Rosa Weber chora de emoção ao deixar CNJ: 'Enorme privilégio' - Foto: Reprodução / CNJ

No dia 2 de outubro a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, completará 75 anos, idade que marca a aposentadoria compulsória dos magistrados que compõem a corte.

Nesta quinta-feira (28), a ministra se despede da corte após participar de sua última sessão, na posição de presidente do Supremo. Após a saída de Rosa, o ministro Luís Roberto Barroso assume a presidência.

Em sua última sessão à frente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a ministra ficou emocionada e chorou dizendo que naquele momento “um verdadeiro mar de emoções” tomava conta dela.

“Eu choro muito, eu sou muito chorona, mas as lágrimas sempre escorrem para dentro. Mas nesses dias elas têm teimado em mudar o rumo”, disse Rosa Weber.

Quem é Rosa Weber?

Indicada pela ex-presidente Dilma Rousseff, a gaúcha de Porto Alegre Rosa Maria Pires Weber tomou posse como ministra no dia 19 de dezembro de 2011, tornando-se apenas a terceira mulher a alcançar o topo da carreira judiciária em 132 anos de existência da Corte.

Na juventude, a ministra ficou em 1º lugar no vestibular e se formou em Direito como aluna laureada na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e se formou em 1971. Na magistratura, Weber foi Desembargadora do Trabalho no TRT da 4ª Região. Em 2006, tornou-se ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST), onde permaneceu até chegar ao Supremo.

Ao longo de quase 13 anos, Rosa integrou e presidiu a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, corte de que é presidente. A ministra também chegou à presidência do CNJ e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Calma, eloquente e firme nas suas decisões, a carreira de Rosa Weber reflete a personalidade discreta da ministra. Nas palavras da própria Rosa, “esse perfil mais discreto é a minha maneira de atuar na minha paixão, que são os processos”.

A descriminalização do aborto até a 12ª semana , a determinação de um prazo para os pedidos de vista dos ministros da corte, o julgamento do Marco Temporal para demarcação de terras indígenas, a condenação de réus por participação nos atos golpistas de 8 de janeiro e o processo que prevê a descriminalização do porte da maconha para uso pessoal são os de maior destaque.

Em 8 de janeiro de 2023, radicais tentaram dar um golpe de estado – Foto: [email protected] (Agência Brasil)

Rosa fez questão de se posicionar em cada um deles, e se articulou para garantir que teria tempo de proferir seus votos e garantir a validade de seus posicionamentos após a aposentadoria.

Assim, as maiores marcas de Rosa Weber são a disposição e habilidade que a ministra demonstrou para se debruçar sobre temas polêmicos sem cair em discursos vazios ou moralismo; e a defesa intransigente do Supremo Tribunal Federal como um guardião do Estado Democrático de Direito.

Atos golpistas

No caso dos réus condenados pelos atos golpistas e antidemocráticos de 8 de janeiro, Rosa votou pela condenação dos três réus pelos crimes de abolição do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; dano qualificado; deterioração de patrimônio tombado; e associação criminosa armada.

Na sessão, que ficou marcada na história tanto pelo teor do julgamento quanto pelos ataques e gafes dos advogados que fizeram sustentação oral, Rosa defendeu a importância da atuação do Supremo Tribunal Federal.

“Ninguém gosta de ouvir que nós não somos amados. Para mim, o importante é que o povo brasileiro compreenda que o STF é um dos três pilares da nossa democracia constitucional e é o guardião da nossa Constituição. Ele continuará com altivez e firmeza e desagradando a alguns, mas na defesa do nosso Estado democrático de Direito”, disse a ministra.

Rosa também fez uma defesa intransigente dos valores da democracia no dia 1º de agosto, quando a Corte retomou os trabalhos após o recesso do Judiciário. Na ocasião, Weber disse que mesmo após a depredação causada pelos golpistas em janeiro “este Supremo Tribunal Federal segue firme, vigilante e resiliente na guarda da nossa lei fundamental e na defesa do Estado Democrático de Direito”.

“As instituições saíram fortalecidas do dia 8 de janeiro, dia da infâmia. Não vamos esquecer para que sirva de alerta de que a democracia seja cultivada e regada diariamente com diálogo debate acalorado de ideia, defesa de respeito mútuo para que ela, democracia, continue inabalável”, disse a ministra.

Fim da “farra” dos pedidos de vista

A falta de determinação clara de um prazo para os pedidos de vista – ou seja, tempo adicional para analisar o caso antes de votar – que os ministros fazem aos processos que chegam ao Supremo Tribunal Federal causava morosidade no andamento de processos que por vezes ficavam parados por anos na Corte.

Lideranças indígenas fazem passeata contra marco temporal na Esplanada dos Ministérios – Foto: Antônio Cruz / Agência Brasil

Rosa Weber foi a responsável por mudar esse cenário ao alterar o regimento do Supremo, instituindo um prazo máximo de até 90 dias para a devolução dos processos após os pedidos de vista.

Além disso, Rosa obteve o aval de seus colegas para determinar que decisões monocráticas (individuais) devem ser levadas imediatamente para julgamento no plenário.

