de Israel — a de mil palestinos pelo soldado Gilad Shalit — Sinwar ganhou a liberdade e voltou para Gaza como um nome de destaque do Hamas.

Seis anos depois, em 2017, quando já integrava uma lista de pessoas consideradas terroristas pelos EUA, foi escolhido chefe do conselho político do Hamas na Faixa de Gaza, sucedendo a Ismail Haniyeh, que vivia no Catar. Apesar do passado “linha-dura”, que incluiu a ordenação de execuções de adversários mesmo quando estava na cadeia, os primeiros sinais enviados a Israel eram um pouco diferentes.

Em 2018, mandou mensagens, incluindo ao próprio premier Benjamin Netanyahu, afirmando que estava cansado da guerra e que seu objetivo era transformar Gaza numa sociedade funcional e pacífica. Um discurso que, como apontam analistas hoje, convenceu muita gente.

Ao longo dos anos, Sinwar manteve contatos indiretos com o governo israelense e com a Autoridade Nacional Palestina, que controla a Cisjordânia ocupada, obtendo inclusive novas permissões para cerca de 18 mil palestinos que vivem em Gaza trabalhassem em Israel. A ideia que passava era de que o Hamas não estava preocupado com a guerra, mas sim com o dia a dia dos mais de 2 milhões de habitantes do enclave.

Após a morte do chefe do Gabinete político do Hamas, Ismail Haniyeh, em um bombardeio israelense em Teerã, em julho, Sinwar foi nomeado como seu sucessor.

Com informações de O Globo (Com AFP e NYT)