
Com o voto do Brasil, sob aplausos e sem mencionar o Hamas, a Assembleia Geral da ONU aprovou por ampla maioria uma resolução que pede uma “trégua humanitária” na Faixa de Gaza.
O texto obteve 120 votos a favor, 14 contra e 45 abstenções. O resultado amplia a pressão sobre os governos de Israel e dos EUA, rompendo o imobilismo da ONU depois de 21 dias de conflitos.
Mas os governos dos EUA e Israel votaram contra o projeto. China e Rússia apoiaram a resolução. Na Europa, houve uma ruptura, com a França e Espanha apoiando o texto, enquanto a Alemanha e Itália optaram pela abstenção
A adoção ainda coincide com uma ofensiva militar israelense sobre o território palestino, gerando temores de uma escala sem precedentes na crise e a transformação das hostilidades em uma guerra regional.
Israel chama de “dia da infâmia” e nega que exista uma crise humanitária.
Após o voto, Gilad Erdan, embaixador de Israel, voltou a atacar os governos e as Nações Unidas. “Esse é o dia da infâmia”, disse. Para ele, a ONU “não tem mais credibilidade”. “A ONU vai assegurar que mais atrocidades ocorram”, disse. “Esse é um dia escuro para a ONU e para a humanidade. Vamos continuar a nos defender e vamos fazer o que tiver de ser feito para erradicar o Hamas”, afirmou.
“A resolução não cita uma só vez o Hamas. O que está ocorrendo aqui? Vocês estão defendendo terroristas”, disse. Para ele, o documento “ata as mãos de Israel”.
Erdan voltou a acusar Hamas de usar o subterrâneo de hospitais e insistiu que existem provas de que não foi Israel quem atacou o local. “Essa resolução ridícula tem a audácia de pedir trégua”, disse. Mas, segundo ele, é para autorizar violência de Hamas
“Não há crise humanitária para Israel”
Erdan ainda declarou que “não há crise humanitária” em Gaza e que não se pode acreditar nos dados palestinos. “É como acreditar no Estado Islâmico”, disse. “Quer vergonha de vocês”, acusou o embaixador.
A resolução não tem o mesmo peso de uma decisão do Conselho de Segurança e serve apenas como recomendação. Ainda assim, ela pede:
– O estabelecimento de corredores humanitários
– A liberação imediata de civis sequestrados
– A revogação da ordem de evacuação do norte de Gaza por Israel
O debate foi iniciado ontem, numa sessão marcada por um alerta por parte da delegação de Israel de que não aceitaria o texto. Segundo a diplomacia israelense, quem defende um cessar-fogo quer que as “mãos de Israel sejam amarradas”, permitindo espaço para o Hamas se rearmar.
A reunião ainda testemunhou ataques mútuos entre palestinos e israelenses, ameaças por parte do Irã e até a transmissão de um vídeo no qual um membro do Hamas decapitava uma vítima
O documento inicial do projeto de resolução falava em um “cessar-fogo imediato” e não citava os crimes cometidos pelo Hamas, o que levou o governo de Israel a atacar a ONU. Mas, em negociações na madrugada de hoje, os países árabes aceitaram uma mudança no texto, na esperança de atrair um maior número de votos e isolar americanos e israelenses.
O novo texto, portanto, foi modificado e pede uma trégua humanitária imediata, duradoura e sustentada que leve ao fim das hostilidades.
O pedido de “trégua humanitária” vem num momento em que a ONU alerta que corpos estão sendo empilhados em Gaza e que a ajuda que entra pelo Egito não atende nem a 4% da necessidade dos 2,2 milhões de palestinos. Nesta sexta-feira, a ONU também qualificou a situação como “crime de guerra”. O documento também foi modificado para condenar a morte de civis israelenses. Mas não cita os autores palestinos dos massacres. Por esse motivo, governos como o dos EUA votaram contra a resolução
Diz a resolução:
“Expressando grande preocupação com a mais recente escalada de violência desde o ataque de 7 de outubro e a grave deterioração da situação na região, em particular na Faixa de Gaza e no restante do Território Palestino Ocupado, incluindo Jerusalém Oriental, e em Israel”
“Condenando todos os atos de violência contra civis palestinos e israelenses, incluindo todos os atos de terror e ataques indiscriminados, bem como todos os atos de provocação, incitação e destruição”
Brasil alerta que ONU vive momento “decisivo”
Momentos antes da votação, num discurso durante o debate na Assembleia Geral da ONU, o embaixador Sérgio Danese defendeu uma suspensão das hostilidades em Gaza, a criação de uma pausa humanitária e o acesso de bens para a população. Para ele, a entidade precisa dar uma resposta à crise e o atual modelo “fracassou”.
Enquanto o embaixador falava, o secretário-geral da ONU, António Guterres, declarava em outra sala que a entidade teria de parar a ajuda para Gaza se não houvesse um acordo humanitário e deixou claro: “o momento da verdade chegou. A história está nos julgando”
Brasil pediu resposta coletiva
“Nossa resposta coletiva a essa crise, que todos tememos que só se agravará se nada for feito, será um momento decisivo para a ONU. Ele mostrará se a ONU pode levar a sério a prevenção, o fim ou, pelo menos, a mitigação dos horrores da guerra”
Com informações da coluna de Jamil Chade / Uol