É esperado que cerca de 50 mil pessoas, de diversos lugares do mundo, passem por Belém, no Pará, entre os dias 10 e 21 de novembro para participar da 30ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30). É a primeira vez que o Brasil sediará o evento, e o governo federal afirma que haverá acomodações disponíveis para quem quiser vir. Mas, em alguns casos, esses leitos podem custar caro. Em plataformas de hospedagem, conforme apurado pelo Terra, os valores para a reserva dos 11 dias de conferência chegam a R$ 2 milhões.
Em uma busca simples no Booking.com, por exemplo, foram encontrados 815 alojamentos para as datas da COP. As três opções mais caras se tratam de imóveis de luxo, onde as 11 noites de novembro estão custando R$ 2,2 milhões, R$ 2,1 mi e R$ 1,7 mi, respectivamente.
No mais caro, segundo o anúncio, serão disponibilizados ‘pequenos-almoços’ diários para quem fechar a estadia. A casa aceita até 16 hóspedes, mas conta apenas com dois quartos – um com uma cama de casal grande, e outro com uma cama de casal e uma de solteiro.
Dos 815 alojamentos disponíveis na plataforma para a COP30, apenas 51 cobram menos de R$ 5 mil para o período do evento. Outra característica é que grande parte dos anúncios listados são identificados como novidades na plataforma.
Ao considerar o filtro de ‘melhor pontuação e preço mais baixo’, pesquisando por estadias em Belém entre os dias 10 e 21 de março, também onze dias, mas longes da data da COP, as 10 principais acomodações listadas custam entre R$ 560 e R$ 1500 para todo o período. Fazendo a mesma busca, mas preenchendo com as datas em novembro, o primeiro resultado destacado cobra R$ 25 mil pelas onze noites — o preço das 10 principais acomodações listadas nesse filtro variam entre R$ 1 mil e mais de R$ 580 mil.
Pará e Booking
Em setembro passado, o governo do Pará e a plataforma Booking.com assinaram um Memorando de Entendimentos (MOU) para estabelecer um acordo de cooperação para o desenvolvimento do turismo no Estado, com o intuito de assegurar mais ofertas de leitos para a COP30.
Neste mês de fevereiro, a plataforma chegou a promover um workshop na Associação Comercial do Pará (ACP) com o objetivo de orientar proprietários de imóveis sobre o cadastro de hospedagens para a COP.
Na ocasião, que aconteceu no último dia 18, a presidente da ACP, Elizabete Grunvald, conforme registrado pela Agência Pará, do governo do Pará, chegou a comentar sobre ‘preços extorsivos’.

“É importante entender o processo, preço, direitos e obrigações. Se praticarmos preços extorsivos, não é bom pra ninguém, não é bom pra cidade, não é bom pra COP nem para o legado do evento. A precificação precisa ser razoável em qualquer que seja a plataforma. O objetivo aqui é de orientação”, disse.
Em busca de mais detalhes sobre os caminhos que estão sendo traçados em torno da disponibilização de hospedagens para a COP, o Terra tentou contato com o governo do Pará e com a Secretaria Extraordinária para a COP30 do governo federal, liderada pelo secretário extraordinário Valter Correia da Silva, por uma semana, e não obteve retorno. A Prefeitura de Belém também foi acionada, mas afirmou não ser responsável por esse tipo de informação.
Prometem lugar para todos
Belém iniciou o ano com 18 mil leitos disponíveis na capital. Em entrevistas e publicações, o governo do Pará afirma que todas as obras necessárias para receber a COP30 serão concluídas até setembro, assim como todas as soluções de hospedagem ficarão prontas antes da conferência.
Conforme divulgado pelo governo federal, está sendo criada uma plataforma oficial da COP30 que irá gerenciar as acomodações dos dias de evento, em novembro. Ainda há poucas informações sobre a iniciativa, mas a expectativa é que ela seja disponibilizada até o fim de março para que os credenciados para a Conferência façam suas reservas.
