Estudo constata que 50,1% dos domicílios estão nas classes C para cima, o que significa renda mensal domiciliar acima de R$ 3,4 mil (Imagem: Alf Ribeiro / Shutterstock)

O Brasil voltou a ser um país de classe média. O ano de 2024 marcou uma mudança na distribuição das famílias por estrato social, mostra levantamento da Tendências Consultoria obtido em primeira mão pelo GLOBO. O estudo constatou que 50,1% dos domicílios estão nas classes C para cima, o que significa renda mensal domiciliar acima de R$ 3,4 mil.

É a primeira vez que isso acontece desde 2015, quando 51% estavam ao menos na classe média. Em 2023, os domicílios das classes C, B e A representavam 49,6%.

A melhora no emprego é o principal fator responsável pela ascensão social dos brasileiros, diz a consultoria: “Desde 2023 houve migração importante das famílias da classe D/E para a classe C, decorrente da melhora significativa do mercado de trabalho no pós-pandemia”, explica a economista Camila Saito, da Tendências.

As classes C e B são tipicamente as de classe média. Nessas famílias, a principal fonte de renda vem do trabalho, e a massa salarial (total dos ganhos de todos os trabalhadores) aumentou nos últimos anos, diz Camila, com a retomada da economia após a pandemia e a valorização real do salário mínimo em 2023 e 2024, após anos sem reajustes acima da inflação.

Impulso do emprego

Pelas estimativas do estudo, a massa de renda total no ano passado, incluindo salários, benefícios sociais, aposentadorias e pensões, e outras rendas como juros de investimentos, subiu em média 7% no país. Mas, na classe C, este avanço foi bem maior, de 9,5%.

Neste estrato social estão as famílias com rendimento domiciliar entre R$ 3,5 mil e R$ 8,1 mil. Na classe B, que reúne os domicílios com rendimentos entre R$ 8,1 mil e R$ 25 mil, o avanço nos ganhos foi de 8,7%, o segundo melhor desempenho.

Neste ano de 2025, a classe C deve, de novo, ter um desempenho melhor do que a média nacional. A Tendências prevê expansão de 6,4% na renda deste grupo, contra 3,8% para o conjunto dos brasileiros. Mas, em qualquer recorte, será um desempenho aquém de 2024, que resultará em uma mobilidade social mais lenta, afirma Camila.

“Nossas estimativas consideram uma tendência de lenta mobilidade social das famílias para classes de renda superiores. A mobilidade social das classes D e E deve ser reduzida nos próximos anos, acompanhando um fenômeno típico de países com alta desigualdade.

Segundo a economista, o ingresso no mercado de trabalho é o principal meio de redução da pobreza, mas não é condição suficiente para superá-la, diante das “baixas remunerações, elevadas desigualdades entre grupos de população ocupada, altas taxas de informalidade e marcante heterogeneidade entre os setores produtivos”.

No ano passado, a taxa de desemprego chegou ao seu menor nível histórico, de 6,1% no trimestre terminado em novembro, e o nível de ocupação (total de pessoas com trabalho em relação à população total) chegou também ao seu melhor momento: 58,8%. Em 2019, essa taxa era de 56,8%.

Desigualdade em queda

Segundo o economista Marcelo Neri, diretor da FGV Social, o Brasil teve resultados sociais “bastante alvissareiros”, comparáveis aos de 2014 (o melhor ano até então para o mercado de trabalho), mas ainda melhores. O economista avalia que os três componentes que favorecem a ascensão social estavam presentes em 2024: “Nos nossos estudos da nova classe média, três componentes estavam presentes: crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), como está havendo nos últimos dois anos; crescimento da renda do trabalho bem acima do PIB, que está acontecendo também. Em 2023, a alta do rendimento do trabalho só perdeu para o boom do Real (em 1994) em único ano”.

Já o terceiro componente, explica Neri, só apareceu em 2024, que foi a queda da desigualdade. Apesar de os indicadores de disparidade de renda estarem no menor patamar histórico, eles ficaram praticamente estagnados em 2023. Em 2024, foi diferente, afirma Neri.

“No ano passado, entrou um elemento novo, ausente da cena nos últimos anos, que foi a queda na desigualdade. Até o terceiro trimestre, a renda média domiciliar per capita em 12 meses cresceu 6,98%, mas entre os 50% mais pobres, a alta foi 10,2%”.

E a causa principal dessa alta maior veio da queda do desemprego, que respondeu por 40% do aumento da renda das famílias, afirma Neri.

Um dos símbolos da classe média, que é o emprego formal, também avançou. Foram criadas 3,6 milhões de vagas com carteira assinada de janeiro de 2023 a setembro de 2024, lembra o economista.

A alta da taxa básica de juros, a Selic, atualmente em 12,25% ao ano, e que pode chegar a 14,75% no fim de 2025, se as previsões dos analistas se confirmarem, deve favorecer a classe A, diz Camila, da Tendências. Este estrato social tem os ganhos mais concentrados em aplicações financeiras e aluguéis.

“Com a trajetória de aumento da Selic, a estimativa para a massa “outros” é de uma alta de 7,8%. Assim, o aumento dos juros deve favorecer a classe A e, em menor medida, a classe B também. Além disso, os níveis elevados da inflação prejudicam mais as famílias mais pobres”, afirma Camila.

Com informações de O Globo