Coreia do Norte - Foto: Arquivo pessoal / Adriana Marto

Um grupo de turistas da Rússia está prestes a primeira leva de turistas a ter permissão para entrar na Coreia do Norte desde que os bloqueios de fronteira antipandêmicos começaram no início de 2020, de acordo com uma publicação das autoridades provinciais russas e de um guia turístico ocidental.

A Coreia do Norte impôs alguns dos controles de fronteira mais rigorosos do mundo durante a disseminação da covid-19 e ainda não reabriu totalmente para os estrangeiros.

A viagem, anunciada por uma agência sediada em Vladivostok, foi organizada quando o governador da região de Primorsky Krai, no extremo leste da Rússia, que faz fronteira com a Coreia do Norte, visitou Pyongyang para conversações em dezembro, informou o governo regional em uma postagem no Telegram esta semana.

A excursão de quatro dias partirá em 9 de fevereiro e incluirá paradas em Pyongyang e em uma estação de esqui, de acordo com um itinerário online.

Simon Cockerell, gerente geral da Koryo Tours, sediada em Pequim, que não está envolvida na viagem, disse à Reuters que seus parceiros na Coreia do Norte confirmaram que a visita russa está acontecendo em circunstâncias especiais.

“É um bom sinal, mas eu hesitaria em dizer que isso necessariamente levará a uma abertura mais ampla devido às circunstâncias especiais dessa única viagem”, disse ele. “Mas, considerando que não há turistas há mais de quatro anos, qualquer viagem de turismo pode ser vista como um passo positivo.”

No ano anterior ao início da pandemia, a Coreia do Norte viu um aumento de turistas chineses que podem ter proporcionado ao país que sofre com falta de recursos financeiros até 175 milhões de dólares em receita extra em 2019, de acordo com uma estimativa da NK News, com sede em Seul.

Brasileiros contam como é visitar o país

“Para entrar no país, precisei contratar, de antemão, os serviços de uma agência turística autorizada pelo governo norte-coreano”, conta ele. “São empresas que oferecem roteiros fechados, que vão levar o turista apenas a atrações predeterminadas”, diz o brasileiro Mike Weiss.

Enquanto esteve nas ruas do território norte-coreano, Mike foi acompanhado durante todo o tempo por uma guia turística. E ela o conduziu, principalmente, a lugares que promoviam a suposta grandeza da Coreia do Norte. Ir, por exemplo, até a periferia da capital, Pyongyang, nem pensar.

Durante o voo entre Pequim e Pyongyang , o brasileiro recebeu um exemplar, em inglês, do jornal “The Pyongyang Times”, controlado pelo regime norte-coreano e que costuma trazer manchetes como “King Jong-un visita fazenda de legumes”.

Mais impactantes, porém, foram as recomendações dadas a Mike pela agência turística que ele contratou. Uma delas dizia: “não tente entrar na Coreia do Norte com bíblias ou qualquer outro tipo de material religioso”.

E, assim que pisou no país, o brasileiro percebeu que deveria tomar muito cuidado com os símbolos sagrados locais. “Vi um estrangeiro carregando um jornal dobrado sob o braço, e na capa havia uma foto do Kim Jong-un. Um guia turístico chamou a atenção dele, dizendo que a imagem do líder norte-coreano jamais poderia ser dobrada daquele jeito, que era um sinal de desrespeito”.

Visão panorâmica de Pyongyang, com a torre Juche ao fundo – Foto: Getty Images / iStockphoto

O advogado Lucas Caiado, a arquiteta Adriana Marto e o viajante profissional Lucas Estevam, do canal Estevam Pelo Mundo, foram à Coreia do Norte em 2019, e Tiago Maranhão, viajou ao país para fazer uma reportagem esportiva em 2013.

O pagamento era feito ora ao fim do jantar, ora no hotel. Sempre para os guias, em euros, dólar ou yuans (o dinheiro chinês).

Estrangeiros não podem usar a moeda local. Consegui trocar com um funcionário uma quantia mínima só para trazer como souvenir”, fala Tiago.

Lucas precisou fazer a conversão no dia em que visitou o supermercado (onde achou Pringles, Nutella e Coca-Cola nas prateleiras) e guardou alguns trocados que valeram uma experiência fora do roteiro. “Fiquei na Coreia mais tempo que outros visitantes do meu grupo. Nos últimos dias, estava sozinho com os guias e tive a oportunidade de comprar um sorvete de massa”.

O culto aos governantes foi observado por todos os entrevistados, assim como a pequena quantidade de pessoas que ocupavam as mesas dos endereços.

“Era bizarro. Ia para os restaurantes com a guia e muitas vezes tinha eu e mais duas mesas. Ou eu sozinho. Num restaurante gigantesco. Quando fui embora de um deles, a luz logo se apagou. Era como se estivesse funcionando só para atender os turistas”, diz Estevam.

Carne de cachorro

Uma das experiências gastronômicas que permite alteração sem resistências no roteiro é a sopa de cachorro. Para prová-la, os turistas precisam demonstrar a vontade aos guias e pagar um valor extra.

Lucas experimentou e diz que se trata de uma sopa vermelha muito temperada e levemente adocicada com pedaços da carne, que é fibrosa e rígida. “Comi muito bem na viagem e essa foi a refeição mais chique que fiz, mas não sei se toparia de novo. Não achei particularmente gostoso”.

Tiago também pediu para ir. “Considerei uma experiência cultural. Chegando no restaurante, porém, me lembrei da minha última cachorra e não tive coragem. Os cinegrafistas que estavam comigo provaram. Acharam a carne um pouco dura e sem sabor marcante”, fala Tiago.

Seguido até o banheiro

Atitudes de desrespeito podem trazer graves consequências para estrangeiros em solo norte-coreano. Em 2016, um jovem turista norte-americano foi detido após supostamente roubar um pôster de propaganda do governo da Coreia do Norte em um hotel de Pyongyang. Ele ficou preso por 17 meses, entrou em coma por prováveis maus-tratos, foi libertado em estado vegetativo e morreu logo depois de voltar aos Estados Unidos.

*Com informações de Uol