O governo federal está investindo R$ 4,5 bilhões em mais de 30 obras em execução por parte do Estado para receber a COP. Para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), conforme dito em seu primeiro pronunciamento deste ano, no fim de janeiro, essa será “a melhor COP já feita desde que foi estabelecida”.
Agora em fevereiro, em meio à repercussão sobre a capacidade de hospedagem de Belém, Lula comentou que: “Se não tiver hotel cinco estrelas, durma em um de quatro. Se não tiver de quatro, durma em um de três. Se não tiver de três, durma na estrela do céu do mundo, olhando para o céu, que vai ser maravilhoso”.
Ele também afirmou que, por mais que pretenda fazer “a COP que ninguém nunca mais vai esquecer”, não vai “enfeitar” a sede do evento. “Eu não vou enfeitar, eu não vou tirar pobre da rua, eu não vou fazer o que não é possível fazer. Eu quero que eles vejam a nossa Belém do jeito que ela é”.
“A COP é um evento da ONU. E a ONU escolheu o Brasil, que escolheu o Pará, que escolheu Belém. ‘Ah, mas em Belém não tem hotel.’ É bom que não tenha. É bom que eles tomam picada de carapanã”, disse o petista, durante agenda na capital paraense de entrega de unidades do programa Minha Casa, Minha Vida.
Sem denúncias
Não há denúncias ou reclamações sobre preços abusivos nas hospedagens para o período da COP30 recebidas pelo Procon até o momento, informou ao Terra a gerente de análise e reclamações do Procon do Pará, Diana Mainieri.

“Não há ainda nenhuma prática de preço abusivo praticado pelas hotelarias. O Procon/PA só pode fiscalizar cobranças abusivas que tenham relação de consumo, como no caso de hotéis e outros”, explicou. Com isso, plataformas como Booking podem ser consideradas. Já a do Airbnb não – por, segundo ela, não ter relação de consumo e, sim, ser regida pela lei do inquilinato, já que pessoas colocam suas casas à disposição.
Em caso de prática abusiva de cobrança “manifestamente excessiva e sem justa causa” é aberto um processo administrativo para apurar a situação, passivo de penalidades como multas. “Os parâmetros são analisados de acordo com o caso concreto. Mas para ser considerado abusivo é preciso elevar o valor sem justa causa. Por exemplo: se uma diária custa a quantia em média de R$200, e ela aumenta para R$ 1.000 sem motivação é uma prática abusiva”, explica Diana.
“No caso de denúncia não há como o consumidor ser indenizado, mas sendo reclamação e constatado a prática errônea do fornecedor, ele pode ser ressarcido pelos prejuízos.”
”A COP30 pode ser um fator de aumento, pela lei da oferta e procura, mas não aumento abusivo e indiscriminado” – Diana Mainieri, gerente de análise e reclamações Procon/PA
De acordo com notas divulgadas pelo governo do Pará, a Diretoria de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon), vinculada à Secretaria de Estado de Justiça (Seju), estão realizandas ações educativas e preventivas para que hotéis da capital cobrem preços justos em hospedagens e acomodações temporárias no geral.
Além disso, segundo a Secretaria de Justiça do Pará, “os preços praticados para hospedagem também serão observados pelo governo federal, que já sinalizou que, assim como ocorreu com os Jogos Olímpicos, acompanhará a variação de preços para mitigar práticas abusivas contra o consumidor”.
Quando o direito do consumidor é ferido?
Ao Terra, Renata Abalém, advogada, diretora jurídica do Instituto de Defesa do Consumidor e do Contribuinte (IDC) e membro da Comissão de Direito do Consumidor da OAB/SP, pontua ser comum que em eventos de grande porte, como é o caso da COP30, haja um aumento na demanda por hospedagem, levando a reajustes nos preços.
Porém, esse aumento deve ser justificado e proporcional aos custos adicionais que o fornecedor do local possa ter, como: contratação extra de funcionários, melhoria na infraestrutura e custos operacionais elevados devido ao evento.
