O angelim-vermelho (Dinizia excelsa Ducke), árvore que pode atingir quase 90 metros de altura, deve ser protegido por seu valor simbólico e ecológico, segundo especialistas e órgãos ambientais.
Encontrada em vários estados brasileiros, a espécie está sendo ameaçada pela invasão do garimpo ilegal e pelo desmatamento que está atingindo até mesmo as áreas protegidas. As autoridades do Pará e do Amapá estão se esforçando para proibir seu corte.
Os especialistas destacam que, além da legislação, os estados também precisam combater as atividades ilegais e proteger as árvores através de melhorias nas inspeções locais.
“O que torna essas árvores tão especiais ainda é um grande mistério, e é preciso tempo e estudos para desvendá-lo” diz Eric Gorgens. O professor de análise espacial e ambiental da UFVJM (Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri) está falando sobre o angelim-vermelho (Dinizia excelsa Ducke), árvore amazônica com altura de até 60 metros encontrada em várias áreas de floresta tropical do Brasil e da Guiana. Mas foi na Bacia do Rio Jari, entre Pará e Amapá, que angelins de até quase 90 metros de altura foram descobertos há alguns anos, em uma expedição da qual Gorgens fez parte. Até então, os cientistas não imaginavam que árvores tão altas existissem na Amazônia.
“O clima tropical traz muitas dificuldades para a sobrevivência das árvores devido ao ambiente agressivo, à alta umidade, aos ventos fortes e à favorabilidade a pragas e doenças” acrescenta Gorgens. “Apesar desse cenário, a mais alta tem entre 400 e 600 anos de idade, 88,5 metros de altura e é capaz de sequestrar carbono equivalente a uma floresta de 1 hectare com um dossel médio de 45 metros.”
Com a COP30 das Nações Unidas a ser realizada em 2025 em Belém, os esforços para proteger legalmente as árvores gigantes ganharam impulso. No Pará, o Ideflor-Bio (Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade) pretende reduzir a área da Flota Paru (Floresta Estadual do Paru) (Floresta Estadual do Paru) e criar um parque estadual totalmente protegido, em uma área de cerca de 562 mil hectares, para ajudar a preservar os angelins-vermelhos. A unidade de conservação abriga o mais alto angelim-vermelho conhecido e é a terceira maior reserva de floresta tropical de uso sustentável do mundo, com 3,6 milhões de hectares.
Angelins-vermelhos de diferentes tamanhos povoam a Floresta Estadual do Paru, no Pará. A área, no entanto, está ameaçada pela mineração e pelo desmatamento.
Atualmente, a Floresta Estadual do Paru tem status de unidade de conservação de uso sustentável, que permite atividades de manejo florestal, como a extração de madeira e de produtos não madeireiros e o ecoturismo. “Nossa intenção é garantir a segurança da maior árvore da Amazônia e da América Latina”, diz Crisomar Lobato, diretor de gestão da biodiversidade do Ideflor-Bio. O órgão tem realizado expedições ao noroeste da Flota Paru, onde se encontra a maior dessas árvores. A mais recente ocorreu entre 16 e 29 de maio, quando os cientistas coletaram informações sobre a flora, a fauna, o solo e a topografia locais.
“Precisamos do máximo de dados possível para tentar mudar o status de proteção do angelim-vermelho”, diz Lobato. “Estamos contando com a COP30 para nos ajudar com [a proteção dos] angelins-vermelhos.”
De acordo com Lobato, o Ideflor-Bio encaminhará a proposta de criar um parque estadual ao governo do Pará ainda este ano. Se implementada, a nova UC será de proteção integral.
Pouca ajuda local
Os especialistas, no entanto, ressaltam que a criação de novas áreas de proteção integral, permitindo apenas atividades de pesquisa científica e educação ambiental, também precisa de supervisão de campo.
“Mudar a categoria de proteção de uma área não é suficiente”, diz Jakeline Pereira, pesquisadora do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) e assessora da Flota do Paru. “É uma iniciativa boa e necessária, mas não deveria ser a única. Desde a criação da floresta, em 2006, o governo do Pará nunca fez uma inspeção de campo no local.”
A escassez de recursos alocados para as operações de campo e a falta de integração entre os órgãos governamentais resultaram, nos últimos anos, em um aumento da mineração ilegal na floresta e em outras áreas protegidas onde se encontram os angelins-vermelhos.
“Há uma grande diferença entre fazer um sobrevoo e percorrer o território [a pé]” , diz Pereira. “Muitos garimpos ilegais de ouro na Flota Paru trabalham com mineração aluvial, que não abre clareiras [na floresta] e é difícil de detectar sobrevoando.”
Em uma das expedições, Pereira e outros pesquisadores detectaram várias minas ilegais ao longo da rota. “A exploração de ouro existe há muitas décadas na região e não é uma linha imaginária com os limites do [futuro] parque que impedirá a chegada da mineração”, ela argumenta. “A Reserva Biológica de Maicuru, que tem angelins gigantes e fica próxima à Flota do Paru, é um exemplo. É uma unidade de proteção integral, mas a mineração ilegal nunca foi removida de lá. Isso pode ser comprovado por imagens de satélite e dados do MapBiomas.”
