A professora Kátia Giovana lançou um livro com dicas para outras mulheres em situação de vulnerabilidade e faz palestras contando sua própria história

Kátia Giovana Costa Lima virou doméstica aos 12 anos e hoje dá dicas para outras mulheres que querem mudar de vida através da educação

Quando Kátia Giovana Costa Lima se mudou para a cidade de São Paulo, com 9 anos de idade, ela não tinha ideia das reviravoltas que viria a enfrentar. A menina deixou Sorocaba, interior paulista, acompanhada da mãe e dos seis irmãos. “Viemos com uma proposta de uma vida melhor”, relembra. A família, no entanto, enfrentou um despejo pouco tempo depois.

As circunstâncias levaram a menina a trabalhar como empregada doméstica aos 12 anos. Hoje, com 55, Kátia é professora concursada da rede pública de ensino e doutoranda em literatura brasileira. Além disso, Kátia, que havia parado de estudar ainda na 5ª série do Ensino Fundamental, agora se dedica a incentivar outras mulheres que queiram mudar de vida através da educação.

A história de Kátia é similar a de tantas outras mulheres brasileiras, que ainda crianças começaram a trabalhar como domésticas. Caçula, Kátia morava com a mãe e dois dos cinco irmãos em uma casa em São Paulo, quando foram despejados. “Aí minha mãe me deixou aos cuidados de uma família, onde eu fazia pequenos trabalhos. Eu comecei a trabalhar por isso, para morar no emprego”, conta.

“Seria uma coisa provisória. Eu fui morar num emprego, minha mãe num emprego também, minhas irmãs já estavam, e meus irmãos numa pensão”, relembra. Porém, a família só veio a se reunir em uma casa novamente anos depois, quando Kátia já era maior de idade. Durante esse intervalo, a menina enfrentou os mais diversos abusos para continuar tendo onde morar.

“O trabalho era o tempo todo. Tinha folga aos domingos, sábado, às vezes, depois do almoço. Isso varia de casa para casa. Algumas eu tenho memória afetiva, outras eu deletei mesmo”, diz. Entre os piores momentos, Kátia relembra quando saiu xingada de uma casa onde trabalhava, aos 15 anos de idade, depois de ter sido assediada pelo patrão. “A mulher estava grávida, foi para a maternidade e o marido começou a passar a mão em mim”, conta.

Apesar das histórias, ao abrir a carteira de trabalho de Kátia, você não vai encontrar nenhum registro como empregada doméstica. Era tudo na informalidade. “Meu único registro foi de quando trabalhei como frentista de posto de gasolina”, diz.

Volta aos estudos

Por volta dos 26 anos, trabalhando como secretária em uma clínica, Kátia decidiu que era hora de voltar a estudar. “Eu comprei as apostilas e tentei estudas as matérias sozinha. Mas não consegui. Aí eu me matriculei no EJA (Educação de Jovens e Adultos).” Assim, conseguiu o certificado de conclusão do Ensino Médio, mas Kátia queria mais.

Ela se matriculou em um cursinho oferecido por alunos da Universidade de São Paulo (USP) e passou a estudar para o vestibular. Foram 7 anos até vir a aprovação. “O que me dava ânimo é que o cursinho foi uma fase maravilhosa da minha vida”, diz Kátia, que relembra ter feito muitos amigos nessa época.

A graduação em Letras foi concluída em dezembro de 2009 na USP, quando ela tinha 43 anos. Nesse período, fez um estágio em escola e foi contratada como professora pelo estado. Mas, ainda assim, ela não parou de se especializar. Em 2014, Kátia concluiu o mestrado e, em 2021, ingressou no doutorado. “Não parei de estudar e cada processo foram três, quatro tentativas”, afirma.

Ajudar outras mulheres

Com a sua experiência, Kátia percebeu que poderia ajudar outras mulheres em situações parecidas. Na igreja que frequenta, a professora começou um trabalho voluntário. “Percebi que elas precisavam de auxílio para fazer um currículo, para voltar ao mercado de trabalho”, conta. “Eu gostei de ensinar essas mulheres e entendi que poderia fazer mais, fora da igreja”, afirma. Assim, nasceu o Instituto Perólas Empreendedoras.

“Me reuni com 7 amigos, e fomos atrás de implementar mesmo a ONG, com CNPJ, estatuto…”, explica Kátia. O projeto oferece cursos gratuitos de empreedorismo para pessoas em vulnerabilidade. Até o momento, tudo ocorre de forma online e, quando alguma associação ou escola cede o espaço, há workshops e palestras presenciais. Kátia conta que estão buscando patrocinadores para, em breve, ter um espaço físico para o projeto.

A professora também lançou, em 2017, o livro ‘Manual da Vitória da Doméstica’. Como o próprio título induz, ele é uma espécie de manual com dicas do que ela fez em sua trajetória. “A ideia do livro era levar minha história de superação para ensinar as pessoas. Ensinar os vestibulandos também. Tem um capítulo que chama ‘Os 10 mandamentos do vestibulando’, com o passo a passo, como uma mentoria mesmo”, afirma.

Com informações do Terra