Otaviano Costa junto com a família: a esposa e atriz Flávia Alessandra, e as filhas Giulia e Olívia (Foto: Arquivo Pessoal)

Tudo começou na Argentina. Estava passando o feriado de Corpus Christi com minha família quando comecei a sentir uma dorzinha na costela do lado direito. Nunca tinha sentido aquilo e ficou me incomodando por um tempo. Quando voltei para o Brasil, liguei para meu médico, Roberto Kalil, contei o que estava acontecendo e ele me pediu para fazer um ecocardiograma. Era começo de junho, um dia antes do aniversário de 50 anos da Flávia (Flávia Alessandra, atriz e esposa de Otaviano). Família inteira estava reunida em casa, iríamos fazer uma festança no final de semana e aí na sexta-feira, final da tarde, fui para esta clínica fazer os exames. Me lembrei que fazia uns dois anos que não fazia um check-up completo de como estava e decidi, juntamente com o eco do doutor Kalil, fazer exames gerais.

Quando terminei de fazer o ecocardiograma, o médico encostou as costas no encosto da cadeira e disse que eu tinha algo muito grave dentro de mim. Até pensei que era um cisto que tenho e que carrego há muitos anos, mas que não precisa ser retirado, pelo menos não por enquanto, ou a minha condição de nascença, tenho uma válvula bicúspide, que era para ser tricúspide. Um médico a detectou em 2007 e disse para eu ficar atento a ela. Confesso que não segui a recomendação dele.

Mas ele balançou a cabeça de forma negativa e disse que eu tinha um aneurisma da aorta torácica ascendente. Para mim, esse diagnóstico era algo muito ruim. Perdi um tio da minha família por conta de um aneurisma. O médico disse que era como uma bexiga, que tinha por volta de seis centímetros, mas que a minha dor nas costas poderia ser um outro aneurisma localizado mais abaixo e que o exame não havia detectado. Ele pediu para eu voltar no dia seguinte para realizar outros exames.

Saí do hospital totalmente perdido, sem chão, sem cabeça. Cheguei em casa, meus pais estavam sentados na mesa com a Flavinha, minhas filhas, todos felizes por conta da festa, prontos para comemorar a vida, os 50 anos da Flávia e eu com uma notícia devastadora. Decidi não contar nada naquele momento. Se contasse, tinha certeza de que a Flávia cancelaria a festa, se assustaria, causaria pânico em todo mundo e não queria nada disso nas vésperas do aniversário e da festa dela.

Fiquei nesse espectro de sonho enquanto ela celebrava a vida, pensando em tudo o que estava por vir. Ainda não tinha caído a ficha da gravidade da situação.

No dia seguinte, fui fazer os exames, mas graças a Deus não era nada. A dor, que achava que poderia ser alguma coisa, era uma questão física e muscular.

No domingo à noite, contei para a Flávia. Minhas filhas não estavam em casa e ela foi a primeira a saber. Ela disse que tinha desconfiado de que algo estava errado, nós choramos, nos abraçamos, ficamos em silêncio e no dia seguinte, ela entrou realmente no circuito e foi uma grande pilastra dessa situação, desde então ela não saiu do meu lado.

No final daquela semana viajamos para São Paulo, levei os exames para o Kalil, fiz uma nova bateria de exames, e ele já disse para agendar minha cirurgia. Ele disse que era necessário ser feito se eu não quisesse viver com uma bomba-relógio dentro de mim. Como havia congelado minha agenda no mês seguinte para a viagem, decidimos cancelar a viagem e agendar a cirurgia.

Ali tudo mudou para mim. Estava com medo, triste, já me preparando para o fim. Estava enfrentando a morte e depois disso, virou uma chavinha dentro da minha cabeça, porque havia uma possibilidade, não era incurável ou irreversível, então passei a enfrentar a vida. A lutar a favor dela.

