Foto: Rosinei Coutinho / STF

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes disse não se intimidar após o governo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, impor as as tarifas de 50% ao Brasil, revogar o seu visto de entrada no país e sancioná-lo sob a Lei Magnitsky, que geralmente é usada contra acusados de violações graves dos direitos humanos.

“Não há a menor possibilidade de recuar nem um milímetro”, diz Moraes ao Washington Post, jornal dos Estados Unidos, em reportagem publicada nesta segunda-feira, 18. “Faremos o que é certo: receberemos a acusação, analisaremos as provas e quem deve ser condenado será condenado, e quem deve ser absolvido será absolvido.”

O ministro conversou com o jornal norte-americano em uma rara entrevista de um hora em seu gabinete. A reportagem destaca que Moraes já entrou em conflito com Jair Bolsonaro (PL), Elon Musk e outras personalidades da direita e que, agora, seu oponente é Trump, que descreveu a relatoria do ministro na ação penal contra Bolsonaro como uma “caça às bruxas”.

O jornal afirma que Moraes foi “empoderado pelo Supremo Tribunal para investigar ameaças digitais, verbais e físicas contra a ordem democrática do Brasil” e se tornou um “xerife da democracia”. “Seus amplos decretos têm repercutido pelo mundo, em sociedades cada vez mais polarizadas por debates sobre liberdade de expressão, tecnologia e o poder do estado”.

O Washington Post lembra que Moraes já suspendeu plataformas de mídia social, como o X, o que fez Musk chamá-lo de “Darth Vader do Brasil”, ordenou prisões no caso das invasões no 8 de janeiro de 2023 e colocou Bolsonaro em prisão domiciliar. “Efetivamente silenciou uma das figuras de direita mais reconhecíveis do mundo.”

Para entender como Moraes se tornou o “jurista mais poderoso na história brasileira”, 12 amigos e colegas de Moraes, do passado e do presente, foram ouvidos. De acordo com a reportagem, a maioria defendeu o ministro, afirmando que as suas “medidas rigorosas ajudaram a preservar a democracia brasileira em um momento em que o autoritarismo está crescendo em todo o mundo”. Outros, porém, disseram que ele se tornou “poderoso demais” e “era culpado de ultrapassar limites”, pondo em perigo a legitimidade do STF.

Investigações

O jornal relata que, no início de 2019, Dias Toffoli, então presidente do STF, telefonou para Moraes, com um “pedido urgente”, em meio à rápida ascenção de Bolsonaro e ataques à Corte, como as de um dos filhos do ex-presidente, Eduardo Bolsonaro. “Desinformação, ameaças e apelos para dissolver o tribunal estavam de repente florescendo nas redes sociais”, diz um trecho da matéria. Moraes então foi escolhido para comandar um “escudo”: uma investigação sobre “notícias falsas” e retórica antidemocrática.

“A abertura da investigação, que Toffoli chamou de decisão mais difícil de seu mandato, marcou uma ruptura acentuada com o precedente. Tradicionalmente, o tribunal não tem autoridade para iniciar suas próprias investigações”, destaca o WP.

O presidente dos EUA, Donald Trump – Foto: Mike Segar / Reuters

“Entendo que para uma cultura americana é mais difícil entender a fragilidade da democracia porque nunca houve um golpe lá”, diz Moraes. “Mas o Brasil teve anos de ditadura sob [o presidente Getúlio] Vargas, outros 20 anos de ditadura militar e inúmeros golpes. Quando você é muito mais atacado por uma doença, você forma anticorpos mais fortes, e busca uma vacina preventiva”, afirma Moraes.

De acordo com o jornal, à medida que a investigação de Moraes se aprofundava, “seu poder também aumentava”. ” O sistema judiciário do Brasil frequentemente agrupa casos semelhantes sob a jurisdição de um único juiz, e Moraes logo estava encarregado de praticamente todas as investigações sobre supostos ataques contra a ordem democrática por Bolsonaro e seus apoiadores.”

O WP também cita que Moraes foi quem comandou os processos que tornaram Bolsonaro inelegível e as apurações sobre a tentativa de golpe de Estado. “Este é um devido processo legal”, responde Moraes. “Cento e setenta e nove testemunhas já foram ouvidas.”

Questionado se tinha poder demais, Moraes descarta e afirma que seus colegas do STF haviam revisado mais de 700 de suas ordens após recursos. “Sabe quantas eu perdi? Nenhuma”, comenta.

Relação com os EUA

O jornal diz que “aos olhos do governo americano, Moraes é um vilão global”. O ministro, no entanto, afirma que sempre buscou inspiração na história da governança americana, destacando as obras de John Jay, Thomas Jefferson e James Madison. “Todo constitucionalista tem uma grande admiração pelos Estados Unidos.”

Para Moraes, a tensão entre o Brasil e os Estados Unidos é “temporária” e foi impulsionada pela política e desinformação. Ele citou Eduardo Bolsonaro como um dos responsáveis por isso.

“Essas narrativas falsas acabaram envenenando a relação — narrativas falsas apoiadas pela desinformação espalhada por essas pessoas nas redes sociais”, afirma Moraes. “Então o que precisamos fazer, e o que o Brasil está fazendo, é esclarecer as coisas.”

Sobre as perdas de liberdades pessoais, Moraes diz que “não é agradável” de passar, mas, conforme ele, “enquanto houver necessidade”, a “investigação continuará”.

*Com informações de Terra