Na última terça-feira (26), a carne bovina proveniente do Mercosul , com destaque para a do Brasil, foi alvo de críticas durante uma sessão da Assembleia Nacional da França . Deputados franceses questionaram abertamente a qualidade, os sistemas de produção e a rastreabilidade da carne exportada pelos países do bloco , chegando a compará-la a “lixo” .
Parlamentares disseram estar furiosos em relação ao acordo comercial entre a União Europeia (UE) e o Mercosul, que foi rejeitado pela maioria dos deputados em uma votação simbólica.
Entre os críticos mais enfáticos, o deputado Vincent Trébuchet, do partido UDR, fez duras acusações. Em discurso transmitido pela página oficial da Assembleia, Trébuchet afirmou: “Nossos agricultores não querem morrer e nossos pratos não são latas de lixo”, em referência à carne importada do Mercosul.
Ele também compartilhou sua fala nas redes sociais, incluindo um vídeo na plataforma X, reforçando a crítica ao consumo de carne do Mercosul, que, segundo ele, implicaria em aceitar “carnes cheias de hormônios de crescimento, produzidas em países onde a rastreabilidade continua um conceito vago”.
Outro ponto levantado pelo deputado foi um relatório da Comissão Europeia, que teria apontado falhas graves no sistema de fiscalização sanitária do Brasil. De acordo com Trébuchet, o documento sugere que apenas o Uruguai seria capaz de garantir a rastreabilidade dos produtos exportados. “A Comissão Europeia publicou uma auditoria e revelou que o Brasil era incapaz de assegurar as normas sanitárias exigidas pela UE”, argumentou o parlamentar.
A deputada Helene Laporte, do partido de extrema-direita Rassemblement National acusou o Brasil de competir de forma desleal com a União Europeia . Ela afirmou que o país faz uso “massivo de antibióticos”, prática proibida na UE desde 2006. “A forma de produção do Brasil seria o modelo? Não”, destacou Laporte, reafirmando a necessidade de proteger os padrões de qualidade europeus.
Em um tom ainda mais contundente, o deputado Antoine Vermorel, da Droite Républicaine, acusou o Mercosul de utilizar “produtos cancerígenos” na produção de carne. Em um vídeo de seu discurso, compartilhado nas redes sociais, Vermorel declarou: “Essa raiva tenho nas veias, a de um filho de agricultores que não suporta mais ver a agricultura francesa minada. Não ao Mercosul.”
O deputado Paul Molac destacou que o grupo se opõe ao acordo: “A oposição ao Mercosul tem um consenso aqui.” Ele ressaltou que agricultores franceses têm pressionado os parlamentares, alegando desvantagens frente aos concorrentes do Mercosul. “Os agricultores nos dizem: vocês querem uma produção mais virtuosa, mas nos colocam para competir com uma produção feita com insumos que não podemos utilizar”, completou Molac.
Contexto
Essas críticas à carne bovina do Mercosul ocorrem em um contexto de tensões econômicas, com empresas francesas como Danone, Tereos e, principalmente, o Carrefour, envolvidas em embates relacionados aos sistemas sanitários dos fornecedores brasileiros e cláusulas do acordo UE-Mercosul.
Em resposta às acusações sobre a qualidade da carne brasileira, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) anunciou que irá formalizar uma queixa na União Europeia contra o Carrefour e outras empresas francesas.
Acordo em cheque
O acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul, que visa facilitar o comércio de bens e serviços entre os dois blocos, segue sendo um ponto de grande resistência na Europa, especialmente devido a preocupações com o impacto ambiental e a concorrência desleal.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, comentou nesta quarta-feira (27) o pedido de desculpas do CEO global do Carrefour, Alexandre Bompard, que anunciou a intenção de a companhia voltar comprar carne dos países do Mercosul. Fávaro afirmou que o episódio está resolvido. “O CEO global do Carrefour compreendeu que errou e se retratou. Agora, é bola para frente. Caso encerrado”, declarou o ministro.
Fávaro também destacou que as declarações não deverão impactar as negociações para a formalização do acordo UE-Mercosul, previstas para o dia 6 de dezembro, no Uruguai. Embora reconheça que a França seja contra o acordo, ele acredita que o país não será capaz de bloquear a assinatura do pacto entre a União Europeia e o Mercosul. “O presidente Lula está se empenhando pessoalmente para formalizar esse acordo”, afirmou o ministro.
Além disso, Fávaro reforçou a postura do governo brasileiro em defesa da qualidade dos produtos nacionais, assegurando que o país não permitirá ataques à sua produção. “Discutiremos práticas e transparência, mas não admitiremos ataques desleais à qualidade dos produtos brasileiros”, completou.
Segundo Fávaro, se a França ou outros países optarem por não comprar carne brasileira, o Brasil continuará seu caminho, destacando que as exportações para a Europa caíram significativamente nos últimos anos.
“Há 20 ou 15 anos, a Comunidade Europeia consumia algo em torno de 20% das exportações de carne brasileira. Hoje, esse número varia entre 3,5% e 5%. A França, menos de 0,5%. É uma opção deles, que nós temos de respeitar”, destacou.
O ministro também destacou que o governo está atento para defender a reputação do agronegócio brasileiro. “Não querer comprar produtos brasileiros é um direito deles. Mas, no momento em que ultrapassarem o limite e afirmarem que os produtos brasileiros não têm qualidade, eles terão a mesma resposta que o Carrefour teve”, reforçou Fávaro.
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