A Amazônia, reconhecida pela biodiversidade e diversidade de povos indígenas, enfrenta desafios significativos, como desmatamento e mudanças climáticas, que ameaçam tanto o meio ambiente quanto as culturas locais. A inteligência artificial (IA) pode desempenhar papel crucial na valorização cultural e na conservação ambiental, mas sua aplicação deve ser cuidadosamente considerada.
Grande parte do desenvolvimento da IA, especialmente no contexto generativo, ocorre fora do Brasil, em países como Estados Unidos e China. A Unesco alertou sobre uma divisão que pode marginalizar os países do Sul Global, transformando suas culturas em mercadorias desprovidas de identidade. Um exemplo disso foi a solicitação do publicitário Rodrigo Esteves a uma IA generativa para criar uma imagem de povos indígenas brasileiros, que resultou em representações de nativos norte-americanos. Isso mostra o viés cultural preponderante nas IAs treinadas com dados globais.
O desafio é agravado pela concentração do desenvolvimento tecnológico em poucas empresas privadas, predominantemente localizadas no Norte Global, levando à hegemonia cultural e à erosão da confiança e do entendimento. Um relatório do Oxford Internet Institute destaca os riscos associados a essa dinâmica, que perpetua preconceitos coloniais e vulnerabiliza os países do Sul Global.
A 19ª edição do Relatório de Riscos Globais, de 2024, reforça a preocupação com a hegemonia tecnológica e seus impactos nas culturas, especialmente nas comunidades indígenas. Apesar do crescimento no uso de tecnologias como a IA no Brasil, a adoção traz à tona questões de viés cultural, como mencionado no manifesto “DecolonizAI”, da Universidade de São Paulo. Para evitar o apagamento das culturas originárias, é essencial garantir a representatividade nos dados utilizados para treinar esses sistemas, considerando gênero, etnia e características culturais.
Os povos amazônidas, em particular, e sua cultura são mal representados pela IA, que muitas vezes falha em captar suas nuances. Além disso, tecnologias de vigilância correm o risco de ser mal utilizadas, ignorando os direitos das comunidades indígenas. Ailton Krenak, em palestra na Reconcitec 2024, enfatizou a necessidade de repensar a inovação tecnológica, privilegiando uma conexão profunda com o clima, os ecossistemas e os territórios.
Entretanto há iniciativas promissoras, como o chatbot desenvolvido pela Superintendência Estadual de Tecnologia da Informação e Comunicação de Rondônia, em parceria com o Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia, que monitora queimadas em tempo real, permitindo respostas mais rápidas e eficazes.
Um uso responsável da IA exige abordagem ética que respeite os saberes locais. A inclusão das comunidades indígenas nas políticas públicas e regulações precisa garantir que a IA seja usada para preservar, e não suprimir as culturas amazônicas. Eventos como a COP30 devem ser oportunidades para estabelecer diretrizes que promovam a inclusão e a proteção das identidades indígenas, incorporando seus saberes ancestrais em todo o ciclo regulatório da IA.
Construir um futuro tecnológico que valorize as culturas originárias requer esforços coletivos. A inovação deve servir à preservação da riqueza cultural e ambiental da Amazônia, garantindo que permaneçam vivas. Assim, povos indígenas e tecnologias emergentes podem encontrar um caminho sustentável que equilibre tradição e inovação, sustentabilidade e tecnologia, assegurando que a cultura seja um bem jurídico protegido e um direito das gerações futuras.
*Guilherme Mucelin é doutor em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Ricardo Moura Antunes é pós-graduado em Direito, políticas públicas e controle externo e especialista em populações indígenas da Amazônia pela Universidade Federal do Pará, Christine Albiani é mestre em Direito pela Universidade Federal da Bahia, Bruna Strahl é pós-graduada em Direito Administrativo e gestão pública pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Rio Grande do Sul.
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