
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) diz que o mercado financeiro brasileiro especula contra o real. Mas, na direção contrária, o saldo investido pelos fundos nacionais em dólar está negativo desde março de 2023, quando o governo federal apresentou o arcabouço fiscal.
Segundo dados da B3, apesar de a posição na moeda americana ter aumentado desde a mínima de US$ 17,5 bilhões negativos em janeiro deste ano, ela segue negativa em US$ 4,5 bilhões. Ou seja, o saldo das apostas dos fundos de investimento segue na valorização do real ante a moeda americana.
Segundo o presidente, porém, não são suas falas sobre gastos públicos que movem o câmbio, e sim operações financeiras que apostam contra o real.
“Tem especulação com derivativo para valorizar o dólar e desvalorizar o real, e o Banco Central tem que investigar isso”, disse Lula no fim de junho.
Derivativos são contratos negociados em Bolsa que dizem respeito a um determinado ativo, como ações ou commodities. Os mais comuns são os contratos de compra e de venda de dólares, que dão o direito ao contratante de comprar ou vender a moeda a um determinado preço.
Se o investidor acha que o dólar vai cair, ele compra um contrato de venda com uma cotação acima daquela que se espera. Quando o contrato vencer, se o dólar estiver mais barato que o estabelecido, ele lucra na diferença do preço do dólar daquele do contrato. Se o investidor acha que o dólar vai subir, contrata a venda a um valor abaixo do previsto para lucrar com a diferença no futuro.
“Quem estiver apostando em derivativo vai perder dinheiro nesse país. As pessoas não podem ficar apostando no fortalecimento do dólar e no enfraquecimento do real”, completou o presidente Lula.
Neste ano porém, o dólar sobe 13% ante o real, indo a R$ 5,4617 na última sexta (5), levando os fundos brasileiros que apostam no real a perderem dinheiro. Com isso, as posições contrárias à moeda americana têm caído. De R$ 17,50 bilhões negativos em dólar em janeiro deste ano —a maior aposta no real durante o Lula 3—, os fundos chegaram à mínima de R$ 3,57 bilhões negativos, em junho.

Com o recente recuo no discurso do presidente, que disse prezar pela responsabilidade fiscal, a aposta no real voltou a crescer e o saldo dos fundos nacionais foi para R$ 4,5 bilhões negativos no começo de julho.
“Fundamentos da economia brasileira mostram que temos espaço limitado para desvalorização substancial e perene do real”, afirma Jankiel Santos, economista do Santander Brasil.
O especialista elenca que a forte reserva internacional de dólares do Brasil (US$ 358,56 bilhões) e a balança comercial favorável fortalecem a moeda brasileira —o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços estima que a balança comercial do país terá um saldo positivo de US$ 79,2 bilhões neste ano.
Além disso, a pausa nos cortes da taxa de juros (Selic), mantendo-a em 10,50% também colabora a favor do real. A diferença entre os juros brasileiros e americanos (5,50%) seria o suficiente para não afugentar grande parte do investimento estrangeiro, reduzindo os dólares no país.
“O atual patamar da Selic ajuda a limitar o potencial de desvalorização que o real tem. Se o diferencial fosse menor, o dólar poderia superar os R$ 5,70”, diz Santos.
“Não existe especulação que dure se não houver fundamento por trás. O mercado não são cinco pessoas na Faria Lima operando. Todos nós somos agentes da economia, que é muito maior que a Faria Lima”, diz Daniel Miraglia, economista-chefe da Integral Group.
Com o recente aumento do risco fiscal, houve a redução da apostas dos fundos locais em real e o aumento da busca por proteção cambial de bancos e estrangeiros que investem no país.
“A posição dos fundos locais é mais direcional. Ou seja, é uma aposta em uma certa direção da moeda segundo os fundamentos previstos. Já a posição dos gringos não é especulativa. Estrangeiros [usam os contratos de dólar] como uma proteção para os investimentos que eles fazem aqui, especialmente em títulos públicos e em Bolsa”, diz Miraglia.
A posição dos estrangeiros em dólar chegou ao recorde nominal (sem correção pela inflação) em US$ 81,4 bilhões ao fim de junho.
