O cultivo de cacau tem gerado resultados otimistas em regiões da Bahia e do Amazonas que podem sinalizar caminhos para a agrofloresta (Foto: Míriam Ramalho / Wikimedia Commons)

Análise do Instituto Escolhas detectou que recuperar 1,02 milhão de hectares de áreas desmatadas com Sistemas Agroflorestais pode produzir 156 milhões de toneladas de alimentos e ainda remover 482,8 milhões de toneladas de CO2 da atmosfera.

Além dos benefícios do reflorestamento, esse modelo pode contribuir para a segurança alimentar, incrementar a geração de renda e ajudar o Brasil a cumprir a meta de recuperar 12 milhões de hectares de áreas degradadas até 2030, prevista no Acordo de Paris.

Em agosto, durante a Cúpula da Amazônia, o Governo Federal lançou o projeto Florestas Produtivas, que prevê a exploração simultânea do plantio de alimentos com a recuperação da Floresta Amazônica — um passo importante para o cumprimento da meta.

São números (e objetivos) de encher os olhos —e que fazem acreditar em um país diverso, muito menos desigual entre regiões no tocante à geração de emprego e renda, assim como a oferta de comida na mesa brasileira.

A partir do uso de modelos do Sistema Agroflorestal (SAF), que planta simultaneamente árvores nativas, frutíferas e/ou madeireiras ao lado de produtos agrícolas, uma área desmatada de 1,02 milhão de hectares pode, por exemplo, não apenas ser recuperada, mas também produzir 156 milhões de toneladas de alimentos, permitir o plantio de 2,03 bilhões de mudas e ainda remover 482,8 milhões de toneladas de CO2 da atmosfera A agrofloresta é também modelo de exploração da terra vantajoso para o agricultor familiar, pois permite, ao diversificar a produção, um retorno do investimento em curto prazo, colhendo e vendendo o que cresce rápido, enquanto se aguarda a renda em longo prazo, originária da produção de espécies permanentes.

A agrofloresta é também modelo de exploração da terra vantajoso para o agricultor familiar, pois permite, ao diversificar a produção, um retorno do investimento em curto prazo, colhendo e vendendo o que cresce rápido, enquanto se aguarda a renda em longo prazo, originária da produção de espécies permanentes

O recém-divulgado estudo do Instituto Escolhas, de São Paulo, se destaca por esses e outros indicadores da adoção do SAF na recuperação de terras Brasil afora, realçando os benefícios potenciais em honrar a meta de 12 milhões de hectares de florestas até 2030, assumida pelo nosso governo com o Acordo de Paris.

Outro destaque

O estudo demonstrou que o investimento de R$ 33,1 bilhões na recuperação, por meio de SAFs, de 1,02 milhão de hectares de terras desmatadas em Áreas de Preservação Permanente (APPs) e localizadas em pequenas propriedades – principalmente da agricultura familiar – pode render ganhos de R$ 260 bilhões de receita líquida. Ou seja, quase oito vezes o valor investido.

“Além da produção de alimentos — e que se relaciona com a segurança nutricional —, aqui também se fala do plantio de árvores fundamentais para a preservação dos recursos hídricos da região e a oferta de nutrientes ao solo”, salienta Sérgio Leitão, um dos fundadores do Instituto Escolhas. “Tudo isso permitindo que o Brasil demonstre um esforço real de atender a meta assumida em Paris.”

Para se ter uma ideia do que está aqui em jogo, a área de 12 milhões de hectares recuperados até 2030, conforme previsto no Acordo de Paris, corresponde praticamente à da Inglaterra. De lá para cá, porém, muito pouco acabou por acontecer: cerca de 79,1 mil hectares foram reflorestados, ou seja, menos de 1% do objetivo original. A inação, claro, teve um custo: estima-se que o Brasil hoje terá de investir 4 vezes mais para dar conta por completo do compromisso assumido. “Mas há muito o que ganhar com o cumprimento da meta e o impulso da economia da floresta em pé”, enfatiza Sérgio.

