Um estudo publicado na revista científica The Lancet Respiratory Medicine na sexta-feira (15) mostrou que 80% dos pacientes que precisaram de ventilação mecânica, ou seja, foram intubados por causa da covid-19 morreram no Brasil. Isso significa que dentre as 45.205 pessoas intubadas, 36.046 perderam a vida. Além disso, 59% dos que foram internados em UTIs vieram a óbito.
A pesquisa traz uma análise retrospectiva de todos os 254.288 pacientes a partir dos 20 anos de idade que foram hospitalizados no país com diagnóstico confirmado de covid-19 por meio do exame RT-PCR entre 16 de fevereiro e 15 de agosto de 2020. Isso foi possível graças ao registro no sistema de vigilância nacional SIVEP-Gripe. A iniciativa é fruto de uma parceria entre diversas instituições, entre elas a USP (Universidade de São Paulo) e Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).
“O objetivo foi analisar as características dos pacientes internados com covid-19 no Brasil e examinar o impacto da doença nos recursos de saúde e mortalidade intra-hospitalar”, explica o artigo.
Fernando Bozza, pesquisador da Fiocruz e coordenador do estudo, afirma que a principal conclusão é a de que a covid-19 é uma doença grave e de alta mortalidade. “Quem necessita de hospitalização, especialmente em terapia intensiva, tem grande risco de morte”.
“O que chama a atenção é que, diferentemente dos outros países, no Brasil uma população jovem também foi afetada pela mortalidade da covid. Um percentual significativo de pessoas hospitalizadas e mortas tinha menos de 60 anos e até menos de 50”, analisa.
A mortalidade hospitalar geral foi de 38% em todo o Brasil, o que corresponde a 87.515 vidas perdidas. Na região Norte, metade dos hospitalizados morreram (6.727) e no Nordeste a taxa foi de 48% (21.858). A região Sul foi a menos afetada, com 31% de óbitos entre os hospitalizados (7697).
Ao adotar o recorte de idade, a desigualdade regional fica ainda mais evidente. A mortalidade hospitalar em pacientes com menos de 60 anos no Nordeste (31%) é mais que o dobro que a do Sul (15%).
O pesquisador destaca que as diferentes capacidades do sistema de saúde observadas entre as cinco regiões do país impactam na discrepância entre as taxas de mortalidade. “Dados da mortalidade de pessoas abaixo de 39 anos e ventilados no Norte são valores extremamente altos e mais que o dobro do que se vê no Sul e Sudeste”, observa.
“Essas regiões e, em particular, a região Norte, têm menos recursos desde antes da pandemia, não só do ponto de vista de leitos, mas de recursos humanos. São as mais frágeis e a gente já sabia. Esse estudo mostra como a pandemia acentuou essas iniquidades. Não é uma surpresa o que está acontecendo em Manaus”, acrescenta.
Em relação ao futuro da pandemia no Brasil, ele ainda prevê “alguns meses” com transmissão alta do coronavírus e pressão elevada sobre o sistema de saúde, mesmo com duas vacinas aprovadas para uso emergencial.
“A quantidade de vacinas é limitada e restritas a grupos específicos. Lá para o final do semestre vamos ter um efeito mais amplo da vacinação na população. Mas, antes disso, é possível que outras cidades vejam um colapso [na saúde], como aconteceu em Manaus”, pondera. “Então, as pessoas precisam manter os cuidados para evitar o contágio, como distanciamento social, uso de máscara, lavagem das mãos”, aconselha. (R7)