Benjamin Netanyahu discursa na ONU com plenário esvaziado - Foto: Kay Nietfeld / Getty Images

Diplomatas brasileiros e delegações de outros países boicotaram o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, pouco antes do início do discurso do israelense no quarto dia da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York.

Representantes da delegação brasileira e de outras nações deixaram plenária da ONU antes da fala de Netanyahu. “Ato foi pensado como resposta ao descumprimento das decisões do Tribunal Penal Internacional e da Corte Internacional de Justiça”, justificou um embaixador brasileiro na ocasião.

“No caso do Brasil, o governo Lula também considera que, ao tratar o presidente como “persona non grata”, Brasília não teria condições de legitimar o discurso de Netanyahu no pódio.” afirmou um Embaixador brasileiro, sobre boicote do Brasil a premiê israelense.

O assessor especial da presidência, Celso Amorim, confirmou que decisão de deixar plenária foi mensagem a Israel. “Trata-se de um ato de repúdio”, disse, em declarações exclusivas à coluna de Jamil Chade.

“Sempre lembrando que isso não tem relação com o povo judeu, que tanto admiramos”, ressaltou Amorim. “E nem com o Estado de Israel, cuja existência não discutimos. Isso tem uma relação com o respeito à população palestina”, insistiu.

“Estou muito preocupado. Essa é uma guerra que pode se alastrar por todo Oriente Médio e isso, para se transformar numa guerra global, é um passo.” afirmou Celso Amorim, embaixador.

Países árabes boicotaram em peso discurso do israelense. Entre os que deixaram a plenária na ocasião estavam as delegações diplomáticas do Líbano, da Arábia Saudita e do Qatar, também alvo de recentes ataques de Israel.

Imagens mostram que outras nações também se retiraram. Entre elas Coreia do Sul, Turquia, Irã, Venezuela, Sri Lanka, Tunísia e Senegal.


Netanyahu discursa na Assembleia da ONU – Foto: Michael M. Santiago / Getty Images

Entre os que permaneceram na plenária estavam delegações dos EUA e da Argentina. Além dos aliados de Israel, diplomatas da Armênia, Benin e Camboja acompanharam o discurso de Netanyahu.

Israelense foi vaiado ao subir na tribuna. Assim que seu nome foi anunciado pelo evento, várias delegações começaram a deixar o plenário, entre vaias e aplausos.

Antes do início do discurso, representantes da delegação brasileira usavam lenço palestino na plenária. Apesar do esvaziamento do salão, parte dos que seguiram presentes aplaudiu o israelense antes de sua fala (leia abaixo).

O que disse Netanyahu

Premiê declarou que Israel “destruiu a maior parte da máquina terrorista” do Hamas e busca “finalizar o serviço o mais rápido possível” em Gaza. Em seu discurso na Assembleia Geral da ONU, Netanyahu elogiou o que descreveu como uma série de vitórias estratégicas israelenses no último ano, que também incluíram o ataque ao programa nuclear do Irã e o assassinato do líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, no Líbano.

Netanyahu usou broche com QR Code, que, segundo ele, direcionava para site mostrando “atrocidades” cometidas pelo Hamas contra israelenses. Ele também levou quadros e fez um “quiz” com as poucas pessoas que restaram no parlamento, questionando quem cometeu atos terroristas contra Israel e contra os EUA.

Primeiro-ministro afirmou que apoio de nações a Israel foi dado após o 7 de outubro, mas “evaporou” quando o país “começou a revidar”. “Pelos últimos dois anos, Israel tem lutado uma luta contra bárbaros, enquanto muitas nações se opõem a nós”, afirmou.

Netanyahu declarou antes do discurso que planeja expandir os assentamentos judaicos na Cisjordânia ocupada. Seus ministros de extrema direita, Itamar Ben Gvir e Bezalel Smotrich, vão além e pedem a anexação do território. Em resposta, o presidente dos EUA, Donald Trump, afirmou ontem que não dará seu aval à anexação da Cisjordânia, hoje um território ocupado por Tel Aviv.

Ele agradeceu ao apoio de Trump na contramão do repúdio internacional. Na ocasião, afirmou que o presidente dos Estados Unidos sofreu tentativas de assassinato e as ligou a “inimigos em comum”.

