Foto: Maria José Tupinambá / Embrapa

A Embrapa Amazônia Ocidental desenvolve uma pesquisa que pode transformar o futuro do pau-rosa (Aniba rosaeodora) na região amazônica. O projeto trabalha para superar os principais entraves que impedem o cultivo comercial desta árvore nativa, historicamente explorada de forma predatória.

A espécie concentra alto valor econômico em seu óleo essencial, rico em linalol — composto que as indústrias de cosméticos e perfumaria fina utilizam amplamente. No entanto, a produção despencou nas últimas décadas: de 500 toneladas anuais nos anos 1970 para apenas 1.480 quilos em 2021.

Clonagem por mini estacas promete produção em larga escala

Os pesquisadores focam em três frentes principais: seleção de matrizes de alta qualidade, desenvolvimento de protocolos de clonagem por estaquia e definição de práticas agronômicas que reduzam perdas no plantio. A equipe também estabelece uma coleção de trabalho com materiais genéticos de diversas procedências, ampliando a base genética para apoiar as atividades de seleção e melhoramento.

O projeto parte de 80 árvores-matrizes localizadas na propriedade da empresa Litiara/Agroflora, em Rio Preto da Eva (AM). A equipe selecionou inicialmente as 10 plantas com maior vigor e teor de óleo acima de 1,5% na biomassa, reproduzidas por sementes.

“Em novembro de 2025, iniciamos a retirada dos galhos dessas plantas para produzir os clones por enraizamento de miniestacas”, explica o pesquisador Edson Barcelos, da Embrapa Amazônia Ocidental, que lidera a iniciativa. O processo utiliza pequenos pedaços de plantas para que criem raízes e se desenvolvam em mudas idênticas à planta mãe.

Da pesquisa básica à escala comercial

O Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) já estudou a reprodução do pau-rosa, porém ninguém aplicou a técnica em escala comercial. A Embrapa pretende aprimorar o método de enraizamento para viabilizar a produção em larga escala de mudas clonadas, seguindo o modelo de culturas consolidadas como café, eucalipto e erva-mate.

A proposta estabelece um modelo completo que abrange desde a seleção genética até o manejo no campo. Os pesquisadores avaliarão diversos parâmetros agronômicos: época ideal e altura da poda, espaçamento entre plantas, tipos e doses de adubação, além de estratégias para controlar pragas e doenças.

“Para plantar cinco hectares, precisamos de cinco mil mudas. Mas não encontramos sementes suficientes e, quando há, o material genético apresenta muita heterogeneidade. As plantas crescem de forma desigual e o teor de óleo varia drasticamente”, detalha Barcelos.

Foto: Edson Barcelos / Embrapa

Produção sustentável preserva as árvores

O óleo essencial do pau-rosa concentra seu valor principalmente no linalol, composto químico que representa mais de 80% do produto e possui diversas aplicações comerciais. A pesquisa da Embrapa foca na produção sustentável voltada para esses usos, extraindo o óleo de folhas e galhos e mantendo a árvore viva.

Durante décadas, exploradores cortaram o pau-rosa rente ao solo para extrair o óleo, sem replantio ou manejo adequado. Após a inclusão da espécie na lista de ameaçadas de extinção, essa prática foi proibida. No entanto, o Brasil ainda não desenvolveu tecnologia suficiente para o cultivo comercial, cuja área plantada hoje não ultrapassa 50 hectares, concentrados nos municípios amazonenses de Maués, Novo Aripuanã e Itacoatiara.

Principais desafios do cultivo

A escassez de mudas de qualidade representa um dos principais obstáculos. Plantios realizados a partir de sementes apresentam taxa de mortalidade entre 70% e 90%, além de grande variabilidade genética, o que compromete a uniformidade das plantas. O teor de óleo pode variar de 0,5% a 2,0%. A limitada experiência com sistemas de plantio e manejo adequados agrava o problema.

Uma emenda parlamentar de R$ 250 mil permitiu construir estufas, adquirir vasos e equipamentos para um laboratório de extração de óleo. A casa de vegetação já funciona e, nos próximos meses, a equipe começará os testes de enraizamento com diferentes substratos — como terriço, fibra de coco e vermiculita — e hormônios vegetais.

O projeto também investiga o uso da banana como cultura de sombreamento nos primeiros anos do pau-rosa. A estratégia oferece sombra ideal e retorno econômico para ajudar a custear o plantio. A pesquisa busca definir o melhor espaçamento, época e altura de poda, adubação e controle de pragas.

“Vamos criar um sistema de produção validado”, acrescenta o pesquisador.

Agricultores familiares testam cultivo como alternativa

Agricultores familiares da zona rural de Manaus testam o cultivo do pau-rosa como alternativa à extração em florestas nativas. Em 2012, famílias dos assentamentos no ramal ZF 4 e a Embrapa iniciaram o plantio de 230 mudas em áreas de roçado de mandioca e capoeira. Os produtores consorciaram as mudas com frutíferas perenes e, em 2020, observaram as primeiras florações.

Apesar da taxa de mortalidade de 47%, atribuída a pragas, sombreamento e estresse hídrico, as plantas consorciadas apresentaram sobrevivência 50% superior em comparação às cultivadas em capoeira e 60% menos mortalidade. Os técnicos recomendaram a poda das plantas sombreadoras para estimular a biomassa e a reprodução, visando a coleta de sementes e a extração de óleo em agroindústrias familiares.

Burocracia trava comercialização do óleo

Além da escassez de mudas de qualidade e da alta mortalidade, a burocracia excessiva na comercialização do óleo essencial representa outro entrave importante. Durante o Simpósio de Óleos Essenciais realizado em Manaus, em outubro de 2025, especialistas e empresários propuseram a “Carta do Pau-Rosa”, iniciativa que busca sensibilizar autoridades para destravar processos que dificultam o avanço da cadeia produtiva. As muitas exigências afastam os compradores, que preferem substituir o pau-rosa por outros óleos.

Com a consolidação do sistema de produção, a expectativa é fortalecer a cadeia produtiva regional, promover a conservação da espécie e gerar novas oportunidades econômicas para comunidades amazônicas e empreendedores.

“Estamos construindo um modelo que alia ciência, conservação e desenvolvimento regional. O pau-rosa pode voltar a ser símbolo de riqueza, desta vez, com sustentabilidade”, conclui Barcelos.

*Com informações de Agro em Campo