A crise envolvendo o território de Essequibo, disputado por Guiana e Venezuela, fez com que o Brasil voltasse a se preocupar com a presença de militares dos Estados Unidos na Amazônia.
O Brasil teme que os EUA aproveitem o conflito para a instalação de bases militares na região. A preocupação é tratada em reservado por militares brasileiros, mas também já foi externada, publicamente, pelo principal assessor do presidente Lula (PT) para assuntos internacionais, Celso Amorim.
O temor se intensificou depois que o presidente da Guiana admitiu a possibilidade de instalar bases estrangeiras para se proteger. Irfaan Ali e o ditador venezuelano Nicolás Maduro se encontraram na quinta-feira (14), mas não houve acordo —os dois apenas concordaram em evitar o uso da força. O próximo encontro deve ocorrer no Brasil.
O receio brasileiro de que a Amazônia seja alvo da atuação de tropas estrangeiras se dá por motivos de defesa da soberania do território. Bioma de maior diversidade do mundo, a área abriga a maior bacia hidrográfica da Terra e é rica em minerais e metais preciosos.
A preocupação é ainda maior, quando se trata dos EUA, por causa do poderio bélico daquele país —em 2022, os gastos militares atingiram US$ 877 bilhões de dólares (o equivalente a R$ 4,3 trilhões), segundo o Sipri (Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo).
Medo de tropas estrangeiras na Amazônia é antigo
A preocupação com a suposta “cobiça internacional” vem do século 19. Segundo Barbara Weinstein, professora de História da América Latina e Caribe, na Universidade de Nova York, a ideia de que nações planejam roubar pedaços do bioma começa no período imperial —quando o governo se recusou a abrir a Amazônia à navegação estrangeira. Durante a ditadura, o Brasil lançou uma campanha para povoar a região. Com o slogan “Integrar para não entregar”, o objetivo era protegê-la de um imaginado risco de invasão estrangeira.
O único episódio que levou os EUA a tentarem uma presença permanente no Brasil foi a Segunda Guerra Mundial. Durante o período, o país construiu bases aéreas no Nordeste e no Pará, com o consentimento do governo de Getúlio Vargas. “Houve uma breve tentativa dos EUA de estender o acesso a essas bases para além do fim da guerra, mas o Brasil recusou”, explica Weinstein.
A instalação de uma base americana no Brasil foi cogitada durante o governo Bolsonaro. No início de seu mandato, o então presidente admitiu uma aproximação bélica com os EUA e disse que “a questão física pode ser até simbólica”. A ideia, no entanto, foi descartada dias depois, após a má repercussão entre militares da cúpula das Forças Armadas.
O que disse o governo brasileiro sobre o assunto?
O que eu temo mais, pra falar a verdade, é que você crie precedentes até para ter bases e tropas estrangeiras na região. Não estamos falando de uma região qualquer. Estamos falando da Amazônia, que é sempre objeto de muita preocupação de nossa parte. Celso Amorim, assessor especial de Lula para assuntos internacionais, ao Canal Meio
O que dizem especialistas?
“Evidentemente, existe uma preocupação muito grande porque, a partir do momento que os EUA estão na região, fazendo operações aéreas na Guiana, fica evidente que eles estão se mobilizando lá. Para o Brasil é muito ruim ter presença militar na América do Sul. Acho que o país vai ter que tentar de todas as formas resolver essa situação de forma diplomática, porque a preocupação de que a Amazônia seja alvo da atuação das tropas é antiga e está sendo ressuscitada. É melhor integrar do que deixar países terceiros atuarem na região.” disse Regiane Bressan, professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo
“Acho que a resposta à pergunta sobre a intervenção direta dos EUA no território brasileiro é “não”. É claro que a extrema direita nos EUA, tal como a extrema direita no Brasil, inclui muitas pessoas que fazem declarações absurdas e ofensivas, incluindo um apelo recente de alguns republicanos para atacar os cartéis da droga em solo mexicano. Mas todos sabem que isso é apenas para apelar à sua base, e a ideia de intervenção dos EUA no Brasil é ainda mais improvável.” disse Barbara Weinstein, professora de História da América Latina e Caribe da Universidade de Nova York.
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