Em 2009, mais de 600 garimpeiros estavam ativos na Flota Paru, de acordo com dados da S (emasSecretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade). Atualmente, são mais de 2.000.
Em outubro de 2023, em uma ação controversa, o presidente do Ideflor-Bio, Nilson Pinto, autorizou a Mineração Carará Ltda a explorar ouro na UC, apenas três meses após a empresa ter apresentado o pedido. O proprietário da Mineração Carará, Eduardo Ribeiro Carvalho Pini, foi acusado pelo Ministério Público Federal de ter atividades de mineração ilegal na própria floresta. O pedido, que ainda carece de licenciamento ambiental, está na Semas para análise. Pinto não respondeu ao pedido de entrevista da Mongabay.
“O conselho consultivo [da floresta] pede inspeções de campo, mas eles dizem que as operações contra a mineração ilegal exigem coordenação com outros órgãos governamentais, como o Ibama e a polícia federal,” disse Pereira. “Há três funcionários do Ideflor para supervisionar as florestas de Trombetas, Paru e Faro, uma área de 7,1 milhões de hectares. A Semas, por outro lado, tem que fiscalizar todo o estado, e o sul da Floresta do Paru sofre com o desmatamento devido à mineração. Se a UC não está muito desmatada [96% de sua cobertura vegetal permanece], isso se deve à dificuldade de acesso à região, e não à ação do governo.”
Lobato, do Ideflor-Bio, concorda que o que as UCs mais precisam é de mais agentes de campo. “Fazemos o que podemos com sobrevoos e monitoramento por satélite. A agência tem uma estrutura pequena, com 162 funcionários administrativos.”
Uma pesquisa do Ideflor de 2015 — quando o Pará tinha 21 unidades de conservação — mostrou a necessidade de 300 agentes de fiscalização em campo. Desde então, o número de UCs estaduais subiu para 28. “O governo está reestruturando a inspeção do Paru para expandi-la em 2025”, diz o diretor.
Do outro lado do Rio Jari, no Amapá, os angelins-vermelhos não estão melhor protegidos. Dos seis exemplares encontrados no estado, um está na Floresta Estadual do Amapá, uma UC semelhante ao Paru. Outros quatro estão localizados na região do Rio Cupixi e o último em um assentamento agroextrativista, no município de Mazagão. A Flota do Amapá é administrada pelo Núcleo de Gestão Integrada (NGI) ICMBio Amapá Central, unidade que também supervisiona o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, que abriga dezenas de angelins-vermelhos.
Quatro dos doze funcionários do NGI Amapá Central precisam gerenciar cerca de 3,7 milhões de hectares de terra. “Mas é uma realidade melhor do que há dois anos, quando havia apenas duas pessoas no NGI”, disse Cristoph Jaster, analista ambiental da unidade. “As operações de campo não são frequentes; seria ótimo se fossem uma vez por mês. Precisamos de apoio policial para segurança, e do Ibama para multas ambientais, pilotos e barcos.”
Jaster, ex-chefe do parque do Tumucumaque, disse que os primeiros alertas de desmatamento no local começaram em 2022, com 20 hectares. “Hoje são quase 80 hectares, e muito mais nos arredores imediatos, como na Bacia do Cassiporé, com mais de 1.500 hectares. Minas a céu aberto estão sendo escavadas na cabeceira do Rio Tajauí, dentro do parque, e as águas contaminadas fluem até o Rio Araguari. Houve relatos de ribeirinhos da região da Floresta do Amapá de que as águas do Araguari, que ficam a 300 quilômetros das novas frentes de mineração, estavam todas lamacentas [devido à mineração].”
Com a descoberta de seis angelins-vermelhos — e uma castanheira de 66 metros de altura — no Amapá, em outubro de 2022, a Prodemac (Promotoria de Justiça do Meio Ambiente, Conflitos Agrários, Habitação e Urbanismo) do MPAP (Ministério Público do estado) entregou uma minuta ao então governador Waldez Góes, propondo que as árvores se tornassem monumentos naturais — status reservado a elementos únicos da natureza — e, seus arredores, áreas de preservação permanente.
“O governador foi muito receptivo, o que nos trouxe muito entusiasmo. No entanto, houve uma mudança de governo em 2023, e ele saiu sem implementar o projeto”, diz Marcelo Moreira, promotor do Prodemac. “A ideia era que ele se tornasse um decreto, que entraria em vigor imediatamente com a assinatura do governador”, acrescenta João de Matos Filho, assistente técnico do órgão ambiental estadual. Góes é atualmente Ministro da Integração Nacional no governo Lula.
O promotor Moreira está atualmente em discussões com o governador Clécio Luís e o procurador-geral do estado sobre a mudança de status das árvores gigantes.
Enquanto isso, as operações de campo continuam raras, e a tecnologia por si só não protege as florestas. “Com as imagens de satélite, o grupo de apoio do MPAP pode ver quando uma área foi desmatada, mas visualizar uma única árvore é um desafio. Certa vez, no inverno, as nuvens cobriram o céu e, quando se dissiparam, a área de desmatamento por mineração havia dobrado”, disse Moreira. “Com o movimento pré-COP30, esperamos que nossas solicitações sejam ouvidas.”
Com informações do Notícias da Floresta / Ecoa / Uol
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