Quando voltei para a casa, contei para as minhas filhas e para os meus pais. Decidi falar para poucas pessoas para ficar apenas entre nós, no âmbito familiar e não ter risco de vazar a informação. Foi um momento doloroso, mas também de extrema união.

Será que fiz tudo o que tinha para fazer? Vivi de peito aberto? Perdoei quem tinha que perdoar, declarei meus amores, vivi e realizei meus sonhos? Sou feliz? Minhas filhas estavam em um caminho certo, estão legais? Questionava sobre tudo. Tudo parecia que estava fazendo pela última vez. A última apresentação de ballet da minha filha, o último São João, o último dia dos namorados com a Flávia. Organizei toda a minha vida patrimonial. Tudo isso aliado a oscilações de humor, com muito medo, emoção, ansiedade.

Chegamos na semana que antecedia à cirurgia. Me internei três dias antes para fazer o pré-operatório. Brinco que era um astronauta do desconhecido, prestes a entrar em outro planeta que nunca tinha ido.

Quando acordei, estava entubado ainda na UTI, mas vi a Flávia do meu lado. Lá, no hospital, a UTI é humanizada, então uma pessoa da família pode ficar com você, e um médico veio falar comigo, me tranquilizar, dizendo que a cirurgia foi um sucesso.

Nascer de novo

E a partir daquele dia, reaprendi muita coisa. Os primeiros passos, o primeiro banho, junto com a equipe de enfermagem e depois sozinho, a primeira alimentação. É tudo sempre muito emocionante. No segundo dia, ainda na UTI, comecei a fazer fisioterapia, fiquei uns 60 dias dormindo apenas de frente, mudei praticamente toda a minha dieta e exercício físico, visto que eu não podia fazer nada. Mas o meu condicionamento e a minha musculatura foram um diferencial nesse quesito.

Virei o terror dos médicos, porque depois de três dias já estava com a dieta totalmente liberada, pedindo pizza, sanduíche, comendo comida árabe dentro do hospital Sírio Libanês, mas com limitação física, claro.

Eles até brincam comigo dizendo que virei um péssimo exemplo, porque as pessoas vão fazer a cirurgia e me têm como modelo. Falam que depois de dois dias eu já estava sorrindo, pulando, brincando, comendo de tudo, e que eles querem ser iguais.

Depois de 10 dias, soube da notícia da minha alta e decidi gravar um vídeo contando sobre a internação, o diagnóstico e a cirurgia, que provocou um aumento gigantesco no pedido de exames de diversos hospitais de São Paulo, porque as pessoas viram que um simples exame de ecocardiograma havia salvado a minha vida. Comecei a receber centenas de mensagens de diferentes pessoas do país, contando um pouco a história de cada um.

Virei o serviço de atendimento ao cliente da saúde, e comecei aleatoriamente a responder por texto, respondi muitos, mas acho que devo ter deixado de responder muitos também, e por isso, decidi criar uma palestra chamada “De Peito Aberto”, para estender essa conversa. Compartilhar com as pessoas a minha história, contar sobre como foi a minha cirurgia, estimulá-las a fazer essa reflexão da vida e mostrar a importância de cuidar da saúde, fazer exames de rotina e não vacilar com isso.

Hoje, falo que sou fruto de um milagre da vida, quem sobrevive um negócio desse, mentalmente e fisicamente, a cicatriz que carrego no peito, é o meu milagre da vida. Estou liberado, tanto de dieta quanto de exercício físico. Pratico esporte, corro, ando, nado, faço academia. Tudo o que tenho vontade.

Vivo ainda mais de peito aberto para todas as coisas da vida. O que posso falar para as pessoas é não deixem de cuidar da saúde. Acho que este foi o maior aprendizado que tive. A vida é boa demais para você não cuidar daquilo que é mais precioso além da sua família. É cuidar de si e não deixar a rotina te engolir.

Otaviano Costa em depoimento ao repórter Eduardo F. Filho

Com informações de O Globo