Os recursos esquecidos por pessoas físicas e jurídicas em contas bancárias agora irão para o governo se não reclamados em até 30 dias, segundo o projeto de lei de reoneração gradual da folha de pagamentos de 17 setores da economia, aprovado na Câmara dos Deputados na quarta-feira (11) — ainda falta ser sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A estimativa é de que existam cerca de R$ 8,5 bilhões esquecidos.
A Câmara aprovou na quarta (11) à noite o projeto de lei da transição para o fim da desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia e municípios de pequeno e médio portes. Pelo texto, a reoneração da folha para esses setores será gradual e terá duração de três anos (de 2025 a 2027).
O dinheiro esquecido pelos brasileiros em contas bancárias vai ajudar a reforçar o caixa do governo. Para manter a desoneração até 2027, o Congresso precisou encontrar maneiras de pagar a conta.
Os cidadãos terão 30 dias após a publicação da lei para retirar o dinheiro esquecido. Passado esse prazo, os valores poderão ser incorporados pelo Tesouro Nacional.
O titular da conta terá 30 dias para contestar o recolhimento do valor pelo governo. Após a apropriação pelo governo, o Ministério da Fazenda terá que publicar no Diário Oficial um edital relacionando os valores recolhidos, o banco, a agência e o número da conta onde eles estão depositados. O prazo para contestar a apropriação é de 30 dias a partir da publicação no Diário Oficial.
Caso a contestação seja indeferida, ainda cabe recurso. O recurso deve ser apresentado ao CMN (Conselho Monetário Nacional) no prazo de dez dias.
O cidadão terá seis meses para entrar na Justiça e contestar a apropriação do valor. O prazo para entrar na Justiça conta a partir da publicação no Diário Oficial. Se houver decisão indeferindo a restituição, o prazo conta a partir da comunicação da decisão ao interessado.
Em outro trecho, o texto diz que o titular da conta poderá reclamar os recursos junto ao banco até o dia 31 de dezembro de 2027.
O texto também determina o repasse ao governo de valores abandonados em contas judiciais. Outras medidas previstas são a transferência de depósitos judiciais retidos indevidamente pela Caixa Econômica Federal, a atualização do valor de bens imóveis junto à Receita Federal e medidas de combate à fraude e a abusos no gasto público.
O texto aprovado abriu uma exceção para permitir que o valor dos depósitos esquecidos possa ser usado no cumprimento da meta fiscal de déficit zero neste ano. O Banco Central havia defendido a rejeição do trecho sobre os valores esquecidos em contas bancárias. Em nota técnica, o BC argumentou que esses valores não podem ser registrados como receita primária, pois isso está em desacordo com a metodologia da instituição.
A apropriação dos recursos esquecidos foi defendida pelos deputados governistas e atacada pela oposição. O trecho foi incluído no projeto pelo senador Jaques Wagner (PT-BA).
“Se a pessoa não reclama o valor esquecido em até dois anos, ele entra para o patrimônio público. Isso é confisco, que é proibido pela Constituição Federal, isso é gravíssimo. Se o beneficiário tiver dificuldade em acessar o sistema, uma pessoa, idosa, doente, fora do país, cujo advogado abandonou a causa, essa pessoa vai sofrer um dano irreparável.” afirmou Deputada Bia Kicis (PL-DF)
“É um confisco do patrimônio do cidadão que, por algum motivo, ainda não foi reclamar aquele dinheiro que está no banco.” disse a Deputada Rosangela Moro (União-SP)
“Obviamente, o governo vive no déficit, precisa zerar a meta fiscal e colocar dinheiro ali como se fosse receita primária. A gente sabe que não é receita primária. É muito triste o que está acontecendo, estão metendo a mão no nosso dinheiro.” afirmou a Deputada Adriana Ventura (Novo-SP)
“Se durante muitos anos a pessoa não movimentou, o dinheiro fica no banco, e o banco está ganhando. Nesse caso, qual foi a discussão feita aqui: teria então uma desoneração a menos, ou um outro tributo. Mas, se esse dinheiro que está parado no banco vem ao Tesouro, não precisa onerar outros setores.” disse o Deputado Bohn Gass (PT-RS)
“Foi uma solicitação do BC, o Roberto Campos Neto que é tão elogiado por vocês, foi considerado o melhor presidente do BC do mundo, essa foi uma negociação do ministro Fernando Haddad com ele. A redação final é a consolidação do debate que tivemos. Redação final é redação final, não tem que ficar questionando.” afirmou o Deputado José Guimarães (PT-CE)
Como saber se você tem dinheiro esquecido
O Banco Central tem um sistema de consulta de valores esquecidos.O Sistema de Valores a Receber permite que pessoas físicas e jurídicas vejam se têm recursos esquecidos em bancos, consórcios ou outras instituições do sistema financeiro. Também é possível consultar recursos de pessoas falecidas.
A consulta é feita pela internet. Para consultar, é preciso acessar o site oficial do sistema, informar seu CPF e data de nascimento e clicar em “consultar”. Para solicitar o resgate do valor a receber, é preciso entrar no sistema com a sua conta gov.br.
Entenda a desoneração
O projeto que trata do fim da desoneração foi aprovado no Senado em 20 de agosto. A proposta mantém a desoneração da folha de pagamento para 17 setores integralmente em 2024 e prevê a reoneração gradual entre 2025 e 2027. O texto foi apresentado pelo líder do governo no Senado, Jacques Wagner (PT-BA).
A retomada gradual da tributação começará com alíquota de 5% em 2025. Em 2026, serão cobrados 10% sobre a folha de pagamentos e, em 2027, 20%, quando ocorreria o fim da desoneração. Durante a transição, o 13º salário continua integralmente desonerado.
Para municípios com até 156 mil habitantes, a retomada da contribuição previdenciária também será escalonada. Até o fim deste ano, será de 8% e no ano que vem, o percentual será de 12%. Em 2026, será de 16%, chegando aos 20% em 2027, no fim do período de transição.
Histórico
No ano passado, o Congresso Nacional havia aprovado a manutenção da desoneração da folha. Mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou trechos da Lei 14.784, de 2023. O Congresso derrubou o veto e o governo recorreu ao Supremo Tribunal Federal, que deu prazo até 11 de setembro para que o Congresso e o Executivo buscassem um acordo sobre a desoneração.
A desoneração da folha de pagamentos foi instituída em 2011 para os setores com maior uso de mão de obra. Em vez de pagar a contribuição previdenciária patronal de 20% sobre a folha de salários, as empresas desses setores pagam alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Na prática, isso leva a uma arrecadação menor para a Previdência.
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