Foto: Divulgação / Ipaam

O desmatamento é a segunda maior fonte de emissões de gases de efeito estufa, atrás do uso de combustíveis fósseis. Mesmo assim, a COP30 falhou em apontar um caminho para o cumprimento de uma das metas do Acordo de Paris: acabar com a destruição das florestas até 2030. O objetivo está previsto no tratado internacional há dez anos.

Com uma linguagem vaga, os documentos da Conferência de Belém mencionam a importância da preservação da natureza e do aumento dos “esforços para deter e reverter o desmatamento e a degradação florestal” nos próximos cinco anos – sem especificar como nem com quais recursos.

“Eu acho que ela podia ter entregado muito mais do que entregou. A gente viu que dois textos até tratam da questão das florestas. Mas do ponto de vista da implementação mesmo, a gente viu zero avanços”, lamenta Fernanda Carvalho, diretora global de políticas climáticas da organização WWF. Ela acompanhou as negociações da COP30 como observadora da sociedade civil.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentou emplacar a discussão de dois roteiros fundamentais para o combate efetivo das mudanças climáticas: um para o fim dos combustíveis fósseis e um segundo para o desmatamento. Nenhum dos temas estava na agenda oficial de negociações da conferência.

Um primeiro projeto da decisão Mutirão da COP30 – o pacote de acordos políticos do evento – chegou a incluir a discussão sobre os temas. Entretanto, diante da forte resistência de cerca de um terço dos países participantes à questão do petróleo, ambos os trechos foram retirados dos documentos finais.

Foco nos combustíveis fósseis

Os debates acirrados sobre as energias fósseis acabaram por abafar as possibilidades de progressos no tema do desmatamento, avalia Fernanda Carvalho. “Não soube de ninguém que bloqueou especificamente o desmatamento, mas como isso não era um item de agenda, a opção foi não avançar com isso. Como já estava gerando tanto conflito a parte de combustíveis fósseis, eu acho que não teve como avançar”, reitera.

A especialista salienta que, sem um planejamento robusto, os cinco anos que restam pela frente podem não ser suficientes para o cumprimento do objetivo. “É um prazo curtíssimo para implementar coisas que a gente já tinha que ter implementado. E, no caso de florestas, já existem compromissos anteriores, que eram sobre 2020, que a gente não conseguiu alcançar”, lembra. “Então era superimportante que a gente tivesse tratado disso com mais força nessa COP.”

A solução apresentada pela presidência brasileira da COP30 foi lançar discussões oficiais sobre os dois mapas do caminho – para o fim da dependência das energias fósseis e o fim do desmatamento – ao longo do próximo ano, durante o mandato do embaixador André Corrêa do Lago. O papel das florestas na crise climática é central: elas não apenas absorvem cerca de 30% do CO₂ emitido no planeta, como a derrubada das árvores as torna fonte de mais emissões.

Foto: Marcos Vergueiro / Secom-MT

O Brasil, com a maior floresta tropical do mundo, lidera o ranking dos países que mais devastam as florestas, seguido por República Democrática do Congo, Bolívia, Indonésia e Peru, entre outros. Mas o país é o único que já possui um roteiro para acabar com a devastação até o fim desta década, salientou a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, ao final da conferência em Belém.

“A Amazônia não recebe apenas um legado, mas ela também oferece um legado. Com certeza o Brasil será uma referência para mapas do caminho em outros lugares e em outras regiões do mundo, salvaguardando os diferentes contextos e realidades em termos de conformação florestal”, indicou Silva.

Liderança brasileira ameaçada

Na visão de Fernanda Carvalho, o país tem demonstrado que poderá cumprir o objetivo: o desmatamento caiu 32% de 2023 para 2024, e iniciativas como o Plano Nacional de Bioeconomia alavancam o desenvolvimento sustentável na região, sem devastação. Entretanto, os retrocessos promovidos pelo Congresso na agenda ambiental, como a simplificação do licenciamento de grandes projetos dos governos, colocam a meta brasileira em xeque.

“Tudo depende de vontade política, e a gente vê sempre que existem batalhas políticas internas. A flexibilização do licenciamento pode ser desastrosa e gerar mais desmatamento”, adverte Carvalho.

A nova versão da Lei de Licenciamento Ambiental Especial (LAE) – criada por Lula por meio da Medida Provisória 1.308/2025 – foi aprovada a toque de caixa pelo Senado nesta quarta-feira (3), dias depois de o Congresso derrubar quase todos os vetos de Lula à atualização da Lei de Licenciamento Ambiental no país, o chamado PL da Devastação. Na prática, 52 dos 63 vetos não apenas caíram, como a nova lei amplia o alcance da LAE, que agora poderá se aplicar a qualquer obra considerada “estratégica” pelo governo, com liberação simplificada em até 12 meses.

“O parecer da MP, aprovado com aval do governo Lula, já traz em seu texto a primeira encomenda: a BR-319, estrada que implodirá o controle do desmatamento – e, por tabela, das emissões de gases de efeito estufa do Brasil – passará a ser licenciada por LAE”, apontou o Observatório do Clima, em nota após a aprovação do texto. “A rodovia recebeu uma licença prévia ilegal no governo Bolsonaro, que fez o desmatamento no entorno da estrada explodir 122% em um ano após sua concessão. A licença hoje está suspensa na Justiça”, complementa a organização, que reúne quase 200 entidades de proteção do meio ambiente.

*Com informações de Terra