Direitos das Mulheres

Além de ser relatora da ADPF 442 e ter dado voto favorável à descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação, Rosa Weber – que nunca negou ser feminista – passou muito tempo debruçada sobre a temática. Ela promoveu audiências públicas no STF em 2018 para tratar dessa temática tão relevante quanto urgente.

Entre especialistas, instituições, organizações nacionais e internacionais foram ouvidas mais de 40 representantes de setores envolvidos no debate acerca do aborto, autonomia reprodutiva e da preservação da saúde física e psicológica das mulheres sujeitas a uma gestação indesejada.

Em seu voto , Rosa Weber considerou a punição penal ao aborto uma medida excessiva, salientou que não existe consenso em relação a quando começa a vida humana e que não se pode ignorar os direitos da mulher, que já é uma pessoa, em detrimento de uma vida em potencial. Além disso, Rosa foi taxativa ao afirmar que “a maternidade é escolha, não uma obrigação coercitiva”.

A atuação da ministra em prol dos direitos das mulheres e promoção da igualdade de gênero não para por aí. Em sua última sessão no CNJ, Rosa conseguiu aprovar uma nova regra para o preenchimento de vagas abertas na segunda instância do Poder Judiciário, de modo a aumentar a presença feminina nesses espaços.

A aprovação se deu em um período no qual o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), está sendo muito pressionado para indicar uma mulher para a vaga que Rosa deixará no Supremo.

Quando Lula indicou Cristiano Zanin, seu ex-advogado, para a primeira vaga aberta em seu terceiro mandato, Rosa fez uma crítica à pouca quantidade de mulheres no judiciário .

Rosa Weber é feminista e defendeu o direito ao aborto e à igualdade de gênero – Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil

“No Brasil, nós temos muitas mulheres na base da magistratura, na Justiça em primeiro grau, mas o número decresce no intermediário. Na cúpula, nos tribunais superiores, o número é ínfimo”, alfinetou a ministra.

Caso o presidente escolha um homem para o lugar de Rosa Weber, a ministra Cármem Lúcia se tornará a única mulher entre 10 homens na Suprema Corte. Apesar disso, Lula afirmou publicamente que questões de gênero e raça não serão critérios determinantes para sua decisão .

Marco temporal

Rosa já era presidente do Supremo quando pautou a votação da ação que defendia a tese do marco temporal para demarcação das terras indígenas.

Em outras palavras, o processo pedia que apenas as terras que já fossem ocupadas por indígenas ou tivessem sua titularidade questionada na data da promulgação da Constituição Federal (5 de outubro de 1988) poderiam ser demarcadas.

Numa decisão histórica que contou com forte mobilização e participação de indígenas e instituições dos direitos dos povos originários, apenas os ministros Nunes Marques e André Mendonça foram favoráveis ao marco temporal, deixando o placar da corte em 9 a 2 .

Habeas Corpus, prisão em 2ª instância e anulação de condenações de Lula

Em abril de 2018, o STF votou um pedido de Habeas Corpus de Lula , que estava preso sem haver trânsito em julgado, com base apenas na condenação em segunda instância definida pelo ex-juiz Sergio Moro.

Rosa era a quinta ministra a votar e seu posicionamento seria decisivo. Ela frisou diversas vezes que é pessoalmente contrária à prisão sem trânsito em julgado, mas alegou que votaria pela manutenção da prisão de Lula para seguir o princípio da colegialidade, acompanhando o entendimento dos colegas.

“Vozes individuais vão cedendo em favor de uma voz institucional, objetiva, desvinculada das diversas interpretações jurídicas”, disse a ministra.

Foto: Joédson Alves / Agência Brasil

Quando o Supremo se debruçou especificamente sobre a questão da prisão em 2ª instância no ano seguinte, Rosa acompanhou o entendimento do ministro-relator Marco Aurélio Mello, no qual a prisão só deve ocorrer após a sentença condenatória ter transitado em julgado.

Rosa Weber votou a favor de manter a decisão do ministro Edson Fachin que anulou as condenações de Lula no âmbito da Lava Jato e mandou os processos contra o petista para a Justiça Federal do Distrito Federal. Em seu discurso, Rosa disse que a decisão de Fachin aplicou precedentes do plenário da Casa, restringindo a competência da Vara de Curitiba.

“Não identifico elementos que debilitem a decisão monocrática do relator. Há uma relação muito distante entre as condutas imputadas e sua repercussão sobre o patrimônio da Petrobras”, disse a ministra.

Suspeição de Sergio Moro

Em março de 2021, a Segunda Turma do STF concedeu Habeas Corpus reconhecendo a suspeição do ex-juiz Sergio Moro na condução da ação que condenou Lula por corrupção passiva e lavagem de dinheiro referentes ao triplex do Guarujá (SP). Em seguida, o caso foi analisado pelo plenário, com a presença de todos os 11 ministros.

Rosa Weber integrava a Primeira Turma. Na votação que acabou confirmando a suspeição do ex-juiz, ela votou favoravelmente à manutenção da decisão proferida pelos colegas, ratificando o entendimento de que Moro teria agido com a intenção de condenar Lula baseado em suas convicções políticas.

*Com informações de IG