Crescimento na produção

Para cada uma das cinco regiões brasileiras, o Escolhas montou modelos de exploração a partir dos SAFs, levando em conta as características do bioma local e a aptidão produtiva na análise de 43 variedades de alimentos de lavoura e extrativismo.

Entre outros resultados, a produção atual de milho verde, pinhão, buriti, cumaru, jabuticaba, mangaba, erva-mate e palmito cresceria mais de 100%. A respeito de alimentos em que há dados oficiais para comparação direta, esse aumento seria de 27,4% para o cacau, 40,4% para o cupuaçu e 71,1% para o pequi, entre outros; e, no caso das lavouras de ciclo curto, após os três primeiros anos de cultivo, o crescimento produtivo seria de 11% para o feijão, 12,4% para a banana e 28,9% para a mandioca.

Grandes extensões de terra, e que também fazem parte da área de 12 milhões de hectares a ser recuperada, podem ser aproveitadas para o plantio de árvores para corte, aponta o estudo. Já o agricultor familiar precisa de apoio técnico para saber combinar espécies e florestas de modo a tirar o máximo proveito de sua pequena propriedade sem prejuízo ambiental.

“Apenas seremos capazes de cumprir o Acordo de Paris se dermos a mesma importância ao cultivo das florestas que damos a de outras culturas, como a do milho, da soja e do feijão, e às atividades do chamado setor agropecuário”, alerta Sérgio Leitão. “Desse modo, será possível atrair o capital necessário para dar conta do desafio assumido até 2030”.

É inegável que o plano de tornar o Brasil mais igualitário já começa a dar os primeiros passos, ao menos no que diz respeito à erradicação da pobreza na região Norte. No início de agosto passado, um dos grandes momentos da Cúpula da Amazônia, realizada em Belém (PA), foi o lançamento do projeto Florestas Produtivas por parte do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Economia Familiar (MDA).

Moisés Savian, à frente da Secretaria de Governança Fundiária, Desenvolvimento Territorial e Socioambiental, filiada ao MDA, dedica-se hoje à tarefa de levantar capital suficiente para dar impulso ao projeto. “Por enquanto, vamos usar o orçamento aprovado para este ano de cerca de R$ 2 milhões — o governo anterior não deixou um centavo em caixa! —, que vai permitir iniciar o trabalho com mil famílias no Pará”, diz ele. “O total a ser ali investido durante os anos de governo Lula está previsto em R$ 9,8 milhões.”

De que se trata o projeto?

A exploração simultânea do plantio de alimentos com a recuperação de florestas em comunidades tradicionais amazônicas. Sim, o programa das Florestas Produtivas aplica em 100% os modelos do Sistema Agroflorestal – e, na fase inicial, pretende cultivar espécies nativas, caso do açaí, cupuaçu, cacau e mandioca. “Um de nossos objetivos é dar assistência continuada às famílias selecionadas e, para tanto, a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) deverá indicar um técnico para solucionar as dúvidas dos agricultores”, adianta Moisés.

À medida que as negociações (com o BNDES e a Petrobras, entre outros) avancem, o Florestas Produtivas poderá ser adotado em todo o país – o Maranhão deverá ser o próximo beneficiado do projeto. Segundo o estudo do Instituto Escolhas, Pará e Maranhão são os estados com índices de pobreza mais elevados na região amazônica.

“Como a atividade do plantio de florestas é altamente intensiva em mão de obra, principalmente nos primeiros três anos de vida, quando os projetos estão se instalando, plantar florestas significa gerar empregos e acabar com a pobreza”, garante Sergio Leitão.

A título de exemplo, só no caso do Pará prevê-se a criação de cerca de 1 milhão de postos de trabalho. “O Florestas Produtivas é outro modo de cumprir a meta assumida em Paris”, diz Moisés. Sob uma condição, porém: “Será preciso um esforço conjunto entre governo e sociedade para recuperar floresta e meio ambiente ao mesmo tempo em que o cultivo de alimentos produza riqueza para quem mais precisa.”

Com informações do Notícias da Floresta / Uol