Israel ordenou transmissão de discurso em Gaza

Gabinete de Netanyahu ordenou que seu discurso de hoje fosse transmitido ao vivo para moradores da Faixa de Gaza. Forças de Defesa de Israel receberam ordens para instalar alto-falantes em caminhões ao longo do enclave palestino. À imprensa israelense, o Ministério da Defesa confirmou que transmitiria o discurso ao vivo para os moradores de Gaza, mas afirmou que o faria apenas do lado da fronteira de Israel.

Ajuda entra na Faixa de Gaza após Israel anunciar pausa diária nas hostilidades (Zikim, em 27 de julho de 2025) – Foto: Mohammed Saber / EPA / Shutterstock / BBC News Brasil

Medida faz parte do “esforço de diplomacia pública”, disse o gabinete. Em nota, o órgão afirmou ainda que “ordenou explicitamente que esta operação não coloque em risco os soldados das FDI [Forças de Defesa de Israel]”.

Fonte militar relatou a jornal israelense que medida foi um ato de guerra psicológica. Apesar disso, o veículo Haaretz noticiou que, independentemente da oposição, o exército não desafiaria o pedido do premiê e estava se preparando para transmitir o discurso de Netanyahu para toda a Faixa de Gaza. Durante seu discurso, Netanyahu afirmou que objetivo dos alto-falantes era enviar mensagens para os reféns.

Alvo de repúdio e condenação internacional

Voo que levou Netanyahu aos Estados Unidos desviou de países europeus, onde ele é alvo de ordem de prisão. O pedido de prisão foi emitido pelo Tribunal Penal Internacional com base em acusações de crimes de guerra e crimes contra a humanidade.

Expectativa é de que ele e Donald Trump façam um encontro a portas fechadas hoje. Eles vão se encontrar em Washington, a 370 quilômetros de Nova York, no fim do dia.

Reconhecimento do Estado palestino marcou agenda da ONU

Países que apelam pelo fim da guerra em Gaza tinham sinalizado o reconhecimento do Estado palestino na ONU e cumpriram suas promessas nesta semana. Uma reunião voltada à solução de dois Estados —que prevê o reconhecimento de um Estado palestino e outro israelense— foi feita na segunda-feira, um dia antes da abertura da Assembleia Geral.

O presidente Emmanuel Macron, da França, foi um dos que formalizou o reconhecimento na segunda-feira. Ele afirmou que “os palestinos têm história e dignidade, e o reconhecimento de seu Estado não subtrai nada do povo de Israel”.

Dias antes, Canadá, Reino Unido, Austrália e Portugal também anunciaram o reconhecimento do Estado. Eles se juntaram à Espanha, Irlanda, Noruega e Eslovênia, que acenaram a favor dos palestinos no ano passado. Veja aqui a lista de países que reconhecem o Estado da Palestina.

Presidente da Autoridade Palestina agradeceu aos países pelo reconhecimento do Estado em discurso feito ontem na assembleia. Mahmoud Abbas falou por videoconferência, já que não recebeu visto para entrar nos Estados Unidos e participar presencialmente do evento.

Guerra em Gaza matou mais de 65 mil pessoas

Mais de 400 dessas 65 mil pessoas morreram por fome, após o bloqueio total de ajuda humanitária. A entrada de comida foi bloqueada por mais de dois meses no enclave e foi retomada a conta-gotas meses depois, mas até hoje não existe uma rede de distribuição necessária para alimentar toda a população, segundo a Organização das Nações Unidas.

Adolescente palestina chora após chegada de corpos às dependênciad so hospital al-Shifa, na Cidade de Gaza – Foto: Omar AL-QATTAA / AFP

Israel continua os ataques mesmo sob pedidos de cessar-fogo, com uma operação de “tomada total” na Cidade de Gaza, área mais populosa do enclave. Avisos de evacuação de todo o território foram emitidos ao longo das últimas semanas e a população foi deslocada.

O conflito entre Israel e Palestina não é recente, mas foi intensificado após o ataque terrorista do Hamas, em 7 de outubro. Na ocasião, os extremistas invadiram Israel, matando cerca de 1.200 pessoas e levando outras 250 como reféns.

Hoje, estima-se que 50 reféns israelenses continuem em Gaza e que a maioria deles esteja morta. A Inteligência de Israel estima que somente 20 dos homens e mulheres levados para o enclave pelo Hamas sigam vivos, quase dois anos após o início da guerra.

*Com informações de Uol