Foto: Gabriela Biló / Estadão

Na Amazônia, anos sob efeito do El Niño significam meses de seca, mais incêndios florestais, destruição da mata e maiores índices de emissões de dióxido de carbono (CO2). Foi assim no biênio 2015 e 2016, com sucessivos recordes negativos. Foi assim também em 2019 e 2020. Nesse último período, no entanto, o fenômeno climático já não afetava o bioma.

O que permitia que os registros de fogo, desmatamento e emissões disparassem enquanto a floresta vinha abaixo era o desmonte das políticas ambientais nos dois primeiros anos do governo de Jair Bolsonaro (PL), aponta pesquisa do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), publicada nesta quarta-feira, 23, na revista Nature..

À época dos fatos, o Ministério do Meio Ambiente havia sido entregue ao hoje deputado federal Ricardo Salles (PL), órgãos como o Ibama e a Funai começaram a ser desmontados e em pouco tempo Bolsonaro e o Brasil se transformaram em párias mundiais em questões ambientais.

Essa análise é corroborada pelos mais diversos estudos, dados e parâmetros produzidos nos últimos anos. A pesquisa do órgão ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia faz agora um retrato do que esse período significou em termos de emissões de CO2 na região amazônica, que se aproxima de forma perigosa do chamado “ponto de não retorno”.

Em 2015 e 2016, as emissões amazônicas atingiram seus pontos mais altos na década. Foram liberados 1,9 bilhão de toneladas de CO2 e 2,2 bilhões de toneladas de CO2, respectivamente. O El Niño é um fenômeno natural em que o aquecimento das águas superficiais do Oceano Pacífico Equatorial causa repercussões climáticas em todo o mundo.

Agora, os pesquisadores também determinaram quais atividades econômicas foram responsáveis pela perda florestal. A resposta: a exportação de madeira bruta, as áreas plantadas com soja e milho e os pastos para o rebanho bovino. A comparação mostrou crescimentos de 693% na exportação de madeira bruta saindo da Amazônia, de 68% na área plantada de soja, de 58% na área plantada de milho e aumento do rebanho bovino de 13% dentro do bioma, enquanto diminuiu no resto do Brasil.

Esta é a terceira pesquisa de Luciana publicada na Nature. Antes desta, um estudo dela mostrou que Algumas áreas da Floresta Amazônica já passaram a emitir mais dióxido de carbono do que absorvem. O estudo levou em consideração centenas de amostras de ar coletadas na parte mais baixa da atmosfera terrestre, entre 2010 e 2018, e constatou que a parte sudeste da Amazônia se tornou uma grande fonte de emissão de CO2.

Durante os últimos 50 anos, as plantas e o solo absorveram mais de 25% das emissões de gás carbônico. Já as emissões aumentaram em até 50%, segundo mostrou a pesquisa.

Nos últimos 40 anos, o leste da floresta sofreu mais desmatamento, aquecimento e estresse hídrico do que a parte oeste, especialmente durante as temporadas de seca. Essa tendência foi observada de forma ainda mais forte na porção sudeste da floresta, segundo a pesquisa.

De acordo com Luciana, a pesquisa publicada agora na Nature trouxe a ela duas certezas, uma que não pode ser classificada como positiva e uma francamente negativa. “Minha motivação foi entender se o Sudeste da Amazônia já havia chegado ao ‘ponto de não retorno’. Nesse período tivemos o ‘Dia do Fogo’, choveu preto em São Paulo. Ainda não chegamos, mas estamos perto”, afirma.

Se não é possível comemorar, ao menos ainda é possível intervir, ela explica. A outra certeza, por sua vez, é a má-notícia. “O lado oeste da Amazônia se tornou uma fonte de emissões. O projeto do Amacro (fronteira agrícola que vai formando entre Amazônia, Acre e Rondônia) que quer se tornar um Matopiba (fronteira agrícola já formada por Maranhão, Tocantins Piauí e Bahia) tem que ser abandonado”, afirma. “Esse modelo econômico está falido.”

*Com informações de Terra